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Urso solto na multidão: fotógrafos contam os bastidores das imagens de 2021

Pessoas correm em busca de um lugar seguro enquanto ativistas curdos de direitos dos animais soltam um urso na natureza em Dohuk, Iraque - Ari Jalal/Reuters
Pessoas correm em busca de um lugar seguro enquanto ativistas curdos de direitos dos animais soltam um urso na natureza em Dohuk, Iraque Imagem: Ari Jalal/Reuters

27/12/2021 04h00

De imigrantes tentando chegar à Europa e aos Estados Unidos até conflitos armados e protestos ao redor do mundo, os fotógrafos da agência Reuters testemunharam alguns dos eventos mais importantes do ano.

Abaixo se encontra uma seleção de algumas fotos excepcionais registradas pela Reuters em 2021, juntamente com as histórias por trás delas, contadas diretamente pelos fotógrafos que as tiraram.

O UOL separou essas imagens em cinco textos que serão publicados ao longo da semana. Este é o primeiro:

Ari Jalal: "No Curdistão, ativistas de direitos dos animais resgatavam ursos em cativeiro em lares de pessoas e os soltavam na natureza. Esse urso foi mantido como animal de estimação em um jardim no Curdistão, e esse foi o momento em que foi solto. Quando permitiram a saída do urso de sua jaula, os jornalistas e espectadores saíram correndo. As pessoas estavam com tanto medo do urso quanto este estava delas.

Tirar fotos de animais selvagens era algo novo para mim, mas felizmente passei quatro horas com o urso no dia anterior. Sabia que o urso tinha sido criado como animal de estimação, de modo que não era tão agressivo. Assim, quando foi solto, entendi seu comportamento e não me assustei com ele, diferente de outros jornalistas que correram e gritavam. A melhor coisa a fazer era permanecer parado e calmo."

Homem engolfado por uma nuvem de gafanhotos-do-deserto, no alto de uma colina próxima de Nanyuki, Quênia - Baz Ratner/Reuters - Baz Ratner/Reuters
Homem em meio à nuvem de gafanhotos-do-deserto, no alto de uma colina próxima de Nanyuki, Quênia
Imagem: Baz Ratner/Reuters

Baz Ratner: "Gafanhotos invadiram o leste da África após padrões climáticos incomuns, exacerbados pela mudança climática, terem criado as condições ideais para despertar os ovos dormentes. No Quênia, fazia décadas que não se via gafanhotos e agora eles estão devastando as plantações e a vegetação em uma região que já sofre de insegurança alimentar.

Foi muito difícil encontrar as nuvens, já que viajam até 150 km por dia, por áreas que carecem de estradas. Em alguns casos, quando chegávamos, os gafanhotos já tinham partido. Mas tive sorte de encontrar um batedor que conhecia o terreno.

Trabalhar dentro de uma nuvem de gafanhotos parece como estar em meio a uma nevasca ou tempestade de granizo, a única diferença sendo que o som dos gafanhotos voando e batendo no carro é muito maior. Eles tendem a grudar nas roupas.

Naquele dia, viajávamos por uma estrada de terra quando encontramos a nuvem de gafanhotos. Notei um guarda ambiental armado no alto de uma colina, com os gafanhotos voando em círculos ao redor dele.

Tirei essa foto usando lentes teleobjetivas da base da colina. Acho que devido à escala de uma única pessoa, a foto ilustra o tamanho inacreditável da nuvem de gafanhotos e como essa antiga praga ainda afeta a região."

Uma explosão causada por munição da polícia é vista enquanto apoiadores do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, se reúnem em frente ao prédio do Capitólio federal em Washington - Leah Millis/Reuters - Leah Millis/Reuters
Uma explosão causada por munição da polícia é vista enquanto apoiadores do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, se reúnem em frente ao prédio do Capitólio federal, em Washington
Imagem: Leah Millis/Reuters

Leah Millis: "Milhares de apoiadores do então presidente Donald Trump, um republicano, invadem o Capitólio federal em 6 de janeiro, em uma tentativa fracassada de reverter a recente eleição e impedir Joe Biden, um democrata, de se tornar o próximo presidente. Foi o pior ataque à sede do governo americano desde a guerra de 1812.

Cheguei ao lado oeste do Capitólio federal antes dos apoiadores de Trump romperem as barreiras policiais e documentei o caos que se seguiu pelas sete horas seguintes. A certa altura ouvi a multidão cantando 'empurra' e achei que deviam ter arrombado as portas. Não quis correr o risco de ser esmagada ou ferida pela imensa multidão, que era hostil para com membros da mídia e já tinha atacado vários de meus colegas naquele dia. Optei pelo risco de escalar uma estrutura de andaime erguida para uma futura inauguração para ter uma visão melhor.

