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#ForçaChape: O tuíte derradeiro que revelou proibição de voo fatal pela Anac

29/11/2016 14h36

"Atenção: mudança no vôo da Chape! ANAC não permitiu voo fretado com a Lamia. Time vai em novo voo, comercial, 15h30. Será tudo outra vez?!"

Esse foi o penúltimo tuíte do jornalista chapecoense Douglas Dorneles. No último, publicou uma foto do avião que levava a delegação: "Vai começar a viagem da Chape rumo a Medellín na Colômbia! É decisão da #CopaSudamericana"

Na manhã desta terça-feira, Dorneles, que cobria o time para rádios e jornais locais, apareceu na lista de vítimas do acidente que deixou 76 mortos, entre jogadores, comissão técnica, tripulação e jornalistas, segundo dados preliminares.

As mensagens publicadas pelo jornalista começaram a se espalhar imediatamente pela rede. Desesperados, seguidores e amigos mandavam, em vão, mensagens ao jornalista.

"Vocês estão vivos, né??"; "Mano, apareçam com notícias, o Brasil esta rezando por vocês"; "Bicho! Acalma a gente, pelo amor de deus!"

Os registros derradeiros no Twitter também deram uma pista a jornalistas, que começaram a buscar informações sobre a proibição do voo fretado com a companhia Lamia, sediada na Bolívia, pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac).

O avião que caiu em Medellín tinha 17 anos e era justamente da Lamia.

Prejuízo

A Anac emitiu nota à imprensa às 9:39 desta terça-feira. No texto, o órgão informa que a companhia Lamia Corporation pediu uma autorização de voo para o transporte do time.

"O voo partiria do Brasil para a Colômbia, na segunda-feira, 28/11, segundo a solicitação. O pedido foi negado com base no Código Brasileiro de Aeronáutica (CBAer) e na Convenção de Chicago, que trata dos acordos de serviços aéreos entre os países. O acordo com a Bolívia, país originário da companhia aérea Lamia, não prevê operações como a solicitada", diz a nota.

Depois do veto ao voo fretado, o time decidiu pegar um voo comercial até o aeroporto boliviano de Santa Cruz de la Sierra, na Bolívia.

À reportagem, a Anac confirmou que, de lá, o time embarcou em um voo fretado da companhia boliviana Lamia rumo a Medellín.

Fontes dentro da agência de aviação disseram à BBC Brasil que o time já havia usado a mesma "estratégia" em outubro, quando venceu o Junior Barranquilla por 3 a 1.

Nos corredores da ANAC, fala-se que o time teria um contrato de viagem com a empresa aérea boliviana e que, desta forma, teria menos prejuízo com o dinheiro já pago para o voo que foi negado.

O vice-presidente da Chapecoense, Ivan Tozzo, informou, também por nota, que não comentará a tragédia até receber "manifestação oficial da autoridade aérea colombiana para emitir nota oficial".

A reportagem não conseguiu contato com a companhia aérea Lamia. O site da empresa está fora do ar desde a manhã desta terça-feira.

Frota

À BBC Brasil, Décio Correa, presidente do Fórum Brasileiro de Aviação Civil, disse que o modelo de avião Avro RJ85, que caiu na Colômbia, tem boa avaliação e funciona bem em locais com pouca infraestrutura e pistas curtas.

Popular nos anos 1980 e 1990, o modelo foi produzido entre 1983 e 2002 pela empresa britânica British Aerospace.

Ao todo, foram construídas 387 unidades. Um dos trunfos do avião, considerado um dos jatos britânicos mais bem sucedidos, é operar em pistas curtas.

"A razão de descontinuar foi técnica", diz o especialista. "A tecnologia mudou de lá para cá, o que gera um impacto econômico, porque o modelo antigo deixa de ser um negócio interessante".

O avião que levava o time até Medellín era um dos dois da companhia aérea Lamia.

O site especializado em aviação Airway publicou um histórico da aeronave.

"O exemplar que levava o time brasileiro para Medellín, na Colômbia, foi fabricado em 1999 e entregue originalmente para a companhia regional americana Mesaba. Em 2007, foi repassado para a empresa irlandesa CityJet e chegou a voar com as cores da Air France. Em 2013, foi comprado pela Lamia para operar na Venezuela. No ano passado, ele passou a voar na Bolívia", diz a publicação.

Para Correa, a idade da aeronave pode sugerir problemas técnicos. "Dezessete anos é bastante tempo. As peças podem se desgastar, ficam obsoletas. Não dá para comparar com um avião novo, seria colocar um iPhone e um telefone analógico lado a lado."

Acidente

O avião que transportava o time de futebol da Chapecoense sofreu um acidente na madrugada desta terça-feira na Colômbia, para onde viajava para disputar a final da Copa Sul-Americana contra o Atlético Nacional, de Medellín.

Segundo um comunicado do Aeroporto José María Córdoba, de Medellín, a tripulação comunicou uma emergência por "falhas elétricas" por volta das 22h15 locais (1h15 de Brasília).

Estavam a bordo 81 pessoas, 72 passageiros e nove tripulantes. Vinte e dois eram jornalistas.

Desse total, 76 morreram e cinco sobreviveram.

Entre os sobreviventes confirmados estão os goleiros Danilo e Follmann, o lateral Alan Ruschel e o jornalista Rafael Henzel, assim como uma aeromoça, identificada como Ximena Suárez.

O mau tempo na região torna mais difícil o trabalho de resgate, que chegou a ser suspenso por causa da forte chuva. O avião partiu-se em três pedaços.

O local da queda, a cerca de 50 quilômetros da cidade de Medellín, no Departamento (Estado) de Antióquia, é montanhoso e de difícil acesso.

A Confederação Sul-Americana de Futebol anunciou a suspensão da competição e de todas as suas atividades esportivas.