Topo

Kataguiri rebate críticas de ativistas pró-Bolsonaro: 'Radicais cegos e alucinados'

Letícia Mori - Da BBC News Brasil em São Paulo

21/05/2019 18h24

Deputado federal e líder do MBL diz que presidente precisa parar de atacar o Parlamento e organizar seu partido, e que não apoia protestos do dia 26 a favor do presidente por não compactuar 'nem com fechamento de Congresso, nem com fechamento de STF'.

Um dos principais líderes das manifestações de rua que deram força ao impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) em 2015 e 2016, o hoje deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) está entre os principais alvos de grupos que organizam e convocam atos de rua para domingo, 26, em apoio ao presidente Jair Bolsonaro (PSL).

"(São grupos) radicais mostrando o quanto estão cegos pelo adesismo. Como todo radicalismo, satura e passa. Conversamos com os sensatos e ignoramos os alucinados", afirma Kataguiri em entrevista à BBC News Brasil.

O MBL, que já defendeu a ocupação do Congresso Nacional durante o governo petista e fez atos contra exposições, diz que não apoia os protestos previstos para o dia 26 porque a pauta é majoritariamente autoritária.

"Movimento liberal não compactua nem com fechamento de Congresso, nem com fechamento de STF. Você pode e deve criticar atitudes de membros dessas instituições, mas nunca demonizá-las. Presidente que se diz conservador não pode atropelar instituição democrática", diz Kataguiri.

Inicialmente apoiados por Bolsonaro, seus filhos e militantes digitais, os protestos marcados para domingo têm uma pauta difusa. Não há defesa explícita de fechamento das instituições entre os principais articuladores, mas têm circulado nas redes sociais mensagens sobre fechamento do STF e postagens sobre a manifestação estavam sendo acompanhadas pela hashtag #vamosinvadirocongresso no Twitter nesta semana.

Governo recuou

A poucos dias dos atos, ativistas tentam concentrar as reivindicações em demonstrações de apoio à reforma da Previdência, ao pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, e à instalação de uma CPI contra magistrados e membros do Supremo Tribunal Federal.

As convocações também pedem uma pressão contra parlamentares acusados de pedirem cargos e verbas em troca de apoio à agenda governista no Congresso - mais especificamente a reforma administrativa de Bolsonaro que enxugou ministérios e agora corre o risco de ser revertida na Câmara.

As manifestações convocadas acabaram criticadas até pelo próprio presidente nacional do PSL, Luciano Bivar, que disse não ver sentido nos atos já que Bolsonaro ganhou a eleição. Ante a repercussão negativa, principalmente na classe política, Bolsonaro desistiu de ir ao ato e desencorajou a presença de seus ministros.

Kataguiri critica a estratégia política que Bolsonaro adotou em seu trato com o Legislativo - o presidente afirmou na segunda-feira, 20, que a classe política é "o grande problema" que atravanca o progresso do país. "[Ele precisa] parar de atacar o Parlamento e dar ordem expressa para que nenhum ataque parta da Esplanada (dos Ministérios) ou de seus filhos. Depois, organizar o próprio partido em prol da Previdência."

O MBL tem sido atacado também de grupos bolsonaristas nas redes. A ofensiva digital de bandeira #MBLTraidoresdaPatria levou à perda de seguidores em meio a acusações como a proximidade de membros do grupo com o ministro Gilmar Mendes, do STF, e do vice-presidente da República, Hamilton Mourão (PRTB).

Veja abaixo trechos da entrevista do deputado à BBC News Brasil:

BBC News Brasil - O presidente acertou ou errou ao soltar nota dizendo que o país está 'ingovernável'? Qual é a sua avaliação?

Kim Kataguiri - Errou. Passa sinal de fraqueza. O presidente deve passar firmeza e exercer liderança, principalmente em momento de crise. Desmobiliza a base, que já não tem muita força no Congresso Nacional.

BBC News Brasil - Qual foi a intenção do presidente com essa nota? Como membro do Congresso você se sentiu incomodado?

