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'Vizinha grávida': buscas por vítimas no Marrocos entram em fase crítica

Prédio danificado na cidade de Amizmiz devastada por terremoto no Marrocos Imagem: NACHO DOCE/REUTERS

Cathrin Schaer;Ismail Azzam;Rim Najmi;Jan;Philipp Scholz*;

10/09/2023 19h24Atualizada em 11/09/2023 16h53

Quase 48 horas após o Marrocos ser abalado pelo pior terremoto a atingir o país em mais de seis décadas, equipes de resgate ainda lutam para salvar pessoas soterradas na cidade de Amizmiz, aos pés da Cordilheira do Atlas.

Na sexta-feira passada (8), um terremoto de magnitude 6,8 na Escala Richter, com epicentro próximo à cidade de Oukaimeden, a 90 quilômetros dali, atingiu a nação africana.

As autoridades marroquinas contabilizam mais de 2,1 mil mortos e mais de 2,4 mil pessoas feridas - boa parte em estado grave. Mas o saldo de vítimas pode ser muito maior, já que os abalos causaram danos em regiões no país de difícil acesso. A OMS (Organização Mundial da Saúde) estima em mais de 300 mil o número de afetados pelo desastre.

Organizações especializadas em resgates consideram as primeiras 72 horas após um sismo críticas para salvar vidas. Passado esse período - ou seja, a partir das 23 horas de segunda-feira -, a chance de sobrevivência terá caído para entre 5% e 10%.

"É indescritível", desabafa Naima Oufkir, moradora da cidade de aproximadamente 14 mil habitantes. "Minha vizinha estava grávida. Agora ela está debaixo dos escombros em algum lugar. Estamos rezando para que ainda esteja viva."

Para além do Marrocos, os tremores foram sentidos na Argélia, Espanha e até em Portugal. Em 1960, um terremoto destruiu Agadir e provocou mais de 12 mil mortes - este, contudo, não superou em intensidade o evento de sexta-feira, segundo o órgão americano de monitoramento de atividade sísmica USGS.

Sem acesso às regiões mais afetadas

Equipes de resgate tentam chegar a áreas mais próximas do epicentro do terremoto, no distrito de Al Haouz, a cerca de 70 km de Marrakech. Muitas cidades e vilarejos nas montanhas ali são de difícil acesso e dispõem de poucos recursos. Algumas montanhas ultrapassam os 3.000 metros de altitude.

"São lugares muito remotos e é muito difícil acessá-los", afirma Anja Hoffmann, que comanda o escritório da Fundação Heinrich Böll em Rabat, capital do Marrocos, e conhece a região.

"As estradas já são bem estreitas. Mesmo em condições normais, levaria de três a quatro horas para chegar a um hospital relativamente bem equipado. Então dá para imaginar a situação quando essas estradas estão bloqueadas."

Morador de Azgour, um vilarejo de 200 pessoas também afetado pelo terremoto, relata à DW que houve preparações para alargar algumas estradas principais na região.

"O terremoto acabou com tudo", lamenta. Ele afirma que ainda há pessoas presas sob os escombros ali, e até a noite de sábado nenhuma ajuda havia chegado.

Algumas estradas só poderiam ser percorridas a pé ou com a ajuda de mulas, segundo Adel Boria, outro morador da região.

"Mesmo pousar um helicóptero de resgate seria difícil em alguns desses vilarejos."

'Corrida contra o tempo'

A cidade histórica de Marrakech sofreu danos decorrentes do forte terremoto que atingiu o Marrocos na sexta-feira Imagem: ABDELHAK BALHAKI/REUTERS

Diretora da Cruz Vermelha International, Caroline Holt afirma que será necessário maquinário pesado para abrir as estradas e chegar até esses lugares.

"É uma corrida contra o tempo", diz. Ela chama atenção também para os tremores subsequentes - foram ao menos 20 desde então, incluindo um de 4,5 pontos no domingo na região de Ighil, ao sul de Marrakech -, que podem derrubar de vez edificações que ainda não ruíram.

A organização prometeu US 1,1 milhão (cerca de R$ 5,4 milhões na conversão direta) em apoio ao escritório marroquino da Cruz Vermelha.

"É importante cuidar dos sobreviventes também. Há muitos vivendo ao relento agora, expostos às intempéries, muitos feridos gravemente", ressalta Holt. "Essas pessoas precisarão de abrigo, água, comida e apoio psicológico."

De fato, sobreviventes estão enfrentando dificuldades para se manter alimentados e abrigados. Comércios estão danificados ou fechados. Vários devem passar a terceira noite sob céu aberto, nas ruas - muitas casas no país são feitas de barro e madeira ou cimento e blocos de concreto, daí as estruturas terem desmoronado facilmente.

O governo, que decretou luto oficial de três dias, afirmou no sábado estar tomando medidas urgentes, incluindo o reforço de equipes de busca e resgate, fornecimento de água e distribuição de comida, abrigos e cobertores.

Ajuda do exterior

A Espanha anunciou o envio de 56 agentes e quatro cães farejadores, já em território marroquino; uma segunda equipe com mais 30 pessoas e outros quatro cães estava a caminho no domingo. Do Reino Unido, outros 60 especialistas em resgate, quatro cães e quatro profissionais de saúde foram despachados. O Catar também anunciou o envio de uma equipe para apoiar o país. Também no domingo, uma equipe de americanos chegou ao local para avaliar a situação.

Diversos países, entre eles Israel e Argélia - que rompeu relações diplomáticas com o Marrocos dois anos atrás -, Tunísia, Taiwan, Alemanha, França e Turquia também ofereceram ajuda.

A Turquia passou recentemente por uma tragédia semelhante, que deixou mais de 50 mil vítimas.

Retorno à normalidade em Marrakech

Quando Mourad começou a sentir os tremores na noite de sexta, ele achou que estava vivendo um ataque terrorista. Junto com outros funcionários do Café Zeitoun, em Jemaa el-Fna, icônica praça central da turística Marrakech, ele começou a retirar os clientes do estabelecimento um por um, para evitar pânico.

"Achamos que fosse uma bomba", comenta.

Na noite do dia seguinte, porém, o estabelecimento voltou a ficar cheio - assim como a praça Jemaa el-Fna, apinhada de locais curiosos e turistas. Restaurantes voltaram a armar suas mesas - apesar da ameaça de tremores subsequentes.

"Como você pode ver, a vida continua", afirma Mourad.

Ainda há, porém, pessoas dormindo nas ruas porque tiveram suas casas tão danificadas que já não a consideram mais seguras.

Socorro será necessário por várias semanas

Hoffmann, da Fundação Heinrich Böll, diz que há muita solidariedade no Marrocos agora. "Ontem [sábado] teve uma campanha enorme para que as pessoas doassem sangue. [A resposta] foi muito impressionante. Ontem e hoje os centros [de doação de sangue] disseram que não podiam mais receber doações e pediram para esperar até a semana que vem porque vão precisar de sangue no longo prazo."

Organizações humanitárias afirmam que levará meses, talvez anos, para ajudar os marroquinos na reconstrução e recuperação após o desastre.

"O terremoto estará no noticiário por algumas semanas, mas a ajuda será necessária por muito mais tempo - para reconstruir, reerguer a vida das pessoas. Essa vai ser a questão central no longo prazo", ressalta Hoffmann.

*Com informações das agências de notícias Reuters, AFP e AP

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