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Por que há uma guerra civil na Síria: 7 perguntas para entender o conflito

Bassam Khabieh/ Reuters
Imagem: Bassam Khabieh/ Reuters

15/03/2018 19h42Atualizada em 16/03/2018 20h42

Um levante pacífico contra o presidente da Síria que teve início há sete anos transformou-se em uma guerra civil que já deixou mais de 350 mil mortos, devastou cidades e envolveu outros países.

O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) calcula que mais de 5 milhões já deixaram o país.

Entenda a seguir a origem desse conflito e suas consequências até agora.

1. Como a guerra começou?

Mesmo antes do conflito começar, muitos sírios reclamavam dos altos índices de desemprego, corrupção e falta de liberdade política sob o presidente Bashar al-Assad, que sucedeu seu pai, Hafez, após sua morte, em 2000.

Em março de 2011, protestos pró-democracia eclodiram na cidade de Deraa, ao sul do país, inspirados pelos levantes da Primavera Árabe em países vizinhos.

Quando o governo empregou força letal contra dissidentes, houve manifestações em todo o país exigindo a renúncia do presidente.

O clima de revolta se espalhou, e a repressão se intensificou. Apoiadores da oposição pegaram em armas, primeiro para defender a si mesmos e depois para expulsar forças de segurança das áreas onde viviam. Assad prometeu acabar com o que chamou de "terrorismo apoiado por estrangeiros".

Seguiu-se uma rápida escalada de violência, e o país mergulhou em uma guerra civil.

Manifestantes protestam contra o presidente Bashar al-Assad em novembro de 2011 - Reuters - Reuters
Manifestantes protestam contra o presidente Bashar al-Assad em novembro de 2011
Imagem: Reuters

2. Quantas pessoas já morreram?

O Observatório Sírio de Direitos Humanos, uma ONG britânica que monitora o conflito com base em uma rede de fontes locais, registrou 353.900 mortes até março de 2018, incluindo 106 mil civis.

Os dados não incluem 56.900 pessoas que estão desaparecidas e consideradas mortas. O grupo também estima que 100 mil mortes não foram documentadas.

Enquanto isso, o Centro de Documentação de Violações, que recorre a ativistas na Síria, registrou o que avalia ser violações às leis de direitos humanos internacionais, inclusive ataques contra civis.

Foram documentadas 185.980 mortes relacionadas ao conflito, entre elas as de 119.200 civis, até fevereiro de 2018.

3. Do que se trata a guerra?

Agora é mais um conflito entre aqueles a favor e contra Assad.

Muitos grupos e países, cada um com suas próprias agendas, estão envolvidos, tornando a situação muito mais complexa e prologando a guerra.

Eles foram acusados de cultivar o ódio entre os grupos religiosos na Síria, colocando a maioria muçulmana sunita contra o secto xiita alauíta do presidente.

Essas divisões fizeram com que ambos os lados cometessem atrocidades, dividindo comunidades e tornando mais tímida a esperança de paz.

Também permitiram que grupos jihadistas como o autodenominado Estado Islâmico e a al-Qaeda florescessem.

Os curdos sírios, que querem ter o direito de governar a si próprios mas não combatem as forças de Assad, acrescentam outra dimensão ao conflito.

4. Quem está envolvido?

Os principais apoiadores do governo são a Rússia e o Irã, enquanto os Estados Unidos, a Turquia e a Arábia Saudita apoiam os rebeldes.

A Rússia já tinha bases militares na Síria e lançou uma campanha militar aérea em apoio a Assad em 2015 que foi crucial para virar o andamento da guerra a favor do governo.

Os militares russos dizem que os ataques têm como alvo "terroristas", mas ativistas afirmam que regularmente morrem rebeldes e civis.

Acredita-se que o Irã tenha enviado centenas de soldados e gasto bilhões de dólares para ajudar Assad.

Milhares de muçulmanos xiitas que integram milícias armadas, treinadas e financiadas pelo Irã - a maioria é do Hezbollah no Líbano, mas também do Iraque, Afeganistão e do Iêmen - têm lutado ao lado do Exército sírio.

Ataques aéreos conduzidos pela Rússia foram decisivos para virar o conflito a favor do governo - Russian Defense Ministry Press Service/AP - Russian Defense Ministry Press Service/AP
Ataques aéreos conduzidos pela Rússia foram decisivos para virar o conflito a favor do governo
Imagem: Russian Defense Ministry Press Service/AP

Os Estados Unidos, Reino Unido, França e outros países ocidentais forneceram variados graus de apoio para o que consideram serem rebeldes "moderados".

