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Viagem de Bolsonaro deve trazer investimentos, mas acordo amplo com EUA segue distante

Fábio Motta/Estadão Conteúdo
Imagem: Fábio Motta/Estadão Conteúdo

Lisandra Paraguassu

De Washington

16/03/2019 11h55

Em sua primeira viagem oficial aos Estados Unidos, o presidente Jair Bolsonaro não trará na mala a promessa de um acordo de livre comércio amplo, mas a visita deve abrir espaço para que, nos próximos meses, os dois países avancem em acordos setoriais e, principalmente, em um acordo de investimentos, disse à Reuters uma fonte que acompanha de perto as negociações.

"Nos próximos meses o que devemos trabalhar é quais acordos comerciais gostaríamos de fazer. Existem hoje questões que precisam ser resolvidas, mas não podemos ficar no varejo. Vamos começar a trabalhar as questões maiores", disse a fonte.

Se a questão de liberação de tarifas pode ainda demorar, a dinâmica da relação dos presidentes Bolsonaro e Donald Trump pode tirar do papel o acordo de investimentos, empacado há anos.

Até o governo de Barack Obama, os EUA insistiam na inclusão de uma cláusula que permitia a empresas que se sentissem prejudicadas acionar seu governo para agir, mas o Brasil não aceitava. Agora, na renegociação dos termos do Nafta, Trump pediu a retirada de uma cláusula idêntica.

"O acordo de investimentos está maduro para ser implementado. Nós não aceitamos, mas Trump não quis no Nafta. É um bom sinal", defendeu a fonte.

Ao finalizar a visita com uma declaração, os dois países devem optar pelo anúncio de boas intenções para começar uma negociação, mesmo que os EUA tenham outras prioridades antes do Brasil. A primeira delas, a de finalizar o novo Nafta, com Canadá e México. Depois, as negociações com a China, com quem Trump entrou em uma guerra comercial aberta.

Mas, se na área comercial a visita pode levar apenas a promessa do início de uma negociação que, até hoje, nunca foi adiante, em outros temas o Brasil deve levar para casa acordos que podem trazer ganhos significativos para o país.

O primeiro deles é o status de aliado preferencial extra-Otan, que dará ao país acesso a tecnologias, preferência para aquisição de material de defesa e outros benefícios.

Também já estão acertados acordos na área de Segurança Pública. Em um deles, a Polícia Federal irá assinar com o FBI um acordo de cooperação interinstitucional para a troca de informações biométricas que permitirá melhorar investigações criminais.

Os dois países também irão retomar o Fórum de CEOs, parado há dois anos, e anunciar a criação de um novo, na área de energia, para discutir oportunidades de defesa.

OUTROS PONTOS

Em algumas questões, no entanto, o Brasil não obteve o que veio buscar.

Apesar da decisão de Bolsonaro de anunciar em Washington unilateralmente o fim dos vistos para norte-americanos, o Brasil está longe de receber a mesma cortesia do governo dos EUA. Nesta visita, nem mesmo o Global Entry --sistema de facilitação de entrada com o visto-- deve avançar.

De acordo com outra fonte que acompanha as conversas, o Brasil ainda não cumpre questões técnicas que os Estados Unidos exigem para retirada geral dos vistos. Já o Global Entry estaria encaminhado, mas existem questões tecnológicas e de troca de informações que o país não conseguiu resolver.

Da mesma forma, o governo brasileiro almejava uma declaração formal em relação a sua intenção de entrar na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mas fontes do governo norte-americano já avisaram que isso não vai ocorrer agora.

O Brasil apresentou sua candidatura em maio de 2017 e o governo de Michel Temer chegou a nomear um embaixador para a organização em Paris, mas não houve avanços. Uma das razões é a própria resistência norte-americana, que não apoia o crescimento do grupo agora.

Já na agricultura, uma das questões centrais que a ministra Tereza Cristina pensava adiantar, o fim da suspensão de compra de carne in natura, em vigor desde julho de 2017, não vai acontecer.

"Está caminhando, mas não vai se resolver agora", disse uma terceira fonte que acompanha o tema. "O que devemos ter nessa viagem são acordos de cooperação para abertura de terceiros mercados."

Os dois governos, que são hoje os maiores produtores e exportadores de commodities agrícolas do mundo, querem cooperar para derrubar barreiras, especialmente fitossanitárias, em outros países.

"Brasil e EUA são competidores no mercado internacional, não há dúvidas. Mas em muitos fóruns internacionais estão do mesmo lado, dos grandes produtores, com alta tecnologia de produção. Tem que atuar junto onde é possível", disse a fonte.

Bolsonaro chega a Washington no domingo, onde fica até terça. Seu primeiro compromisso é um jantar na embaixada brasileira com formadores de opinião ligados à direita conservadora. Para o jantar foram convidados Olavo de Carvalho, o guru de parte significativa do governo brasileiro, inclusive do próprio presidente e seus filhos, e Steve Bannon, ex-assessor da Casa Branca e um dos expoentes do conservadorismo norte-americano.

Na segunda-feira, Bolsonaro participará de painéis na Câmara de Comércio dos Estados Unidos e, na terça, será recebido na Casa Branca.