Topo

Chanceler egípcio diz a Kerry que não houve "golpe militar"

Shadia Nasralla

No Cairo

04/07/2013 18h45

O ministro das Relações Exteriores egípcio, Mohamed Kamel Amr, disse que ele garantiu ao secretário de Estado dos EUA, John Kerry, em um telefonema nesta quinta-feira (4), que a derrubada do presidente Mohamed Mursi não foi um golpe militar.

A definição do que aconteceu no Egito na quarta-feira é importante porque a derrubada militar de um líder eleito geralmente provoca sanções econômicas e poderia implicar um corte de ajuda vital dos Estados Unidos para o Egito.

"O lado americano é um parceiro estratégico para o Egito e o bem-estar do Egito é importante para eles", disse Amr, um diplomata de carreira que apresentou sua demissão a Mursi na terça-feira (2), mas que continua no comando do Ministério das Relações Exteriores do Egito - pelo menos até que um novo governo tecnocrata interino seja nomeado.

LEIA MAIS

Saiba mais sobre Adlir Mansour, presidente interino do Egito
Exército suspende Constituição, depõe Mursi e anuncia novas eleições
Face pública do golpe, general deve provar que se afastou de Mursi

"Espero que eles leiam a situação no caminho certo, que este não é um golpe de Estado militar de qualquer forma. Esta foi realmente a vontade esmagadora do povo."

Kerry lhe assegurou, segundo Amr, que o Egito é um aliado estratégico cuja estabilidade é importante. Kerry também questionou sobre os direitos humanos, e o ministro egípcio disse que não haveria atos de vingança contra Mursi e seu grupo, a Irmandade Muçulmana.

Amr, entrevistado em seu escritório no Ministério das Relações Exteriores no Cairo, disse que havia informado muitos embaixadores no Cairo e falado por telefone com mais de uma dúzia de ministros das Relações Exteriores e com o secretário-geral da Organização das Nações Unidas na quinta-feira.

Amr disse ter informado a eles: "definitivamente, o que aconteceu não foi um golpe militar, eu sei que ontem à noite e hoje algumas pessoas estão dizendo isso, é claro, eu posso entender, mas o que aconteceu, definitivamente, definitivamente, não foi um golpe militar".

Ele afirmou que o movimento foi impulsionado pelas maciças manifestações populares no domingo contra Mursi, que persuadiram as Forças Armadas a intervir e suspender a Constituição. O roteiro estabelecido assegura a realização de novas eleições.

ENTENDA A CRISE NO EGITO


O que aconteceu?
O comandante-geral do Exército, o general Abdul Fattah al-Sisi, declarou na TV que a Constituição foi suspensa e que o presidente da Suprema Corte assumiria poderes presidenciais, na prática derrubando o presidente Mohammed Mursi. Com isso, Adli Mansour comanda o governo interino formado por tecnocratas até que eleições presidenciais e parlamentares sejam convocadas. No Twitter, Mursi chamou o pronunciamento de "golpe completo categoricamente rejeitado por todos os homens livres de nossa nação". Soldados e carros blindados rondam locais importantes do Cairo enquanto centenas de milhares de manifestantes protestam nas ruas.

O que motivou a crise?
O descontentamento começou em 2012, quando Mursi, 1º presidente democraticamente eleito do Egito, deu a si mesmo amplos poderes numa tentativa de garantir que a Assembleia Constituinte concluísse a nova Constituição. Desde então, houve uma cisão política no país. De um lado, Mursi e a Irmandade Muçulmana; de outro, movimentos revolucionários e liberais. Quando a nova Constituição, polêmica e escrita por um painel dominado por islamitas, foi aprovada às pressas, as manifestações em massa tomaram as ruas, e Mursi acionou o Exército. Mas enfrentamentos continuaram, deixando mais de 50 pessoas mortas. Diante da pressão, os militares deram um ultimato ao presidente, que tinha 48 horas para atender às demandas populares. Mursi insistiu que ele era o líder legítimo do Egito, e houve intervenção.

Qual o caminho traçado pelos militares?
Após encontro de líderes políticos, religiosos e jovens, o general Sisi disse que o povo clamava por "ajuda" e que os militares "não podiam permanecer em silêncio". Ele disse que o Exército fez "grandes esforços" para conter a situação, mas o presidente não atendeu "às demandas das massas" e era hora de por "fim ao estado de tensão e divisão". Como a nova Constituição era alvo de fortes críticas, ele suspendeu-a temporariamente. O general não especificou quanto tempo duraria o período transitório e o papel que será exercido pelos militares. Ele conclamou a Suprema Corte Constitucional a rapidamente ratificar a lei permitindo eleições para a Câmara Baixa do Parlamento, que está dissolvida, e para a Assembleia Popular. E afirmou que um novo código de ética será expedido.
  • Fonte: BBC Brasil