Uma coalizão global liderada por eles também realiza ataques contra militantes do Estado Islâmico na Síria desde 2014 e ajudou uma aliança entre milícias árabes e curdas chamada Forças Democráticas Sírias (FDS) a assumir o controle de territórios antes dominados por jihadistas.

A Turquia apoia há tempos os rebeldes, mas concentrou esforços em usá-los para conter a milícia curda que domina a FDS, acusando-a de ser uma extensão de um grupo rebelde curdo banido do território turco.

A Arábia Saudita foi um elemento-chave para conter a influência iraniana e também armou e financiou os rebeldes.

Ao mesmo tempo, Israel tem se preocupado muito com o envio de armas iranianas para o Hezbollah na Síria e tem realizado ataques aéreos para interromper isso.

5. Como o país tem sido afetado?

Além de causar centenas de milhares de mortes, a guerra incapacitou 1,5 milhões de pessoas, entre elas, 86 mil que perderam membros do corpo.

Ao menos 6,1 milhões de sírios tiveram de deixar suas casas para buscar abrigo em alguma outra parte do país, enquanto outros 5,6 milhões se refugiaram no exterior.

Líbano, Jordânia e Turquia, onde 92% desses sírios refugiados vivem hoje, têm enfrentado dificuldades para lidar com um dos maiores êxodos da história recente.

A ONU estima que 13,1 milhões de pessoas necessitarão de algum tipo de ajuda humanitária na Síria em 2018.

Os dois lados do conflito pioraram essa situação ao se recusar a permitir o acesso de agências com fins humanitários a quem precisa de auxílio. Quase 3 milhões de pessoas vivem em áreas alvos de cerco e de difícil acesso.

Os sírios também têm acesso limitado a serviços de saúde.

A organização Médicos por Direitos Humanos registrou 492 ataques a 330 instalações médicas até dezembro de 2017, o que resultou em 847 profissionais de saúde mortos.

Grande parte do patrimônio cultural da Síria também foi destruído. Todos os seis locais considerados pela Unesco como patrimônio da humanidade sofreram danos significativos.

Bairros inteiros foram arrasados em todo o país.

Refugiados sírios chegam na ilha de Lesbos, na Grécia, em setembro de 2015 - Petros Giannakouris/AP - Petros Giannakouris/AP
Refugiados sírios chegam na ilha de Lesbos, na Grécia, em setembro de 2015
Imagem: Petros Giannakouris/AP

6. Como o país está dividido?

O governo reassumiu o controle das maiores cidades sírias, mas grandes partes do país ainda estão sob o comando de grupos rebeldes e da FDS.

O principal reduto de oposição é a província de Idlib, no nordeste do país, onde vivem mais de 2,6 milhões de pessoas.

Apesar de designada como uma zona onde não deveria haver hostilidades, Idlib é alvo de uma ofensiva do governo, que diz estar combatendo jihadistas ligados à Al-Qaeda.

Ataques por terra também estão em curso em Ghouta Oriental. Seus 393 mil residentes estão sob o cerco do governo desde 2013 e enfrentam intensos bombardeios, assim como uma grave falta de comida e de suprimentos médicos.

Enquanto isso, a FDS controla a maioria do território a leste do rio Eufrates, incluindo a cidade de Raqqa. Até 2017, esta era a capital do "califado" que o Estado Islâmico disse ter instaurado, mas, agora, o grupo controla apenas alguns bolsões na Síria.

7. A guerra vai acabar algum dia?

Não há qualquer sinal de que o conflito chegará ao fim em breve, mas todos os lados envolvidos concordam que uma solução política é necessária.

O Conselho de Segurança da ONU pediu a implementação de um governo de transição "formado com base em consentimento mútuo".

Mas nove rodadas de conversas de paz mediadas pela ONU desde 2014 obtiveram poucos progressos.

Assad parece cada vez menos disposto a negociar com a oposição. Rebeldes ainda insistem que ele renuncie como parte de qualquer acordo.

As potências ocidentais acusam a Rússia de minar as conversas de paz ao estabelecer um processo político paralelo, conhecido como processo Astana, com a Rússia sediando um "Congresso de Diálogo Nacional" em janeiro de 2018.

No entanto, a maioria dos representantes da oposição se recusaram a participar.