Denunciado cinco vezes e alvo de dez inquéritos, Michel Temer vê Justiça acelerar ações
Apurações foram divididas por três cidades - e a maioria está voltando a tramitar agora. Ao todo, emedebista é alvo de cinco denúncias e dez inquéritos.
No fim da tarde de quinta-feira (28), o ex-presidente Michel Temer (MDB) tornou-se réu pela primeira vez em processos derivados das investigações da Operação Lava Jato.
O juiz federal Rodrigo Parente Paiva Bentemuller, da 15ª Vara em Brasília, aceitou a denúncia do caso JBS, na qual Temer é acusado de corrupção passiva. E, nesta sexta-feira (29), o ex-presidente foi denunciado mais duas vezes pela força-tarefa da Lava Jato no Rio de Janeiro.
A defesa de Temer contestou as denúncias. "Como tudo que nasceu daquela operação ilegal e imoral, essa imputação também é desprovida de qualquer fundamento, constituindo aventura acusatória que haverá de ter vida curta, pois, repita-se, não tem amparo em prova lícita nem na lógica", disse, em nota, o advogado Eduardo Carnelós, que representa o emedebista.
Ao todo, Temer já foi denunciado cinco vezes pelo Ministério Público e é investigado em dez inquéritos. Mas qual é o destino jurídico do emedebista? Em que pé estão as demais apurações contra o ex-presidente?
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Quando Temer deixou a Presidência da República, as apurações a respeito dele foram distribuídas da seguinte forma: quatro foram para a 1ª Instância da Justiça Federal em Brasília; quatro estão na Justiça Federal em São Paulo; uma foi para a Justiça Federal no Rio de Janeiro; e uma está na Justiça Eleitoral, também em São Paulo.
Na tarde desta sexta-feira, em entrevista a jornalistas, os investigadores da Lava Jato no Rio de Janeiro disseram acreditar que a prisão de Michel Temer é "devida" e que vão recorrer da decisão que soltou o ex-presidente, nesta segunda-feira (25). Na entrevista, o procurador Eduardo El Hage disse que Temer e seu grupo continuaram praticando o crime de lavagem de dinheiro - o que justificaria sua prisão antes dele ser condenado.
A defesa de Temer nega irregularidades em todos esses casos, e diz acreditar que os processos terminarão com a absolvição do ex-presidente.
Nesta reportagem anterior, a BBC News Brasil detalhou exatamente o que é investigado em cada caso. Abaixo, saiba como estão as investigações contra Temer em cada uma das cidades.
São Paulo - cinco casos
Caberá à Justiça Federal neste Estado dar sequência à maior parte das investigações mais antigas e mais bem fundamentadas sobre Temer, que dizem respeito ao Porto de Santos - antiga área de influência política do emedebista.
O ex-presidente foi preso no dia 21 de março, uma quinta-feira. Outras nove pessoas foram presas na mesma operação. No fim daquela semana, um HD externo com cerca de 80 gigabytes de informação chegou ao escritório da força-tarefa da Lava Jato paulista: eram informações enviadas pelo Supremo Tribunal Federal para embasar as apurações dos procuradores de São Paulo nos quatro inquéritos envolvendo Temer que agora tramitam na Justiça Federal no Estado.
Temer foi preso no âmbito de um desdobramento da operação Radioatividade, que investiga suspeitas de corrupção na estatal Eletronuclear, de energia atômica. Naquela quinta-feira, os investigadores da Lava Jato paulista foram deslocados para ajudar na operação, autorizada pelo juiz federal Marcelo Bretas, do Rio de Janeiro.
Por isso, o MPF só começou a analisar as informações enviadas pelo STF na segunda-feira (25), dia em que Temer foi solto pelo desembargador Antonio Ivan Athié, do TRF da 2ª Região.
Corre na Justiça Federal em São Paulo o inquérito que investiga suspeitas de superfaturamento em um contrato da Argeplan com o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) - a Argeplan é a empresa de arquitetura e engenharia do coronel reformado da PM de São Paulo João Baptista Lima Filho, o coronel Lima. Lima é amigo pessoal de Temer desde a década de 1980 - e para o MPF, é também o operador financeiro do ex-presidente.
Também estão na Justiça Federal o inquérito sobre a reforma da casa de Maristela Temer, filha do ex-presidente, que teria sido paga pela empresa do coronel Lima; a apuração que investiga possível pagamento de propina e lavagem de dinheiro no porto de Santos usando um escritório de advocacia; e a investigação sobre o possível pagamento de propina por meio de um contrato de fachada de arrendamento de terras da Fazenda Esmeralda, em Duartina (SP).
Estes casos estão descritos com mais detalhes nos números 2, 3, 4 e 5 desta reportagem anterior da BBC News Brasil.
Alguns documentos que foram apreendidos na operação Descontaminação - que prendeu Temer na quinta-feira - ainda precisam vir do Rio de Janeiro para São Paulo. Na sede da Argeplan, no bairro Alto de Pinheiros, a operação encontrou documentos da Fazenda Esmeralda, por exemplo - essas peças foram para o Rio, mas podem ser requisitadas no futuro.
Finalmente, uma das principais apurações contra Temer veio para a Justiça Eleitoral: a que investiga suspeitas de um pagamento de R$ 10 milhões de caixa 2 da empreiteira Odebrecht para campanhas do MDB nas eleições de 2014. Segundo o ex-executivo da empreiteira e delator Cláudio Melo Filho, o pagamento foi acertado num jantar no palácio do Jaburu, em Brasília, em maio daquele ano.
