Comitê da ONU diz que Lula teve direitos violados e advogado espera reparação do governo
Por Emma Farge e Lisandra Paraguassu
GENEBRA/BRASÍLIA (Reuters) - O Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) afirmou nesta quinta-feira que o processo por corrupção contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que levou à sua prisão e o impediu de concorrer à Presidência em 2018, violou o devido processo legal e o advogado de Lula afirmou que espera agora uma reparação por parte do governo brasileiro.
"Tais violações processuais tornaram arbitrária a proibição a Lula de concorrer à Presidência e, portanto, em violação de seus direitos políticos, incluindo seu direito de apresentar candidatura a eleições para cargos públicos", afirmou um comunicado em nome do comitê de especialistas independentes.
O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou no ano passado uma decisão que anulou as condenações impostas a Lula e, com isso, ele está apto a concorrer nas eleições de outubro. O ex-presidente lidera todas as pesquisas de intenção de voto para a Presidência.
Lula entrou com uma queixa no comitê da ONU, que supervisiona o cumprimento por parte dos países do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, contestando a maneira que foi levado a julgamento no âmbito da operação Lava Jato.
Em sua primeira fala pública depois da decisão, nesta quinta, Lula disse que teve duas grandes notícias no mesmo dia, o apoio da Rede Sustentabilidade e a decisão do Comitê, e brincou que a reparação a ser dada pelo governo brasileiro podia ser entregar a ele a Presidência.
"Essa decisão da ONU para mim foi uma lavagem de alma extraordinária", disse.
O comitê afirmou que as escutas telefônicas de que Lula foi alvo e a divulgação delas à imprensa violaram o direito do ex-presidente à privacidade, ao mesmo tempo que as ações do então juiz Sergio Moro e dos procuradores da Lava Jato violaram seu direito à presunção de inocência, afirmou o comunicado.
A nota também afirma que o comitê "instou o Brasil a assegurar que quaisquer outros procedimentos criminais contra Lula cumpram com as garantias do devido processo legal, e a prevenir violações semelhantes no futuro".
Em entrevista coletiva em São Paulo, o advogado Cristiano Zanin Martins, que representa Lula, disse que a decisão do comitê da ONU é "pedagógica" e "vinculante", ou seja, de cumprimento obrigatório por parte do governo brasileiro. Ele afirmou ainda que espera uma reparação por parte do Estado brasileiro a Lula.
"A bola agora está com o governo brasileiro, que precisa em 180 dias dizer como vai reparar os danos cometidos ao presidente Lula", disse Zanin a jornalistas.
"A forma como será cumprida é o governo que tem de dizer, e a ONU vai dizer se aprova, se é suficiente", acrescentou.
O advogado de Lula lembrou que o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos tornou-se lei interna no Brasil em 1992 e que o Estado brasileiro aceitou a jurisdição do comitê da ONU para analisar casos como o de Lula.
"O governo brasileiro assumiu que as violações poderiam ser julgadas pelo comitê de Direitos Humanos da ONU. A partir dessa posição, assumimos que há obrigação do governo brasileiro cumprir essa decisão, porque há uma vinculação internacional", afirmou.
Para Zanin, a decisão da ONU é "uma vitória para democracia e para todos que acreditam no estado de direito".
Em nota, Moro disse que a decisão do comitê da ONU se baseou na decisão do STF que anulou as condenações a Lula, posição essa que ele disse considerar "um grande erro judiciário". Também afirmou que o comitê não atestou a inocência de Lula.
"De todo modo, nem mesmo o Comitê nega a corrupção na Petrobras ou afirma a inocência de Lula. Vale destacar que a condenação do ex-presidente Lula foi referendada por três instâncias do Judiciário e passou pelo crivo de nove magistrados", disse Moro.
"Também é possível constatar, no relatório do Comitê da ONU, robustos votos vencidos que não deixam dúvidas de que a minha atuação foi legítima na aplicação da lei, no combate à corrupção e que não houve qualquer tipo de perseguição política", acrescentou.
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