Topo

Tradicional restaurante Bocuse perde 3ª estrela do Michelin que tinha desde 1965

17/01/2020 13h58

Menos de dois anos após a morte do famoso chef francês Paul Bocuse, seu restaurante perdeu uma de suas cobiçadas três estrelas na edição de 2020 do famoso Michelin confirmou o guia nesta sexta-feira (17). O L'Auberge de Collonges-au-Mont-d'Or, perto de Lyon, é uma referência da tradicional culinária francesa e terá apenas duas estrelas na edição 2020. Muitos especialistas denunciam um "golpe de marketing".

A nova edição do Michelin, considerado a bíblia da gastronomia, será lançada em 27 de janeiro. O icônico restaurante de Paul Bocuse, às margens do rio Saône (no sudeste da França), detinha as três estrelas do guia desde 1965. A publicação justificou a decisão afirmando que "a qualidade do estabelecimento ainda é excelente, mas não tem mais o nível de três estrelas". Gwendal Poullennec, responsável pelo guia, foi ao restaurante na quinta-feira, na cidade de Collonges-au-Mont-d'Or, para comunicar a decisão à equipe que recebeu a notícia com tristeza.

"Embora abalado pela decisão dos inspetores, há uma coisa que nunca queremos perder é a alma do Monsieur Paul", disseram a família e a direção do restaurante em comunicado.

Esforços de modernização não foram suficientes

Muito antes da morte do chef Paul Bocuse, em janeiro de 2018, alguns críticos já previam que seu restaurante havia deixado de cumprir os rígidos critérios para a obtenção da nota máxima do Michelin. Alguns guias passaram a classificar o "L'Auberge" como uma "instituição", sem dar uma nota.

Os esforços de modernização do restaurante, definidos pela equipe como a "tradição em movimento", não foram suficientes para convencer os inspetores do guia. "Os chefs trabalharam, reformularam e refinaram os pratos, por mais de um ano. Eles evoluíram, sem perder o DNA e o sabor original", disse Vincent Le Roux, gerente-geral do restaurante à imprensa.

Após importantes reformas que o mantiveram fechado por três semanas, o "L'Auberge" volta a abrir em 24 de janeiro, três dias antes da publicação oficial do novo Guia Michelin.

Papa da culinária francesa

Paul Bocuse, um dos chefs franceses mais famosos de todos os tempos, morreu aos 91 anos em 20 de janeiro de 2018, depois de sofrer da doença de Parkinson. Apelidado de "papa" da culinária francesa, ele agitou o mundo gastronômico na década de 1970, ao cobrar os preços mais acessíveis da chamada revolução da Nouvelle Cuisine e criou a idéia do chef celebridade.

Ele obteve sua primeira estrela no Michelin em 1958 e em 1961 foi escolhido o "Melhor artesão" da França. Seu restaurante foi o único do país a manter a classificação de três estrelas por mais de quatro décadas. A fama do chef atravessou as fronteiras francesas, principalmente após à criação do Bocuse d'Or, o maior concurso de gastronomia do mundo, lançado por ele em 1987.

Tristeza e controvérsia

Olivier Ginon, presidente do Bocuse d'Or, expressou "sua tristeza e respeito pelo trabalho do chef francês " e lembrou sua "contribuição para a culinária mundial".

A notícia gerou polêmica. O controverso chef Marc Veyrat acusou os inspetores do Guia Michelin de ignorar os produtos regionais e disse que essa decisão era equivalente a "destronar o papa". No ano passado, Veyrat que também perdeu uma estrela, havia entrado na justiça contra o Michelin e perdeu.

O crítico gastronômico Périco Legasse, por outro lado, considerou que o guia cometeu um erro "irreparável" e que a publicação, que perde espaço para a concorrência na internet, visa um "golpe de marketing".

Qual o impacto nos restaurantes?

Os benefícios dessa distinção são tanto midiáticos quanto financeiros. Não há dados oficiais para medir o fenômeno. No entanto, Francis Attrazic, presidente da Associação Francesa de Restaurantes, explicou ao jornal Le Figaro que a rotatividade de um estabelecimento premiado pela primeira vez com uma estrela aumenta em média 30%.

"Para restaurantes que não tinham grande notoriedade, o impacto é indiscutível e garante um ano glorioso, além de grandes oportunidades de desenvolvimento", aponta Attrazic. Além disso, quando um restaurante recebe três estrelas, ganha muita cobertura na mídia, o que aumenta as reservas.

No entanto, as famosas estrelas também impõem muitos padrões de qualidade que, às vezes, dificultam a lucratividade. É necessário muito investimento, de tempo e dinheiro, o aumento do número de funcionários e a contratação de trabalhadores mais qualificados, por exemplo. Por causa disso, poucos chefs afirmam ter ficado ricos graças à nota do Michelin. E alguns, como Sébastien Bras e Jérome Brochot, em 2018, resolveram "devolver suas estrelas", cansados ??de sacrificar sua vida familiar, economias e tempo livre.