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Guerra na Ucrânia: editora interrompe jornal em TV russa com protesto contra o conflito

15/03/2022 12h34

O cartaz visível atrás da apresentadora do telejornal dizia: "Não à guerra, pare a guerra, não acredite na propaganda, eles estão mentindo para você aqui".

Uma mulher segurando um cartaz de protesto contra a guerra na Ucrânia invadiu ao vivo o set de um telejornal russo controlado pelo governo da Rússia.

O cartaz, claramente visível atrás da apresentadora, dizia: "Não à guerra, pare a guerra, não acredite na propaganda, eles estão mentindo para você aqui".

A mulher chama-se Marina Ovsyannikova e é editora do canal 1. O programa Vremya (Tempo, em russo) é o principal telejornal da Rússia.

Os telejornais na Rússia são rigidamente controlados pelo Kremlin e refletem apenas a versão russa dos eventos na Ucrânia.

Sua voz podia ser ouvida durante a transmissão: "Não à guerra! Pare a guerra!", antes que o diretor do programa cortasse a imagem, transmitindo uma reportagem gravada.

Antes do protesto, que aconteceu no telejornal noturno, ela havia gravado um vídeo no qual chamou os eventos na Ucrânia de "crime" e disse ter vergonha de trabalhar para o que chamou de propaganda do Kremlin.

"Tenho vergonha por ter me permitido contar mentiras na televisão. Vergonha por ter permitido que russos fossem transformados em zumbis", explicou ela.

Ela convocou o povo russo a protestar contra a guerra, dizendo que só eles poderiam "pôr fim à loucura".

Desde o momento em que a identidade de Ovsyannikova se tornou conhecida, ela recebeu dezenas de comentários e agradecimentos em sua página do Facebook em ucraniano, russo e inglês.

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, também a elogiou por "dizer a verdade".

Já o presidente francês, Emmanuel Macron, disse que a França vai oferecer proteção a ela, seja na embaixada ou por meio de asilo, e disse que discutirá isso em sua próxima conversa com o presidente russo, Vladimir Putin.

Mas o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, descreveu as ações de Ovsyannikova como um ato de "vandalismo".

Os colegas de Ovsyannikova no Canal 1 ficaram surpresos com suas ações.

Um deles disse ao blog Faridaily ? dirigido pela ex-jornalista do Serviço Russo da BBC Farida Rustamova ? que Ovsyannikova, que tem dois filhos, nunca discutia política, e seus papos eram "principalmente sobre crianças, cachorros e a casa".

Outro também expressou choque.

"Fiquei pasmo. Todos meus amigos estavam assistindo ao vivo. Ninguém esperava isso. Foi tão inacreditável e corajoso", disse à BBC Dmitry Yelovsky, editor da TV Rain, um canal independente que está impedido de cobrir a guerra.

"Ela está detida e não sabemos onde ela está agora. Primeiro houve informações de que promotores iam denunciá-la por desacreditar os militares russos, o que daria uma multa de centenas de libras, mas depois começamos a receber informações de que ela deve ser processada por espalhar notícias falsas, que é a lei nova aprovada pelo parlamento russo antes da operação militar (na Ucrânia), e isso pode levar a 15 anos de prisão, o que é inacreditável", acrescentou ele, logo após o ocorrido.

Mas, nesta terça-feira (15/3), em meio a dúvidas sobre seu paradeiro, Ovsyannikova apareceu diante de um tribunal na capital russa, Moscou.

Ela havia sido dada como desaparecida por advogados que disseram estar procurando por ela a noite toda.

Ovsyannikova foi indiciada pelo crime de organizar um evento público não autorizado.

Sua pena pode variar entre multa, serviço comunitário ou até 10 dias de prisão.

Havia temores de que Ovsyannikova pudesse ser alvo de uma nova lei mais dura que proíbe chamar a ação militar da Rússia na Ucrânia de "invasão" ou espalhar "notícias falsas" sobre o conflito.

Uma imagem amplamente divulgada na imprensa russa parecia mostrar Ovsyannikova no tribunal com o advogado Anton Gashinsky.

Televisão controlada pelo Estado

Os telejornais há muito são controlados pelo Kremlin. Pontos de vista independentes são raros em todos os principais canais.

Mas novas leis introduzidas desde a invasão da Ucrânia tornaram o cenário da mídia ainda mais draconiano. A legislação aprovada no início deste mês tornou ilegal chamar a ação militar de "invasão" ou divulgar notícias "falsas" sobre ela.

A mídia russa controlada pelo Estado se refere à guerra como uma "operação militar especial" e caracteriza a Ucrânia como agressora, com um governo descrito como neonazista.

Vários dos meios de comunicação independentes pararam de operar após pressão das autoridades, incluindo a estação de rádio Echo of Moscow e a TV Rain, um canal de TV online.

Outros, como o jornal Novaya Gazeta, estão tentando informar sobre a situação sem burlar as novas leis de censura.

O acesso à BBC também foi restrito dentro da Rússia. A BBC está orientando o público na Rússia sobre como continuar usando seus serviços.

O órgão de supervisão da mídia da Rússia acusa a BBC e outras emissoras estrangeiras de "circulação deliberada e sistemática de materiais contendo informações falsas".

Muitos sites de mídia social também foram bloqueados, restringindo ainda mais o número e a diversidade de fontes de notícias disponíveis para pessoas dentro da Rússia.

O Facebook e o Twitter foram bloqueados por vários dias, e o Instagram - que é muito popular na Rússia - foi bloqueado na segunda-feira, embora muitos russos tenham encontrado maneiras de contornar as restrições.


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