O Capitólio já tinha sido invadido por diferentes entradas, mas a luta por aquela entrada durou horas. A polícia do Capitólio e a polícia metropolitana do Distrito de Colúmbia combatiam corpo a corpo a multidão de apoiadores de Trump e, no processo, vários policiais foram seriamente feridos. Quatro pessoas morreram naquele dia e um policial atacado pelos manifestantes morreu no dia seguinte. Quatro policiais posteriormente se suicidaram.

Posteriormente, os agentes da lei conseguiram fazer com que a multidão recuasse. Às 17h04, para dispersar os manifestantes restantes, eles usaram uma granada de atordoamento, que libera uma luz ofuscante que iluminou o prédio do Capitólio. Para mim, a explosão da granada capturou a violência e o choque daquele dia: cidadãos americanos atacando e invadindo o prédio do Capitólio de seu próprio país. Nunca mais esquecerei a visão assustadora da bandeira americana tremulando acima de toda a cena, lançando uma sombra sobre o icônico domo por trás dela.

Havia muitos fotógrafos no Capitólio naquele dia e há muitas imagens significativas de dentro e de fora do prédio. Veículos de mídia de todo o mundo usaram esta foto e ela foi exibida no segundo processo de impeachment de Trump. O ataque ao Capitólio foi um momento crucial na história americana e acho que olharemos para esse dia como um momento decisivo em nosso país."

O presidente dos EUA, Donald Trump, joga golfe no Trump International Golf Club, em West Palm Beach, Flórida - Marco Bello/Reuters - Marco Bello/Reuters
O presidente dos EUA, Donald Trump, joga golfe no Trump International Golf Club, em West Palm Beach, Flórida
Imagem: Marco Bello/Reuters

Marco Bello: "Quando o então presidente Donald Trump viajou para Mar-a-Lago para o Natal, o presidente eleito Joe Biden já contava com votos eleitorais suficientes para conquistar a presidência dos Estados Unidos, mas Trump não reconhecia a derrota. Ninguém tinha acesso a ele, nem mesmo o grupo de jornalistas que viajava com ele. O noticiário era dominado pela eleição, mas não havia nenhuma foto recente de Trump.

O fotógrafo Tom Brenner, que fazia parte do grupo, soube por meio de um colega de um ponto na cerca do Trump International Golf Club, de onde era possível ver Trump jogando golfe. Cheguei ao local bem cedo na manhã de 26 de dezembro e pensei: 'Esta é uma foto impossível!' Havia algumas poucas aberturas na densa parede de folhagem que davam visão ao campo de golfe, mas era difícil conseguir focar a câmera, já que a menor brisa movia as folhas, interferindo no foco. A foto dependeria de onde a bola caísse no 'green' e de onde estivessem posicionados os agentes do Serviço Secreto e os demais jogadores.

Esta foto foi obtida no meu terceiro dia de tentativas. Àquela altura, duas equipes de televisão e fotógrafos tinham se juntado a mim. Aprendi um pouco sobre golfe graças a eles, enquanto passávamos longas horas esperando.

O que adoro nesta foto é a aparência despenteada de Trump, que parece uma pessoa normal, sem a bagagem da instituição que ele representava.

Após Trump deixar a Casa Branca e se mudar para a Flórida, novas palmeiras foram plantadas para bloquear plenamente a vista do clube."

Camelos atrás de um varal de roupa enquanto os circos permanecem fechados como parte das restrições impostas devido à covid-19, na base do Royal Circus, em Senas, França - Eric Gaillard/Reuters - Eric Gaillard/Reuters
Camelos atrás de um varal de roupa enquanto os circos permanecem fechados como parte das restrições impostas devido à covid-19, na base do Royal Circus, em Senas, França
Imagem: Eric Gaillard/Reuters

Eric Gaillard: "Quando me encontrei com William Kerwich, em fevereiro de 2021, o circo itinerante de sua família não se apresentava havia quase um ano, devido às restrições por causa da covid-19 na França. Seu moral estava baixo, com sua família estacionada em um terreno no sul da França e seus leões e tigres confinados em suas jaulas. Mesmo que a pandemia chegue ao fim, ele enfrenta outra ameaça ao seu ganha-pão: a França está eliminando gradativamente o uso de animais selvagens em circos.

Sua filha mais nova, Cassandra, treina os animais e a segui enquanto ela alimentava os tigres, o hipopótamo, os cavalos e camelos. Durante a entrevista, notei que entre as roupas no varal estavam roupas pertencentes a um bebê recém-nascido, mas a foto resultante não ficou boa.

Então tive sorte e um grupo de camelos seguiu lentamente na direção do varal. Aguardei pelo momento certo, na esperança de que os camelos não seguissem de repente em outra direção. Tudo correu bem e agora sempre tento incluir animais nas minhas fotos."