Leste Europeu relaciona atentados a refugiados
Primeiro vieram as palavras de condolência para com o povo belga: de Varsóvia, Praga e outras capitais da Europa Central e do Leste manifestou-se a consternação pelos atentados desta terça-feira (22/03) em Bruxelas.
"Todos os valores que prezamos, como fundamento para a constituição de uma comunidade, começam a cair em escombros", comentou na ocasião a primeira-ministra polonesa, Beata Szyd?o. O tom era de comoção, mas também soava como se ela ainda não tivesse dito a última palavra a respeito.
E, de fato, menos de 24 horas mais tarde, a chefe de governo anunciava que no momento não vê qualquer possibilidade "de que refugiados venham para a Polônia". O plano era que no fim de março deveriam chegar os primeiros 100 de 400 sírios. O governo anterior se comprometera no ano passado acolher até 11.500 pessoas. Como assegurara também a Berlim, o gabinete de Szyd?o pretendia manter a promessa.
Especialistas interpretam esse recuo como falta de solidariedade. "Com o modesto número de 400 refugiados por ano, ninguém precisa temer a formação de sociedades paralelas", comenta Kai-Olaf Lang, do Instituto Alemão de Relações Internacionais e Segurança (SWP), sediado em Berlim. Para ele, a marcha a ré tão imediata mostra, antes, que os atentados de Bruxelas foram tomados como pretexto.
Falsa correlação
A Polônia não é exceção, pois, "com os ataques terroristas em Bruxelas, os cidadãos do Leste Europeu se sentem confirmados no pressuposto de que haveria uma correlação entre a imigração de refugiados e o perigo do terrorismo", explica Lang. As reações de todos os Estados do Grupo de Visegrád (Eslováquia, Hungria, Polônia, República Tcheca), e mais além, confirmam essa opinião.
De Budapeste, o ministro do Exterior húngaro, Péter Szijjártó, afirmou à agência de notícias estatal que o perigo terrorista aumentou devido à imigração ilegal descontrolada. Até mesmo no comunicado oficial da bancada parlamentar do partido nacional-conservador Fidesz consta que "a Europa está pagando agora por sua política, com as vidas de seus cidadãos".
"Tais declarações visam, por um lado, provocar no âmbito da política interna; por outro, são também um sinal na direção de Berlim e Bruxelas", deduz Jakob Wöllenstein, da Fundação Konrad Adenauer, em Berlim. Em particular na Hungria, essa certeza de estar com a razão não parte do nada.
"Desde o início, no debate sobre os refugiados, o país chamou a atenção para a política de segurança, e se sente agora mais do que confirmado", prossegue o especialista. Ele frisa que esses governos da Europa Central abafam o fato de não existir qualquer ligação entre os refugiados e os atentados recentes, já que todos os três autores nasceram na Bélgica.
Reações imediatas
Tampouco na República Tcheca e na Eslováquia percebe-se um esforço para distinguir claramente entre refugiados e terroristas. O mesmo se aplica à Bulgária: em Sófia, desde os ataques terroristas o primeiro-ministro Boiko Borissov incita contra os refugiados. "É impossível integrar terroristas", afirma, acrescentando que "não é justo a Europa gastar bilhões com essas pessoas, e elas nos atingirem diretamente no coração".
A violenta reação da Bulgária aos atentados em Bruxelas ainda poderia ser explicada pelas vivências recentes do país com o terror fundamentalista islâmico. Em meados de 2014, um terrorista suicida libanês se detonou num ônibus com turistas israelenses no aeroporto de Burgas, matando sete e ferindo 30. Por isso, mesmo que se empenhe para ser integrada ao Espaço de Schengen, Sófia adotou controle total nas fronteiras e aumentou significativamente a presença policial.
Apesar de não terem esse tipo de experiência e de só haverem acolhido um número modesto de refugiados, outros países do Leste e Centro da Europa adotaram imediatamente numerosas medidas de segurança.
Húngaros e tchecos elevaram o nível de alerta. Praga mobilizou mais policiais e também o Exército para a área das usinas termonucleares de Temelín e Dukovany. Na Polônia, Romênia e Eslováquia, dentro de poucas horas a presença policial era bem mais ostensiva, sobretudo em aeroportos, estações ferroviárias, metrôs e nas vizinhanças de embaixadas e consulados.
Duas narrativas de Europa
Com tais medidas, os governos em questão visam, em primeira linha, emitir um sinal interno: o Estado zela pela segurança dos cidadãos. "Muitos na região colocam a situação como se pudessem resolvê-la em nível nacional, o que é irrealista", diz Wöllenstein. Em tais assuntos, a linha divisória entre política interna e externa é sempre fluida, acentua.
Para Lang, "as reações dos europeus orientais resultam de duas narrativas opostas na Europa". "Os do Oeste querem manter sua sociedade aberta, sem serem forçados pelos terroristas a medidas de segurança excessivas. Em compensação, estão dispostos a aceitar certo risco."
Na Europa do Leste, em contrapartida, faz-se de tudo para não chegar a esse ponto, prossegue o especialista do SWP. Lá, os governos estão inteiramente convencidos do próprio ponto de vista, até por contarem com o respaldo de suficientes cidadãos céticos.
Esse fato é perfeitamente visível nas redes sociais dos países em questão, mas também nos parlamentos. É o caso recente da Eslováquia, onde, há alguns dias, 14 extremistas de direita constam entre os 150 deputados federais.
Dentro em breve, o novo-antigo primeiro-ministro eslovaco, Robert Fico, notório por seu rechaço aos imigrantes muçulmanos, também poderá impor seu tom ao debate sobre os refugiados na Europa. Em julho deste ano, seu país assume a presidência rotativa do Conselho Europeu, ocupada atualmente pela Polônia.
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