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Rússia está mais perto de invadir Ucrânia? Os novos desdobramentos da crise

A TV russa exibiu, no início de 2022, exercícios de tanques perto da fronteira com a Ucrânia - Ministério de Defesa da Rússia
A TV russa exibiu, no início de 2022, exercícios de tanques perto da fronteira com a Ucrânia Imagem: Ministério de Defesa da Rússia

22/01/2022 07h04Atualizada em 22/01/2022 09h06

Governo russo, que postou tropas na fronteira com o vizinho, quer que a Otan não inclua a Ucrânia como membro, o que a organização não aceita.

O Exército russo está se preparando para uma guerra com a Ucrânia? O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, certamente está esperando algum tipo de movimento militar de Moscou no país do Leste Europeu.

A Rússia quer que o Ocidente prometa que a Ucrânia não fará parte da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte, a aliança militar ocidental), mas, embora os dois lados estejam negociando, esse desejo russo não será atendido. O que vai acontecer a partir de agora pode colocar em risco toda a estrutura de segurança da Europa.

A seguir, os desdobramentos mais recentes da crise, divididos em sete pontos:

Por que a Rússia está ameaçando a Ucrânia?

A Rússia nega que esteja planejando uma invasão da Ucrânia, mas já tomou parte do território ucraniano antes. Além disso, estima-se que Moscou possua 100 mil soldados próximo à fronteira entre os dois países.

Na sexta-feira (21/01), o chanceler russo, Sergei Lavrov, se encontrou com o secretário de Estado dos EUA, Anthony Blinken, para conversas "francas" para tentar reduzir as chances de um conflito mais amplo na Ucrânia. Enquanto Lavrov voltou a negar que as numerosas tropas russas na fronteira estejam se preparando para uma invasão, Blinken afirmou que os EUA responderiam duro caso isso aconteça, incluindo novas sanções a Moscou.

Há tempos a Rússia vem tentando barrar qualquer movimento da Ucrânia na direção de instituições europeias e da Otan, em particular. A Ucrânia faz fronteira tanto com a União Europeia como com a Rússia, mas sendo uma ex-república soviética tem profundos laços sociais e culturais com a Rússia. O russo é amplamente falado na Ucrânia.

Quando ucranianos depuseram o presidente pró-Rússia Viktor Yanukovych, em 2014, a Rússia anexou a península ucraniana da Crimeia e apoiou forças separatistas alinhadas a Moscou, as quais capturaram vastas áreas no leste da Ucrânia. Desde então, os rebeldes seguem combatendo as forças ucranianas na região, num conflito que já deixou mais de 14 mil mortos.

É grande o risco de uma invasão?

A Rússia diz que não tem planos de atacar a Ucrânia. O chefe das Forças Armadas russas, Valery Gerasimov, até chamou de mentirosos os relatos de uma invasão iminente.

As tensões, no entanto, são grandes, e o presidente russo, Vladimir Putin, ameaçou "medidas retaliatórias tecno-militares apropriadas" caso continue o que ele chama de abordagem agressiva do Ocidente.

Os EUA, por sua vez, acusaram a Rússia, em 14/01, de enviar sabotadores ao leste da Ucrânia para simular um incidente ou confronto que servisse de justificativa para uma ação militar russa no país vizinho. Alguns dias depois, em entrevista coletiva, quando foi questionado por jornalistas sobre as tensões, o presidente Joe Biden respondeu: "Se eu acho que ele (Putin) vai testar o Ocidente, os EUA e a Otan o máximo que puder? Sim. Mas acho que ele pagará um preço caro e se arrependerá".

O secretário-geral da Otan, Jens Stoltenberg, também alertou que o risco de um conflito militar é real.

Os EUA dizem que a Rússia não ofereceu nenhuma explicação para o fato de que tropas do país tenham sido alocadas próximo à Ucrânia e soldados e tanques russo foram enviados para Belarus, país aliado de Moscou, para exercícios militares.

O vice-ministro do Exterior da Rússia, Sergei Ryabkov, comparou a situação atual com a crise dos mísseis em Cuba de 1962, quando os EUA e a União Soviética chegaram perto de um conflito nuclear. O serviço de inteligência americano sugere que uma incursão ou mesmo invasão russa na Ucrânia poderia ocorrer ainda no início de 2022.

O que a Rússia quer da Otan?

A Rússia falou de um "momento da verdade" ao se referir a uma reconfiguração de sua relação com a Otan. "Para nós, é absolutamente obrigatório assegurar que a Ucrânia nunca, nunca mesmo, se torne membro da Otan", disse o vice-ministro do Exterior russo.

Moscou acusa os países-membros da Otan de "encher" a Ucrânia de armamentos e os EUA de alimentar as tensões. O presidente Putin reclamou que a Rússia "não tem mais para onde recuar. Eles acham que vamos apenas ficar sentados, só olhando?"

Na realidade, a Rússia quer que a Otan retorne a suas fronteiras de antes de 1997. O país exige que não haja mais nenhuma expansão na direção do Oriente e quer o fim das atividades militares da Otan no Leste Europeu. Isso significaria a retirada de unidades de combate da Polônia e das repúblicas bálticas ? a Estônia, a Letônia e a Lituânia ? e que nenhum míssil seja instalado em países como a Polônia e a Romênia.

