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"Face pública" do golpe no Egito, general tem de provar que se distanciou de Mursi

Abdelfatah al-Sissi entrega declaração anunciando a destituição do presidente Mohamed Mursi -  AFP/TV Egípcia
Abdelfatah al-Sissi entrega declaração anunciando a destituição do presidente Mohamed Mursi Imagem: AFP/TV Egípcia

Fabrício Calado

Do UOL, em São Paulo

03/07/2013 19h34

Ainda é difícil de medir as consequências do golpe de Estado no Egito tanto no próprio país quanto na região, mas à primeira vista um nome se destaca: o do general Abdel Fatah al-Sissi. Foi ele quem apareceu no pronunciamento do Exército à nação na segunda-feira (1), dando ao governo 48h para resolver o impasse político no país.

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Também foi o general Sissi quem apareceu na TV estatal nesta quarta-feira (3), anunciando a suspensão da Constituição egípcia e prometendo novas eleições no país.

Ministro da Defesa e comandante das Forças Armadas, Sissi foi homem do presidente deposto Mohamed Mursi. Quando foi indicado para os dois cargos, em agosto de 2012, era tido como uma das caras da renovação do governo recém-eleito.

Sissi substituiu o general Mohamed Hussein Tantawi, 76, então chefe do Conselho Supremo das Forças Armadas. Hussein comandava o país desde a queda do ditador Hosni Mubarak, em decorrência dos protestos iniciados em 25 de janeiro de 2011. Até ser aposentado compulsoriamente por Mursi, foi ministro de Mubarak por 20 anos.

Na mesma época da troca de Hussein por Sissi, Mursi cancelou uma declaração constitucional do Exército que limitava os poderes do presidente; seria o embrião de algumas  dissonâncias entre o governo e os anseios da população que voltariam agora, em 2013, na forma de protestos.

Conexão com os Estados Unidos

Entra em cena Sissi, 59, natural do Cairo. Graduado na Academia Militar do Egito, o ministro estudou por um ano na Escola de Guerra do Exército dos Estados Unidos, na Pensilvânia. Em junho deste anos, foi Sissi quem recebeu Chuck Hagel, secretário de Defesa dos EUA, quando o americano visitou o Egito e a Tunísia. O militar é devoto do Islã, o que é natural num país com quase 95% de muçulmanos.

Até o golpe desta quarta-feira (3), um dos episódios que fizeram de Sissi conhecido no país é um que ele preferiria esquecer. Em abril de 2012, uma onda de indignação varreu o Egito quando o jornal estatal "Al-Ahram" publicou uma declaração de Sissi sobre um caso de testes de virgindade realizados em detentas do país.

"Os exames foram feitos para proteger as mulheres de estupros, e também proteger os soldados e oficiais de acusações de abusos", afirmou Sissi, segundo a publicação. A declaração de Sissi foi negada oficialmente pouco depois, e meses depois, o ministro da Defesa afirmou a suspensão dos testes.

Para onde vai Sissi?

Até este ponto dos acontecimentos, isso é o que se sabe sobre a face pública do golpe de Estado no Egito.

Não está claro ainda, e de agora em diante, qual será o caminho a ser tomado por Sissi. Indicado por Mursi, sua ligação com a Irmandade Muçulmana nunca ficou clara. Segundo o site americano de política "The Daily Beast", o grupo político do presidente confiava no general Sissi a ponto de indicá-lo para o comando das Forças Armadas, mas ele não era parte da Irmandade Muçulmana.

Agora que se distanciou do governo que sai, terá de provar que não era assim tão próximo ao altamente impopular Mursi.

Entenda a crise no Egito

A QUE SE DEVE A NOVA CRISE?O descontentamento começou em novembro de 2012, quando o presidente do Egito, Mohammed Mursi, promulgou um decreto pelo qual estendia mais poderes para si mesmo. Desde então, houve uma cisão política no país. De um lado, Mursi e a Irmandade Muçulmana; de outro, movimentos revolucionários e liberais.

Essa divisão política foi propiciada por uma constituição polêmica, escrita por um painel dominado por islamitas.

O fato foi agravado pelo que a oposição chamou de decisão unilateral adotada pelo governo. Alguns alegaram que muitos dos membros da Constituinte egípcia foram indicados pela Irmandade Muçulmana com base em critérios que privilegiaram a lealdade à competência.
O QUE MURSI DIZIA?Apesar de admitir que cometeu alguns erros, Mursi insinuou que os protestos foram motivados por ex-membros do antigo regime e seus associados. Ele também culpa a oposição por não responder a seus pedidos para a construção de um diálogo nacional. Tais indicações ficaram claras em um pronunciamento à nação em 26 de junho deste ano.