Retração nas vendas de soja e milho no Brasil ameaça exportação, pressiona tradings
Por Gustavo Bonato
SÃO PAULO (Reuters) - A relutância de agricultores em vender soja e milho no Brasil na atual safra coloca em risco as previsões mais otimistas de exportação do país e tem feito tradings multinacionais pagarem caro para completar navios neste início da temporada de embarques.
O que poderia ser tarefa fácil do ponto de vista da oferta --com uma safra recorde de mais de 100 milhões de toneladas de soja no maior exportador global-- tem se mostrado por ora complicado, com os preços internacionais em Chicago (CBOT) e a valorização do real frente ao dólar desestimulando vendas de produtores no Brasil.
Assim, grandes tradings exportadoras têm enfrentado dificuldade para cumprir os contratos de exportação de soja já firmados, pagando valores elevados pelo produto para pronta entrega para completar as cargas de navios que estão chegando aos portos brasileiros, disseram operadores.
"O mercado está nervoso. O line up (de navios) está lotado e está faltando carga nos portos. Os produtores não estão fixando (contratos) e o câmbio e a CBOT só pioram a situação. As tradings estão pagando caro pela soja no mercado à vista", disse o consultor de agronegócio e logística Luiz Claudio Santos, com larga experiência na área comercial em diversas tradings.
A situação fica ainda mais delicada em um momento em que chuvas fortes provocaram atoleiros no trecho não asfaltado da BR-163, estão impedindo que a soja chegue aos portos do Norte do país, o que resulta em prejuízos de 400 mil dólares ao dia, com a impossibilidade de embarcar o produto, informou nesta sexta-feira a associação que representa as indústrias da oleaginosa no Brasil (Abiove).
Entre as principais tradings que atuam no país estão companhias como as norte-americanas Bunge, ADM, Cargill, além da francesa Louis Dreyfus e a chinesa Cofco.
"Você não tem margem nenhuma (de preço) para levar para exportação", afirmou um analista de inteligência de mercado de uma trading, explicando que as multinacionais do agronegócio não estão conseguindo lucrar, pelo menos neste primeiro momento da exportação brasileira.
"As tradings normalmente resolvem essas coisas. Vendem com margem negativa", completou um operador sênior de grãos de outra grande empresa exportadora.
Diante da dificuldade de originar grãos, com a colheita brasileira ainda em fase inicial, em cerca de 20 por cento da área até meados do mês, as empresas exportadoras estão evitando fechar novos negócios para mais tarde em 2017, acreditando que o mercado pode lhes favorecer posteriormente, com a entrada da safra da Argentina ou um aumento do plantio nos EUA.
"Outros pedidos adicionais você acaba não atendendo ou deslocando para outras origens (outros países)", disse a primeira fonte.
VENDAS ATRASADAS
Produtores rurais têm evitado vender soja e milho da safra de verão --que estão em fase de colheita-- e fechar negócios com o milho da safra de inverno, que está sendo semeada, devido à queda nas cotações.
O indicador Esalq/BM&FBovespa, que monitora os preços da soja praticados no porto de Paranaguá, está cotado em cerca de 72 reais/saca, com recuo de mais de 25 por cento ante um pico registrado em junho do ano passado.
Neste cenário, as vendas dos produtores atingiram 37 por cento do total da safra de soja até o início de fevereiro, atrás dos 49 por cento de um ano atrás e dos 44 por cento da média de cinco anos, segundo dados da França Junior Consultoria.
Para o chamado "milho safrinha", que constitui cerca de dois terços da safra nacional, o comprometimento atinge 17 por cento da safra esperada, ante 41 por cento um ano atrás e 26 por cento da média histórica.
LOGÍSTICA COMPLICADA
Atrasos nos negócios e nas exportações também podem causar turbulências na cadeia logística nos próximos meses.
O Brasil tem elevado gradualmente sua capacidade de exportação, com abertura de novos terminais portuários, principalmente no Norte do país.
Contudo, a capacidade não tem folgas para comportar um atraso das exportações de soja, que geralmente ocorrem com força no primeiro semestre e dão espaço aos embarques de milho.
"Eu estou preocupado, devido a nossas limitações em termos de logística", disse o diretor-geral da Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec), Sérgio Mendes.
"Se você atrasa a comercialização, você tem que fazer esse volume sair durante o ano... Se a comercialização começar a atrapalhar, a soja acaba prevalecendo sobre o milho", disse o executivo, ressaltando que o cereal é o mais ameaçado se houver gargalo portuário.
Os especialistas disseram também que à medida que o segundo semestre avança, os embarques brasileiros correm o risco de sofrer concorrência com a safra dos Estados Unidos, que é colhida mais perto do fim do ano.
(Edição de Roberto Samora)
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