A Rússia também propôs um tratado com os EUA impedindo que armas nucleares sejam instaladas fora de seus territórios nacionais.

O que a Rússia quer na Ucrânia?

A Rússia tomou a Crimeia em 2014 argumentando que possuía uma reivindicação histórica legítima pelo território. A Ucrânia era parte da União Soviética, que se desintegrou em 1991. Putin afirmou que esse colapso foi a "desintegração da Rússia histórica".

Uma indicação do que Putin pensa sobre a Ucrânia veio em um longo texto do ano passado, em que ele disse que russos e ucranianos formavam "uma nação". Ele acusou os atuais líderes da Ucrânia de estarem realizando um "projeto anti-Rússia".

A Rússia também ficou frustrada com o fato de que um acordo de paz para o leste da Ucrânia, estabelecido em 2015 em Minsk (Belarus), está longe de ser completamente implementado.

Ainda não existem arranjos para a realização de eleições monitoradas de forma independente nas regiões separatistas da Ucrânia. A Rússia nega acusações de que esteja envolvida no conflito local.

Uma ação da Rússia pode ser impedida?

Putin falou com Biden sobre a crise várias vezes, e as negociações de alto escalão continuam. Oficiais russos, porém, avisam que a rejeição por parte do Ocidente de suas principais demandas está levando a crise para um "beco sem saída".

A questão é até onde irá a Rússia. Biden alertou que uma invasão de larga escala será um desastre para a Rússia. Se o país, no entanto, realizar uma incursão territorial de pequena escala, o presidente americano afirmou, de forma controversa, que o Ocidente "acabaria tendo que debater sobre o que fazer".

A Casa Branca reforçou que qualquer movimento cruzando a fronteira constitui uma nova invasão ? mas aponta para o fato de que a Rússia possui outras armas, incluindo ataques cibernéticos e táticas paramilitares.

A Rússia também distribuiu 500 mil passaportes para residentes de áreas na Ucrânia dominadas por rebeldes. Com isso, caso não consiga o que deseja, Moscou poderia justificar alguma ação militar dizendo que tinha como objetivo a proteção de cidadãos russos na região.

Entretanto, se a o único objetivo da Rússia for forçar a Otan para longe de sua vizinhança, não há nenhum sinal de que será bem-sucedida.

Os 30 países-membros da Otan rejeitaram claramente qualquer tentativa de atar suas mãos em relação ao futuro. "Nós não permitiremos que ninguém feche a política de portas abertas da Otan", disse o vice-secretário de Estado americano, Wendy Sherman.

A Ucrânia busca um cronograma claro para poder entrar na Otan, e a organização afirma que a Rússia "não tem poder de veto ou direito de interferir nesse processo".

A Suécia e a Finlândia, nações nórdicas que não fazem parte da Otan, também rejeitaram a tentativa da Rússia de impedi-los de fortalecer seus laços com a aliança militar ocidental. "Nós não abandonaremos nosso espaço de manobra", afirmou a primeira-ministra finlandesa, Sanna Marin.

Até onde irá o Ocidente pela Ucrânia?

Os EUA deixaram claro que não possuem planos de enviar tropas de combate para a região, embora mantenham-se comprometidos em ajudar a Ucrânia a defender seu "território soberano".

As principais ferramentas que o Ocidente possuiu parecem ser sanções contra a Rússia e ajuda militar à Ucrânia, na forma de consultores e armas.

O presidente Biden ameaçou o líder russo com medidas "que ele jamais viu" se a Ucrânia for atacada. Mas que tipo de medidas seriam essas?

A medida econômica de maior impacto seria desconectar o sistema bancário da Rússia do sistema de pagamentos internacional Swift. Isso sempre foi visto como uma espécie de último recurso, mas a Letônia disse recentemente que serviria como um recado duro para Moscou.

Na semana passada, senadores democratas dos EUA apresentaram um projeto de lei com a imposição de sanções diretas ao governo russo (incluindo a Vladimir Putin) e a instituições financeiras de Moscou. Essas se somariam a sanções pré-existentes, que vigoram desde 2014 (por causa da anexação da Crimeia) e aumentaram depois do envenenamento de um espião russo no Reino Unido e das acusações de interferência russa nas eleições de 2016 nos EUA (o que a Rússia nega)..

Outra ameaça chave seria impedir a abertura do sistema de dutos de gás Nord Stream 2, na Alemanha, cuja aprovação está atualmente sendo decidida pela agência reguladora de energia alemã.

Também poderia haver medidas contra o fundo soberano RDIF, da Rússia, ou restrições a transações de bancos na conversão do rublo, a moeda russa, para moedas estrangeiras.

O Ocidente está unido?

Os EUA disseram estar comprometidos em "trabalhar em perfeita sintonia" com seus aliados, mas há divisões entre os americanos e a Europa.

Líderes europeus estão determinados em sua posição de que a Rússia não pode decidir o futuro apenas com os Estados Unidos. A França inclusive propôs que os europeus trabalhem em conjunto com a Otan e depois conduzam seu próprio diálogo com a Rússia.

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, quer a realização de uma cúpula internacional, envolvendo a França e a Alemanha, juntamente com a Rússia, para resolver a crise.

*Com reportagem de Paul Kirby, da BBC News