Em fevereiro de 2019, o Supremo Tribunal Federal decidiu enviar o caso para a Justiça Eleitoral de São Paulo. O caso caiu nas mãos do desembargador Cauduro Padin, do TRE-SP - e apenas na última terça-feira foi enviado para o juiz eleitoral que tocará a apuração daqui em diante: Francisco Carlos Inouye Shintate, da 1ª Zona Eleitoral (Bela Vista).
Brasília - quatro casos
As investigações enviadas para a Justiça Federal em Brasília estão entre as mais avançadas sobre o ex-presidente Temer.
O "quadrilhão do MDB" é parte de um pacote de denúncias apresentadas pelo ex-Procurador Geral da República Rodrigo Janot contra as cúpulas de três partidos: PP, PT e MDB. No caso do partido de Michel Temer, foram duas acusações: uma dirigida à cúpula do MDB no Senado; e outra na Câmara. Temer, que presidiu a Câmara duas vezes, foi incluído na segunda denúncia.
Janot acusou Temer e outros emedebistas de cometer vários crimes de corrupção a partir de 2006, envolvendo vários órgãos e empresas públicas: Petrobras, Furnas, Caixa Econômica, Ministérios da Agricultura e Integração Nacional, e a própria Câmara.
Segundo o ex-procurador-geral, o grupo recebeu pelo menos R$ 587 milhões de propina, somando todos os casos. Todos os políticos mencionados, inclusive Temer, negam irregularidades.
O caso JBS é talvez o mais rumoroso de todos. Veio à tona no começo da noite de 17 de abril de 2017, e nas primeiras horas após a divulgação, houve dúvidas sobre se Temer continuaria no cargo, ou renunciaria.
Fazem parte desta investigação as famosas imagens gravadas pela Polícia Federal do ex-deputado e ex-assessor de Temer Rodrigo Rocha Loures andando com uma mala contendo R$ 500 mil em dinheiro pelo centro de São Paulo.
A mesma delação trouxe o áudio da conversa entre Temer e Joesley Batista, na qual o ex-presidente diz ao empresário que "tem que manter isso, viu?", depois de Joesley afirmar que tinha uma "boa relação" com Eduardo Cunha.
Há dois inquéritos sobre este tema: no principal deles, há denúncia contra Temer, pelo crime de corrupção passiva, apresentada em junho de 2017 por Janot. O outro inquérito investiga o crime de obstrução de Justiça, mas ainda não há denúncia.
Também está em Brasília o inquérito principal sobre o Porto de Santos. Em dezembro de 2018, este caso deu origem à terceira denúncia contra Temer, apresentada pela PGR Raquel Dodge, sucessora de Janot. Temer e mais cinco pessoas foram denunciadas.
As suspeitas de um possível esquema de corrupção envolvendo o ex-presidente no enorme porto no litoral de São Paulo são antigas - vêm de antes da Lava Jato e até mesmo da primeira eleição de Temer como vice-presidente da República, em 2011. Resumidamente, o ex-presidente é acusado de receber dinheiro para favorecer empresas que atuam no porto - considerado uma antiga área de influência do emedebista.
Na reportagem anterior da BBC sobre o tema, estes casos são descritos nos números 6, 8, 9 e 10.
Em Brasília, os casos foram distribuídos entre dois procuradores da Procuradoria da República no Distrito Federal.
Anselmo Lopes - responsável por outra investigação de corrupção, a operação Greenfield - cuidará dos casos do "quadrilhão" e do inquérito dos portos - esses casos ainda não chegaram ao procurador, segundo apurou a reportagem da BBC News Brasil.
Já Carlos Henrique Martins Lima, o "Caíque", é o responsável atual pelas investigações do caso JBS.
No começo desta semana, Carlos Henrique disse estar de acordo com a denúncia anteriormente apresentada pela PGR no caso JBS. E, na quinta-feira, a denúncia foi acolhida pelo juiz do caso, tornando Temer réu pela primeira vez nas investigações da Lava Jato.
Embora o processo relativo a Temer ainda esteja no começo, este caso pode chegar a seu final em breve em relação a outro acusado: Rodrigo Rocha Loures. O caso dele chegou antes à primeira instância, e já está bastante avançado. Acusação e defesa já apresentaram suas alegações finais, que são a última etapa antes da sentença.
Rio de Janeiro - um caso
O juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, é o responsável pela investigação que resultou na prisão de Temer.
Nesta sexta-feira, os procuradores da Lava Jato no Rio de Janeiro apresentaram duas denúncias contra o ex-presidente, por fatos relacionados a esta investigação. Em uma das denúncias, Temer é acusado dos crimes de corrupção e peculato (apropriação de dinheiro público); na outra, de lavagem de dinheiro. O ex-ministro Moreira Franco, que tinha sido preso junto na mesma operação em que Temer, também foi denunciado.
Nesta investigação, o Ministério Público acusa Temer de ter bancado politicamente a indicação do ex-presidente da empresa estatal Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro da Silva. A Eletronuclear teria, então, aceitado o superfaturamento de obras contratadas com a empreiteira Engevix, e esta teria devolvido parte dos valores a Temer por intermédio do coronel Lima.
O inquérito foi aberto depois que Temer deixou a Presidência, mas a investigação se baseia em informações muito mais antigas. Elas foram coletadas em três fases da Lava Jato do Rio de Janeiro (Radioatividade, de 2015; Pripyat, de 2016; e Irmandade, também de 2016); e também na delação premiada do dono da Engevix, José Antunes Sobrinho - aceita pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso em outubro de 2018.
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