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Aécio afastado: muda o jogo de forças no PSDB, mas altera pouco a situação de Temer no Congresso

STF decidiu afastar Aécio Neves de suas atividades parlamentares - André Dusek/Estadão Conteúdo
STF decidiu afastar Aécio Neves de suas atividades parlamentares Imagem: André Dusek/Estadão Conteúdo

André Shalders

Da BBC Brasil em São Paulo

27/09/2017 21h11

Quando a Câmara estava prestes a votar a continuidade da 1ª denúncia contra o presidente da República, Michel Temer (PMDB) recebeu o senador Aécio Neves (PSDB-MG) para um jantar no palácio do Jaburu. O encontro, num sábado, tornou explícita a atuação do mineiro em favor de Temer, naquele momento. Três dias depois, os deputados barraram a investigação contra o presidente, que contou com a divisão do PSDB em seu benefício.

Desta vez, é possível que Aécio fique impedido de operar em favor do governo no Congresso enquanto tramita a segunda denúncia contra o peemedebista. Afastado pelo STF do mandato, Aécio está proibido de entrar no prédio que abriga a Câmara e o Senado. Ele também deverá passar as noites em casa. E não poderá conversar com outros investigados, o que inclui a própria irmã, a jornalista Andrea Neves.

Para interlocutores do senador e integrantes do governo, porém, o impacto da decisão do STF será mais forte no xadrez interno do partido do que na formação de uma base para apoiar o governo.

Divididos sobre apoiar ou não Temer, e em franca disputa de quadros pela candidatura presidencial, os tucanos viram se fortalecer a posição dos rivais de Aécio. Os principais beneficiados imediatos são o presidente interino da legenda, o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que se aproxima de assumir definitivamente o comando da sigla, e o governador Geraldo Alckmin. Este último disputa com o pupilo João Doria, prefeito de São Paulo e preferido de Aécio, a indicação para concorrer à presidência pelo partido.

03.ago.2017 - Com Aécio Neves (d) ao fundo, Tasso Jereissati concede entrevista a jornalistas após encontro para definir os rumos do comando do PSDB - George Gianni/PSDB - George Gianni/PSDB
Tasso (à frente) pode se fortalecer com a decisão do STF contrária a Aécio
Imagem: George Gianni/PSDB

Entre os governistas, no entanto, há a impressão de que a derrubada da segunda denúncia dependerá mais das bondades que Temer pretende distribuir aos parlamentares do que de articulações que poderiam ser capitaneadas por Aécio. Além disso, o presidente já contaria com os apoios que o próprio senador mineiro ajudou a montar para a vitória sobre a primeira denúncia, em agosto.

Os senadores ainda precisam decidir se o afastamento de Aécio terá ou não de ser chancelado pela comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa e pelo plenário. Nesta quarta-feira, até senadores petistas se pronunciaram contra o afastamento do mineiro, que já está em vigor. A decisão do Supremo se baseou em acusações de corrupção passiva e obstrução de Justiça contra Aécio, no âmbito da Operação Lava Jato. O senador nega ter cometido crimes.

"Um jogador a menos"

Antes mesmo da 2ª denúncia contra o presidente da República chegar ao Congresso, o Planalto já havia posto em marcha medidas para garantir o apoio dos deputados contra a peça do Ministério Público Federal. Para que Temer seja investigado enquanto está na cadeira de presidente, pelo menos 342 deputados precisam votar a favor da investigação. O presidente intensificou as agendas com congressistas e o governo anunciou que levará adiante medidas de interesse de deputados.

Por isto, a sensação no Planalto é de que o afastamento de Aécio pode até significar um articulador a menos contra a denúncia, mas não será determinante para o resultado da votação.

Na terça-feira, o presidente Michel Temer disse a deputados da bancada ruralista que editará uma medida provisória para prorrogar o prazo de adesão ao Funrural. Trata-se de um programa que permite aos empresários do setor agrário parcelar dívidas com a Previdência, em condições mais vantajosas. O prazo se esgotaria nesta sexta-feira. E o montante total devido chega a R$ 17 bilhões.

