O que se sabe sobre o paradeiro de Carlos Wizard, bilionário investigado pela CPI da Covid
O empresário Carlos Wizard, um dos investigados pela Comissão Parlamentar de Inquérito da Covid-19, deve finalmente prestar depoimento aos senadores no próximo dia 30. A informação foi confirmada pelo presidente da CPI, o senador Omar Aziz (PSD-AM).
O anúncio do depoimento ocorre um dia depois de Aziz ter afirmado à Folha de S.Paulo que iria pedir ajuda à Interpol (Organização Internacional de Polícia Criminal) para localizar o paradeiro do empresário.
O depoimento de Wizard é um dos mais aguardados da CPI.
Ele seria um dos membros do chamado "gabinete paralelo", grupo de pessoas que não fazem parte do Ministério da Saúde e que teriam aconselhado o presidente Jair Bolsonaro durante a pandemia.
O empresário não compareceu à primeira convocação da CPI, prevista para o dia 17 de junho, alegando estar fora do país. Com a ausência, o Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a condução coercitiva e apreensão do passaporte de Wizard.
Na quinta-feira, a Polícia Federal tentou cumprir a condução coercitiva na casa do empresário em Campinas, no interior de São Paulo, mas ele não foi encontrado.
Três dias antes, no dia 14, os advogados dos empresário enviaram um ofício ao senador Omar Aziz afirmando que Wizard não participaria presencialmente da CPI por estar "fora do território nacional".
Segundo eles, o empresário saiu do Brasil em 30 de março, passou pelo México, e chegou aos Estados Unidos. Desde então, ele está no país "acompanhando o tratamento médico de um familiar", afirmaram os defensores.
No documento, os advogados afirmam que, caso Wizard deixasse os EUA para depor à CPI, não poderia retornar por causa das medidas de restrição impostas pelo governo americano a pessoas saídas do Brasil. Ele teria que ficar em quarentena em um terceiro país antes de voltar aos EUA.
Os defensores pediram que o empresário falasse à CPI por videoconferência, o que não foi aceito pelos membros da comissão. Segundo Aziz, um depoimento à distância atrapalharia as investigações.
Também no dia 14, Wizard participou de uma live nas redes sociais com o coach Marcos Rossi. Durante a transmissão, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AC), vice-presidente da CPI, fez um comentário no perfil do empresário.
"Olá, sr. Carlos Wizard. Vim lembrar vc do seu compromisso na próxima quinta (17), na CPI da covid", escreveu o parlamentar.
Wizard havia sido originalmente convocado como testemunha e, agora, é oficialmente investigado pela comissão, junto com outras 13 pessoas.
Sigilo quebrado
O bilionário teve seus sigilos telefônico e bancário quebrados pela CPI, mas seus advogados tentam pela segunda vez reverter essa medida no STF. O primeiro pedido foi negado pela ministra Rosa Weber.
A Corte havia concedido na quarta-feira (16/6) a Wizard um habeas corpus para que ele pudesse ficar em silêncio e não se incriminasse diante dos senadores.
Mas o depoimento não ocorreu porque, de acordo com sua defesa, não houve tempo hábil para que o bilionário providenciasse seu retorno ao país após a decisão do STF.
A BBC News Brasil tentou contato com a equipe de advogados de Wizard, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.
Por que Wizard é investigado?
Carlos Wizard é investigado por seu suposto envolvimento no "gabinete paralelo" que teria aconselhado o presidente Bolsonaro no combate à pandemia.
A médica Nise Yamaguchi admitiu à CPI ter participado de um "conselho científico independente" com o empresário.
Ele também foi citado pelo ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, que confirmou em seu depoimento ter sido aconselhado pelo empresário e que chegou a oferecer um cargo a ele na sua pasta.
Wizard já teria declarado em uma entrevista à TV Brasil ter passado um mês em Brasília no ano passado como conselheiro do então ministro e sido convidado por ele para assumir uma secretaria.
O empresário preferiu não aceitar o cargo para, segundo ele, seguir atuando de forma independente junto ao governo federal, que tinha um conselho paralelo ao Ministério da Saúde sobre as ações de combate à pandemia, segundo o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS).
"Foi neste momento que eu tive, então, a oportunidade de conhecer autoridades médicas que são reconhecidas tanto no Brasil quanto no exterior, como a doutora Nise Yamaguchi, doutor Roberto Zeballos, doutor Anthony Wong, Dante Serra, e muitos outros que participam desse conselho científico independente", disse Wizard.
"Ou seja, são voluntários que estão dedicados, dedicando seu tempo, sua habilidade, sua experiência, compartilhando com a população o tratamento precoce."
Em seu depoimento à CPI, o general Pazuello afirmou que foi ele quem convidou Wizard a contribuir.
O general afirmou que conheceu o empresário em 2018, durante a operação realizada em Boa Vista, em Roraima, para receber o grande número de imigrantes venezuelanos que chegavam ao Brasil fugindo da crise em seu país.
