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Crivella escapa de impeachment, mas continua alvo de investigação

João Soares (do Rio)

12/07/2018 20h52

Câmara do Rio nega abrir processo de afastamento contra prefeito, acusado de privilegiar evangélicos em seu governo. Político ainda terá que responder ao Tribunal de Contas e ao Ministério Público.A Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro rejeitou nesta quinta-feira (12/07), por 29 votos a 16, a abertura de um processo de impeachment contra o prefeito Marcelo Crivella (PRB). A votação foi realizada em sessão extraordinária na Casa, que teve seu recesso interrompido.

As duas representações contra Crivella, feitas pelo vereador Átila Alexandre Nunes (MDB) e pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol), tinham como fato motivador uma reunião secreta realizada pelo prefeito com 250 pastores e líderes de igrejas evangélicas revelada pelo jornal O Globo.

No encontro, consta que ele colocou seus assessores à disposição dos líderes religiosos para que tivessem acesso privilegiado a serviços públicos. Crivella sugeriu a possibilidade de mudar o local de pontos de ônibus para mais perto das igrejas e posições melhores em filas de cirurgias na rede pública.

"Nós estamos fazendo o mutirão da catarata. Contratei 15 mil cirurgias até o final do ano. Então, se os irmãos tiverem alguém na igreja com problema de catarata, se os irmãos conhecerem alguém, por favor falem com a Márcia [assessora]. É só conversar com a Márcia que ela vai anotar, vai encaminhar, e daqui a uma semana ou duas eles estão operando", disse o prefeito na reunião.

"Vamos aproveitar esse tempo que nós estamos na prefeitura para arrumar nossas igrejas. Se vocês quiserem fazer eventos no parque Madureira, está aqui o nosso líder, que é o doutor Valmir. Se vocês tiverem problema, tem o Manassés, o nosso companheiro, que cuida das pessoas com problema de vícios em drogas", acrescentou.

O vereador Tarcísio Motta, líder do Psol na Câmara do Rio, defendeu a abertura de análise do impedimento de Crivella na Casa por entender que o prefeito cometeu crime de responsabilidade e improbidade administrativa.

"Pouco importa se naquela reunião estavam evangélicos ou sindicalistas. Ao oferecer vantagens aos presentes, ele fere o princípio mais básico do nosso Estado de Direito, que é a igualdade entre todos os cidadãos. Nenhum cidadão, por ser aliado do prefeito, pode ter vantagens sobre os demais", afirmou.

O vereador Otoni de Paula (PSC), da base de Crivella, celebrou a decisão da Câmara como a derrota do "golpe". Em sua visão, é falso o argumento de que o prefeito governa para seu grupo religioso.

"Isso é história de quem perdeu na urna. Tenho muitas críticas ao Crivella, mas não posso aceitar sacanagem. Vamos passar impeachment produzido por repórter da Globo, por fitinha gravada?", contestou. "Eu era a favor de uma CPI. Agora, os que não passaram o impeachment querem uma CPI".

Crivella continua alvo de investigação

Apesar de ter obtido vitória na Câmara Municipal, Crivella terá sua força política testada nos próximos meses. Já foram coletadas 16 assinaturas para a abertura da "CPI da Márcia", em referência à assessora citada na gravação.

Também nesta quinta-feira, o Tribunal de Contas do Município (TCM) determinou que o prefeito terá 30 dias para apresentar novas informações sobre o déficit de 1,6 bilhão de reais nas contas do ano passado.

O relatório do conselheiro Nestor Rocha observou que o prefeito não adotou as medidas necessárias para equilibrar o orçamento anual. Com isso, há indícios de que pode ter havido desrespeito à Lei de Responsabilidade Fiscal.

Além disso, o Ministério Público Estadual abriu ação de improbidade contra o prefeito na última quarta-feira. Investigações conduzidas pelo órgão desde agosto do ano passado apontam que ele vem utilizando a máquina pública do município para atender a integrantes de igrejas evangélicas.

Fora a reunião com pastores no Palácio da Cidade, a promotoria do MP menciona a realização de eventos da igreja dentro de escolas públicas, o corte de patrocínio de eventos religiosos de matrizes afro-brasileiras e o uso gratuito da Cidade das Artes, um pavilhão cultural, para o Festival de Cinema Cristão.

Interesse eleitoral

O cientista político Ricardo Ismael, da PUC-Rio, sustenta que as denúncias contra o prefeito merecem investigação, mas avalia que a oposição aproveitou a impopularidade do prefeito para capitalizar politicamente a situação.

"A oposição quis marcar posição, ainda mais com o apoio de parte da mídia. Mesmo que o impeachment não tenha sido aprovado, esse movimento ajuda a cristalizar uma imagem negativa do prefeito. O cálculo político do Psol já mira a eleição municipal de 2020 e as eleições estaduais deste ano", analisou.

O vereador Tarcísio Motta nega que o movimento pelo impeachment tenha motivação eleitoral. "Não procede, porque o impeachment também favoreceria Eduardo Paes, nosso rival na disputa pelo governo estadual neste ano. Estamos endossando o trabalho de fiscalização que fazemos diariamente."

Motta afirmou que os parlamentares do Psol poderão solicitar um novo pedido de impeachment se forem confirmados crimes de responsabilidade no parecer final do TCM.

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