Na noite desta quarta-feira, o plenário da Câmara também aprovou a medida provisória do Refis, que cria condições mais favoráveis para empresas endividadas com a União. Este é mais um ponto onde o governo está disposto a ceder, abaixou a arrecadação inicialmente prevista de R$ 13 bilhões para cerca de R$ 8 bilhões.

Além disso, o governo ampliou o empenho das emendas dos deputados no mês de setembro. Levantamento da ONG Contas Abertas mostra que até o dia 22 deste mês já foram liberados R$ 800,6 milhões. É o terceiro maior valor deste ano, perdendo só para os meses de junho e julho, período imediatamente anterior à votação da primeira denúncia. As emendas são recursos previstos no Orçamento da União e que podem ser direcionados pelos deputados para projetos em suas bases eleitorais.

Embora levantamento da BBC tenha mostrado que deputados da oposição e do governo receberam valores parecidos na 1ª denúncia, a liberação dos valores costuma melhorar o humor no Congresso em relação ao Executivo.

12.mai.2016 - O senador Aécio Neves (PSDB-MG) cumprimenta o presidente interino Michel Temer (PMDB) durante cerimônia de posse de ministros - Ueslei Marcelino/Reuters - Ueslei Marcelino/Reuters
Apoio de Aécio ajudou Temer a barrar primeira denúncia na Câmara
Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters

Tucanos descem do muro?

O deputado Betinho Gomes (PSDB-PE) é um dos integrantes da ala conhecida como "cabeças-pretas" do PSDB - um grupo de congressistas tucanos que prega a independência em relação a Temer e a saída do partido do governo. Para ele, o afastamento de Aécio pouco altera o resultado da votação da denúncia na bancada tucana. Na primeira denúncia, os tucanos se dividiram: metade apoiou Temer, a outra metade votou por seu afastamento.

"Mas é claro que perdendo o instrumento do mandato [de senador], ele [Aécio] deixa de ter o convívio com alguns interlocutores da política nacional", pondera Gomes.

Para outro "cabeça-preta", o deputado Daniel Coelho (PSDB-PE), a influência de Aécio já seria pequena, mesmo que ele mantivesse o mandato. "Não acho que o Aécio ou outro senador possa influenciar. São os ministros ou o próprio presidente Temer que conseguem mudar [os votos]. Este é um dos votos mais importantes que o deputado dá durante o mandato; é uma questão pessoal de cada um", diz ele.

Para Gomes, porém, o PSDB deve ter maioria contra o presidente, desta vez. "Na 1ª denúncia, tivemos quatro abstenções. Temos informações que, destes quatro, pelo menos três serão a favor da denúncia desta vez", diz ele.

Gomes também cita uma votação no plenário da Câmara na noite da última terça-feira, de uma proposta do PSOL, como indicativo de uma postura de ruptura entre PSDB e governo Temer. Se a tese do partido de esquerda tivesse prevalecido, o ministro Moreira Franco (Secretaria-Geral da Presidência) teria perdido o foro privilegiado. Na ocasião, 19 tucanos votaram para tirar o status de ministro de Moreira, e só 11 foram contra. O partido tem 45 deputados.

Tasso Jereissati e Alckmin fortalecidos

Se Aécio acabar afastado do mandato definitivamente, o principal beneficiário deve ser o atual presidente interino do PSDB, o senador e empresário Tasso Jereissati (CE). Aécio é hoje o presidente afastado do partido. Com Aécio enfraquecido, Tasso estaria "praticamente efetivado" no comando do partido, nas palavras de um apoiador.

Em outubro, os tucanos começam a organizar a convenção que escolherá o novo comando da sigla. Já no começo do mês deve acontecer a etapa municipal da disputa, onde serão eleitos os delegados para as disputas estaduais. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, também sai ganhando: o grupo dele defende a candidatura de Tasso, de forma velada.

Há várias semanas, Tasso e os "cabeças-pretas" se movimentam abertamente para que o cearense seja eleito presidente da sigla pelos próximos dois anos. A decisão está marcada para o dia 9 de dezembro. Embora Aécio não seja candidato e nem esteja proibido de atuar dentro do partido, seu enfraquecimento acaba beneficiando a ala "anti-Temer" do PSDB, representada por Tasso.