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Em 6 pontos, o que pode acontecer com Lula após tribunal manter condenação por unanimidade

A condenação de Luiz Inácio Lula da Silva foi confirmada pelo TRF-4 - Edson Lopes Jr./UOL
A condenação de Luiz Inácio Lula da Silva foi confirmada pelo TRF-4 Imagem: Edson Lopes Jr./UOL

25/01/2018 10h45

O que pode acontecer na eleição de outubro com a confirmação, por unanimidade, da condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região)? Ele pode ser preso em breve?

Essas são algumas das questões que surgem após a decisão dos desembargadores nesta quarta. Ela pode culminar em uma transformação no cenário eleitoral: no último levantamento do Instituto Datafolha, divulgado no começo de dezembro, o petista liderava a corrida presidencial com índices que variavam entre 34% e 37% das intenções de voto, a depender dos opositores testados.

A Lei da Ficha Limpa prevê que pessoas com condenação por órgãos colegiados por crimes contra administração pública, como corrupção, não podem se candidatar. Após saber da decisão do TRF-4, Lula disse que "não está preocupado" se vai "ser candidato ou não". Mas o PT disse que vai registrar sua candidatura, independentemente da decisão judicial.

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Os magistrados não só confirmaram a condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro como aumentaram a pena, antes de nove anos e seis meses, para 12 anos e um mês de prisão. A acusação é de que o ex-presidente recebeu, como propina, um apartamento tríplex no Guarujá (SP), pago e reformado pela construtora OAS. A defesa nega que o apartamento seja de Lula.

Diante do novo cenário, confira o que pode ocorrer nos próximos meses.

1. Quando Lula começaria a cumprir a pena de 12 anos de prisão?

Ao confirmarem a condenação, os desembargadores deixaram claro que devem determinar o cumprimento da sentença depois que o tribunal terminar de analisar eventuais recursos contra a decisão.

Mas é possível que a defesa tente, junto ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) e ao STF (Supremo Tribunal Federal), impedir a prisão, apresentando um habeas corpus para suspender a execução da pena até uma decisão final sobre as acusações de corrupção e lavagem de dinheiro.

Hoje, porém, o STF entende que o réu pode começar a cumprir a sentença após ser condenado pela segunda instância. Ou seja, não é preciso haver uma decisão final, transitada em julgado. Portanto, por enquanto, nada impede que Lula comece a cumprir a pena se os desembargadores rejeitarem os recursos da defesa e emitirem um mandado de prisão.

"O que o STF disse foi que a execução provisória da pena não fere o princípio da presunção de inocência (todos são inocentes até a prova em contrário). O tribunal não mandou que prendesse depois da segunda instância. Isso caberá aos três desembargadores decidir", diz a advogada criminalista Fernanda Carneiro.

Ainda segundo a criminalista, caberia a um juiz de execução penal, e não aos desembargadores do TRF-4, definir onde Lula seria preso, se for esse o caso. A princípio, diz Fernanda Carneiro, o local de cumprimento da pena deve ser o mais próximo possível da casa do condenado.

Ou seja, é improvável que Lula cumprisse a pena em Curitiba (PR).

2. Quais recursos Lula pode apresentar - e quem os julgará?

Com a confirmação da condenação, Lula e o Ministério Público Federal serão, agora, oficialmente notificados do resultado - o que pode levar alguns dias para acontecer. Apenas a partir daí, poderão ser apresentados recursos.

Como a decisão do TRF-4 foi por unanimidade, a defesa do ex-presidente terá menos possibilidades de recursos ao próprio tribunal.

Se ele tivesse sido condenado por 2 a 1, os advogados poderiam apresentar os chamados embargos de divergência (ou infringentes), para que outros três desembargadores julgassem o caso.

Mas ainda resta o chamado embargo de declaração. Esse tipo de recurso visa apenas esclarecer omissão ou trechos confusos da decisão dos três desembargadores. A princípio, não há possibilidade de mudança na decisão final, mas serve como estratégia para postergar a conclusão do processo e a execução da pena.

O recurso será julgado pelos mesmos desembargadores que mantiveram a condenação de Lula: João Pedro Gebran Neto (relator do caso), Leandro Paulsen (presidente da 8ª Turma) e Victor dos Santos Laus.

Mas a decisão pode demorar um tempo a ser tomada, especialmente porque dois dos três desembargadores do caso Lula sairão de férias a partir da próxima segunda-feira. O último deles, Laus, só volta ao trabalho em 22 de março.

O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, disse à BBC Brasil que a defesa vai esgotar as possibilidades de recursos tanto no TRF quanto nos tribunais superiores (STJ e STF), em Brasília.

Para Zanin, há dois problemas principais com a sentença: o Ministério Público Federal não conseguiu traçar o "caminho do dinheiro" dos contratos supostamente fraudados da Petrobras até o tríplex do Guarujá; e a acusação também não teria mostrado qual foi o ato específico de Lula em retribuição à suposta propina.

Mas, citando entendimento do Supremo adotado no julgamento do mensalão, os desembargadores argumentaram que não é preciso haver a comprovação de que o ex-presidente usou cargo público para retribuir a OAS pelo apartamento. Basta o aceite da propina e a expectativa de retribuição, segundo eles, para que seja configurado o crime de corrupção passiva.