Kataguiri - Acho que ele não esperava a repercussão que teve. Não me senti incomodado, só achei ruim o presidente demonstrar fraqueza publicamente.

BBC News Brasil - O governo passa por um momento de desgaste com o Legislativo. O que precisa ser feito para melhorar a relação?

Kataguiri - O presidente [precisa] parar de atacar o Parlamento e dar ordem expressa para que nenhum ataque parta da Esplanada (dos Ministérios) ou de seus filhos. Depois, organizar o próprio partido em prol da Previdência.

BBC News Brasil - Por que o MBL decidiu não aderir à manifestação que está sendo convocada para o dia 26 de maio?

Kataguiri - Porque movimento liberal não compactua nem com fechamento de Congresso, nem com fechamento de STF. Você pode e deve criticar atitudes de membros dessas instituições, mas nunca demonizá-las. Presidente que se diz conservador não pode atropelar instituição democrática.

BBC News Brasil - E a manifestação do dia 26 tem esse caráter, na sua visão? De fechamento do Congresso e STF?

Kataguiri - Tentam diluir a pauta agora, mas o viés é claramente autoritário: conceder apoio incondicional ao presidente e atacar Congresso e STF.

BBC News Brasil - O Renan Santos, líder do MBL, falou em golpe no Twitter. Você concorda com ele?

Kataguiri - Não vejo força para que um golpe seja promovido, mas as pautas são autoritárias.

BBC News Brasil - O MBL tem recebido muitas críticas de bolsonaristas nas redes sociais, foram acusados de traidores por fazer esse tipo de crítica e não apoiar a manifestação. Como vocês recebem isso?

Kataguiri - (São) radicais mostrando o quanto estão cegos pelo adesismo. Como todo radicalismo, satura e passa. Conversamos com os sensatos e ignoramos os alucinados.

BBC News Brasil - A direita está rachada?

Kataguiri - Sempre teve suas divisões, elas só se explicitaram para fora da direita agora.

BBC News Brasil - Como assim?

Kataguiri - Liberais, conservadores, libertários, intervencionistas. Sempre houve essa divisão. Ela só ficou mais clara agora para o público em geral. Mas existe desde 2014.

BBC News Brasil - Mas quando a esquerda estava no governo, esses grupos conseguiram se unir, por exemplo, para apoiar o impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Essa união acabou? Por que você acha que agora as divisões estão mais evidentes?

Kataguiri - Se uniram só depois que vencemos a briga com Olavo (de Carvalho), que defendia intervenção popular, o que tinha apoio dos intervencionistas e conservadores. A tese defendida (por eles) era outra, e continua sendo, só que agora Olavo influencia o Planalto.

BBC News Brasil - Qual é essa tese?

Kataguiri - De que nenhuma saída institucional é possível no nosso sistema corrompido, e que devemos, por meio de uma revolução cultural popular, tomar os espaços de poder à força e implementar uma democracia plebiscitária.

BBC News Brasil - E você acha que o presidente compactua com isso?

Kataguiri - Ele nem entende, mas se deixa influenciar e acaba tomando atitudes que, sem que ele esteja completamente consciente disso, levam a esse caminho.

BBC News Brasil - E essas divisões, discussões públicas (como a sua com a deputada federal Joice Hasselmann, por exemplo) não podem enfraquecer mais ainda o governo e impedir a aprovação de pautas prioritárias como a reforma da previdência?

Kataguiri - O governo já está enfraquecendo, mas existe um esforço do Parlamento para que o avanço das reformas não dependa do Planalto, o que isola as reformas desse tipo de comprometimento.

BBC News Brasil - Como?

Kataguiri - Meu esforço é no sentido de transformar a pauta no mais popular possível, afinal, quanto menor o ônus político, maior a possibilidade de a Câmara votar. Pode ter uma fluidez semelhante à tributária.


Já assistiu aos nossos novos vídeos no YouTube? Inscreva-se no nosso canal!

https://www.youtube.com/watch?v=uLpL8X4WF2o

https://www.youtube.com/watch?v=YPsc4zsMaPA

https://www.youtube.com/watch?v=9t7HMxp1UWI