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Violência contra políticos franceses é alimentada por retórica cada vez mais radical no debate público

11/06/2021 16h14

O clima político esquentou esta semana na França com o presidente Emmanuel Macron levando um tapa na cara de um cidadão descontente com o governo. A violência contra políticos franceses não é uma novidade, mas a retórica cada vez mais radical no discurso político tem gerado um aumento das agressões físicas, não apenas contra membros do governo, mas contra policiais, bombeiros, professores, funcionários públicos, prefeitos, em resumo, pessoas que representam os serviços do Estado.

Outros presidentes franceses foram agredidos verbalmente ou fisicamente nos últimos anos. Jacques Chirac escapou ileso de um tiro disparado por um militante de extrema direita durante um desfile militar na avenida Champs Elysées, em 2002. Nicolas Sarkozy enfrentou várias tentativas de agressão durante seu mandato; um funcionário público municipal de uma cidade do interior chegou a ser condenado à prisão por agarrar o ex-presidente de direita. Uma mulher jogou farinha no socialista François Hollande quando ele ainda era candidato, e o próprio Macron teve de ser evacuado de vários locais por seus seguranças durante o movimento dos coletes amarelos. 

O tapa em Macron é, no entanto, representativo de uma insatisfação instalada há um bom tempo entre franceses que passaram a duvidar da eficácia das instituições e que questionam qual seria o interesse em participar do processo democrático, de votar nas eleições, se os resultados são cada vez mais decepcionantes.

A particularidade da violência contra o atual chefe de Estado é que ele passou a cristalizar um descontentamento mais amplo. Macron é visto como um político que ajudou a enfraquecer os partidos tradicionais, criando uma polarização com a extrema direita, embora o que ele tenha feito foi ocupar um espaço deixado vazio pela falta de propostas convincentes dos adversários. 

A forma como ele governa, sem diálogo efetivo com sindicatos e representantes intermediários da sociedade civil, muito focalizado em temas urbanos e desconectado das classes populares, da "França profunda", contribuiu para a criação da imagem de um dirigente distante do povo, o que foi evidenciado pelo movimento dos coletes amarelos.

Elétron livre

No tribunal, onde foi condenado nesta quinta-feira (10) a 18 meses de prisão, quatro deles em regime fechado, o agressor, que se chama Damien Tarel, 28 anos, admitiu que sua reação "foi um pouco impulsiva". Ele disse ao juiz que seu gesto deve ter agradado aos coletes amarelos e patriotas. Mas ele é um típico simpatizante da ideologia de extrema direita, sem atividade militante anterior conhecida. Um elétron livre.

A maior parte dos contatos que Tarel tinha nas redes sociais era de grupos ultraconservadores, de influenciadores adeptos do masculinismo, sexistas e homofóbicos. Além disso, Tarel é descrito como um indivíduo de gosto barroco, praticante do Kendo, arte marcial japonesa de combate com a espada, e admirador de ritos da Idade Média. Ele declarou ao juiz que considera o presidente Macron a encarnação do "declínio da França", uma imagem propagada pelos nacionalistas franceses. 

Especialistas notam que esse tipo de ato isolado é o resultado de uma desinstitucionalização da política. As pessoas discutem política nas redes sociais com grupos que fazem sentido para elas, mas sem conexão com uma atividade coletiva social, sindical ou partidária, que poderia ajudar a estruturar melhor o pensamento político. 

Eleição regional: vitória da extrema direita?

Nos dias 20 e 27 de junho, os franceses vão eleger os representantes das 13 regiões e dos 101 departamentos administrativos do país. As pesquisas apontam o partido de extrema direita Reagrupamento Nacional (RN), de Marine Le Pen, na liderança de seis das 13 regiões. Há grande expectativa para saber se a frente republicana irá funcionar e barrar a eleição dos populistas de direita. Todos os partidos se solidarizaram com Macron no incidente de terça-feira (8), o de Marine Le Pen inclusive. 

Na última eleição, em 2015, o partido da ultradireitista teve um desempenho recorde de 27,7% dos votos no primeiro turno, mas não passou no teste do segundo turno. Desta vez, os cientistas políticos acreditam que a sigla tem boas chances de vencer em uma ou duas regiões francesas.