3. Lula tem chances de concorrer à eleição após o julgamento?

Com a confirmação da condenação pelo TRF-4, o ex-presidente a princípio fica impedido de ser candidato. A Lei da Ficha Limpa veta candidaturas de pessoas condenadas por órgãos colegiados. Ironicamente, foi o próprio Lula quem sancionou a regra, em 2010.

A presidente do PT, Gleisi Hoffmann, disse em nota divulgada nesta quarta-feira que o partido vai registrar a candidatura do líder petista à Presidência da República mesmo assim.

"Vamos confirmar a candidatura de Lula na convenção partidária e registrá-la em 15 de agosto, seguindo rigorosamente o que assegura a legislação eleitoral", afirmou.

Havendo o registro da candidatura, caberá ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) verificar se o candidato possui os requisitos necessários para concorrer e se não há impedimentos legais para que dispute a eleição.

Um advogado eleitoral ouvido sob anonimato pela BBC Brasil disse que é pouco provável que o TRF-4 não tenha terminado de analisar os recursos até o dia 17 de setembro, fim do prazo para o TSE julgar os registros de candidatura. Para esse profissional, é improvável que o tribunal deixe Lula concorrer.

"Na condenação criminal, não é comum o TSE liberar a candidatura", diz o advogado, que participou do julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE em junho passado.

Já o advogado de Lula, Cristiano Zanin, pensa de forma diferente. "Isso não inviabiliza uma eventual candidatura do ex-presidente. A candidatura terá que ser discutida na Justiça Eleitoral, a partir do registro", afirma ele, mencionando a possibilidade de recursos ao próprio TSE, ao STJ e ao STF.

4. Lula poderá continuar agindo como pré-candidato do PT à eleição?

Mesmo com a condenação, o petista poderá continuar fazendo suas caravanas pelo Brasil até uma eventual execução da sentença.

Quem decide se Lula pode ou não ser candidato não é o TRF-4, mas o TSE, em Brasília. O julgamento da chamada "impugnação de candidatura" tem diversas etapas, e pode se estender até 17 de setembro, prazo limite para que o TSE decida se concede ou não o registro.

A data também marca o limite para o PT trocar de candidato presidencial, se for o caso.

Depois de uma eventual decisão negativa do TSE, a defesa ainda poderá recorrer no próprio tribunal eleitoral, e, posteriormente, no STF.

No TSE, Lula pode usar os chamados "embargos de declaração", cujo objetivo é esclarecer qualquer omissão ou ponto obscuro da sentença dos ministros.

Há dúvidas, porém, sobre o TSE precisar ou não aguardar o julgamento desse recurso ou de eventual apelação ao STF para só então cassar o registro da candidatura.

5. Lula ainda poderá viajar para a África como planejou?

Sim. O ex-presidente tem como primeiro compromisso depois do julgamento uma viagem para a capital da Etiópia, Addis Abeba. Lula deve participar de um debate sobre o combate à fome no continente, organizado pela União Africana, no dia 27 de fevereiro.

Questionada sobre quem está custeando a viagem, a assessoria de imprensa do ex-presidente se limitou a informar que "ele foi convidado" pela União Africana.

Na sentença que confirmou a condenação de Lula, os desembargadores não determinaram o confisco do passaporte do ex-presidente, o que só poderia ocorrer se houvesse um pedido do Ministério Público e o entendimento de que o ex-presidente tem a intenção de fugir do país.

A assessoria do ex-presidente Lula disse à BBC Brasil que ele foi convidado para o evento na África há mais de um ano, muito antes da definição da data do julgamento pelo TRF-4. A assessoria afirmou ainda que ele voltará ao Brasil no dia seguinte ao debate.

6. Como o julgamento de Lula afeta seus adversários políticos?

A decisão do TRF-4 não afetará só o petista: todos os demais candidatos e partidos estão atentos aos desdobramentos do julgamento. Para o mundo político, embora a condenação não tire o petista da corrida imediatamente, ela abre oportunidades para o crescimento de outros candidatos.

"O impacto é aritmético. O PT tem de 18 a 20% do eleitorado como público cativo. Já o Lula tem 33%. Ele sempre foi muito maior que o PT. E um possível candidato petista, seja o (Fernando) Haddad (ex-prefeito de SP) ou o (ex-ministro) Jaques Wagner, começa patinando ali nos 8%", diz o deputado federal Marcus Pestana (PSDB-MG), considerado um dos principais estrategistas tucanos.

"Uma coisa é a eleição com o Lula, e outra sem o Lula", resume ele.

O deputado federal Miro Teixeira (Rede-RJ) diz que seria "estranho" uma eleição sem Lula. "Esse é um julgamento incomum. A decisão não trará implicações exclusivamente para o réu, terá repercussão na vida eleitoral do país", diz ele, que é do mesmo partido de Marina Silva (Rede), cotada para disputar.

Para o parlamentar, é impossível saber exatamente como se dará a transferência de votos de Lula, caso ele realmente seja impedido de concorrer. Além disso, "pesquisa é a fotografia de um momento. O filme continua, e eleições podem ter resultados totalmente diversos do que foi detectado nesses levantamentos até agora", afirma.

Em público, os principais líderes políticos do país dizem preferir uma eleição com Lula: foi o que fizeram Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e os possíveis candidatos Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, e Henrique Meirelles (PSD), ministro da Fazenda.

Mas especialistas em direito eleitoral consideram difícil a participação do ex-presidente na eleição, diante do resultado desta quarta-feira.