Pazuello coordenou estes esforços em Roraima. Wizard e sua mulher, que são mórmons, atuaram por dois anos em atividades sociais para acolher os venezuelanos no Estado. O empresário e o ex-ministro se tornaram amigos por causa disso.
"Quando fui chamado pra cá, o puxei, e pedi ajuda por ele ser um grande link entre o Ministério da Saúde e a compreensão da parte social, do público", disse Pazuello na CPI.
Por causa de suas empresas, Wizard não aceitou o convite para ser secretário, de acordo com o ex-ministro.
Pazuello disse que Wizard propôs reunir médicos em um conselho para ajudar o ministério. O ex-ministro disse, no entanto, que fez apenas uma "meia reunião" e que isso foi suficiente para "não aceitar" a proposta.
"Na primeira vez que sentei para ouvir as ideias dos médicos, não gostei da dinâmica da conversa. Foi uma única vez, não tive aconselhamento nem assessoramento de grupos de médicos."
Pazuello declarou ainda que nunca viu Wizard em Brasília para falar com o presidente da República.
O empresário terá agora de esclarecer qual foi seu papel junto ao governo no combate à pandemia.
Quem é Carlos Wizard
O curitibano Carlos Roberto Martins tem 64 anos e é mais conhecido por ter criado em 1987 a franquia de escolas de inglês Wizard, da qual adotou o nome.
Ele conta que teria aprendido o método de ensino usado nestas escolas na Igreja dos Santos dos Últimos Dias, da qual é seguidor.
Wizard comprou outras empresas de educação, criando o Grupo Multi, e, conforme noticiou o jornal Valor, decidiu vender o negócio para o grupo britânico Pearson, por R$ 1,95 bilhão, em 2013.
Ele criou então uma gestora de investimentos, a Sforza, à frente da qual também estão dois de seus seis filhos, Charles e Lincoln. A gestora tem em seu portfólio empresas de alimentação, educação, esportes e serviços financeiros, entre outros.
Wizard prefere se apresentar hoje como um empreendedor social e faz as vezes de guru dos negócios.
É autor de livros como Desperte o milionário que há em você, Sonhos não têm limite (sua biografia), Do zero ao milhão e Meu maior empreendimento.
Ele também costuma dar lições a quem deseja ser um empreendedor de sucesso por meio de suas redes sociais.
"O impossível é só uma opinião", diz em um dos seus posts no Instagram, sua rede social mais popular, com 282 mil seguidores.
"Líderes não aguardam, líderes agem", afirma ele em outra publicação.
"Líderes focam na solução, não no problema", diz Wizard em mais um post.
Foi o que ele fez diante da pandemia, quando se tornou um dos principais defensores do uso da cloroquina e de outros medicamentos contra a covid-19, mesmo que não houvesse comprovação científica de eficácia.
Wizard disse à revista Época que o que o motivou a agir assim foi ter perdido um sobrinho para a doença e acreditar que ele poderia ter sido salvo caso tivesse recebido um suposto tratamento precoce.
O empresário também falou contra as medidas mais rígidas de isolamento social, porque teriam um impacto negativo sobre a economia e seriam pouco eficazes no combate à pandemia.
"Todos os estudos indicam que o lockdown, por si só, não reduz o número de óbitos", afirmou à revista IstoÉ em agosto do ano passado.
Sem formação na área - ele é graduado em ciência da computação e estatística por uma universidade dos Estados Unidos, onde morou -, ele se apoiava num conselho de especialistas que ele próprio havia formado.
Proximidade com o governo
Seja por essa afinidade com as opiniões do governo seja pela amizade com Pazuello, Wizard tornou-se uma figura frequente na órbita do governo Bolsonaro.
Exibe nas redes sociais fotos com os principais nomes do primeiro escalão do Planalto, como o vice-presidente Hamilton Mourão, os ministros Paulo Guedes, Damares Alves e André Mendonça, além da primeira dama Michele e do próprio presidente.
Apesar disso, costuma dizer que não é político nem tem pretensões políticas.
Nos últimos tempos, o empresário se empenha em uma campanha, junto com Luciano Hang, dono da rede Havan e um dos aliados de primeira hora de Bolsonaro.
Wizard se refere a Hang como seu amigo e diz que eles têm trabalhado juntos para aprovar no Congresso Nacional uma lei que permita a empresas comprar vacinas.
O texto já foi aprovado na Câmara e está desde o início de abril no Senado. A demora na sua apreciação já rendeu críticas de Wizard aos senadores.
"Enquanto o Senado não aprova a doação de vacinas aos trabalhadores pelos empresários, o prefeito de Nova York oferece vacinas gratuitas aos brasileiros. Em sua opinião, qual é razão do Senado aprovar a CPI da Covid e desaprovar a doação de vacinas aos trabalhadores? Qual será a real motivação?", perguntou o empresário em uma rede social.
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