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Depois de um mês e meio, a Justiça Eleitoral proclama o socialista Pedro Castillo presidente do Peru

20/07/2021 05h34

Foram necessários 43 dias para que a Justiça Eleitoral julgasse como improcedentes as mais de mil impugnações apresentadas pela candidata derrotada Keiko Fujimori. Pedro Castillo terá apenas uma semana para a transição. Ele assume no próximo dia 28, prometendo uma nova Constituição e negando a legalização do aborto, da maconha e do casamento homossexual.

Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

O Jurado Nacional Eleitoral (JNE) proclamou o professor rural e sindicalista Pedro Castillo como o vencedor das eleições presidenciais de 6 de junho passado, depois de julgar como improcedentes as últimas cinco impugnações da derrotada rival Keiko Fujimori, cujas ações para anular os votos do seu adversário foram consideradas pela Justiça como "manobras dilatórias".

"Depois de o JNE declarar por unanimidade a improcedência das cinco apelações apresentadas pelo partido político Força Popular (de Keiko Fujimori), será elaborada a ata de proclamação do presidente da República José Pedro Castillo Terrones", anunciou o presidente do JNE, Jorge Luis Salas, em cerimônia virtual, na noite desta segunda-feira (19).

No dia 6 de junho, Pedro Castillo recebeu 50,12% dos votos no segundo turno. A escassa diferença de apenas 44 mil votos foi um incentivo para que Keiko Fujimori denunciasse fraude, embora nunca tenha apresentado provas.

Sem margem para a transição

No entanto, as denúncias de irregularidades e pedidos de impugnações não permitiram que o país conhecesse o ganhador e impediram que Pedro Castillo pudesse preparar a transição. O novo governo assumirá no próximo dia 28 de julho, em coincidência com a data festiva do Bicentenário da Independência do Peru.

Mesmo considerando o resultado "ilegítimo", Fujimori disse que reconheceria a decisão que lhe impunha a terceira derrota consecutiva na sua tentativa de chegar à Presidência, cargo que lhe favoreceria perante a acusação de lavagem de dinheiro pela qual pode ser presa.

"Cumprindo com os meus compromissos assumidos com todos os peruanos, com Mario Vargas Llosa e com a comunidade internacional, vou reconhecer os resultados porque é o que a Constituição manda", anunciou Fujimori, antes de fazer uma nova advertência sobre a chegada de Pedro Castillo ao poder.

"Agora, teremos de enfrentar unidos uma nova fase que será muito difícil porque o comunismo não chega ao poder para soltá-lo. Por isso, querem impor uma nova Constituição", alertou.

Marxista leninista

Pedro Castillo, por sua vez, pôde fazer o seu primeiro discurso como presidente eleito.

"Trago o coração aberto para todos. Peço a lealdade deste povo e peço esforço e sacrifício para enfrentarmos juntos esta luta por um povo mais justo e soberano", discursou, com o seu tradicional chapéu, a milhares de seguidores, a partir da varanda da sede do seu partido Peru Livre, em Lima.

Professor rural e líder sindical de 51 anos, Castillo era um desconhecido para a maioria dos peruanos até a campanha eleitoral, na qual propôs uma maior participação do Estado na economia e uma reforma da Constituição. Prometeu elevar os impostos às companhias de mineração.

O agora presidente eleito se declara marxista leninista conservador. É contra o aborto e a eutanásia, mas aceita que os assuntos sejam discutidos pelo Congresso. Rejeita ferozmente a possibilidade de uma legalização da maconha e do casamento homossexual. Garante que vai respeitar a liberdade de imprensa, mas quer uma regulação mais estrita dos meios de comunicação.

Tensa polarização

Durante os 43 dias em que o país ficou à espera de um resultado oficial, partidos de direita que apoiaram Keiko Fujimori, com apoio de empresários, tentaram encontrar algum argumento jurídico que impedisse a chegada ao poder de Pedro Castillo.

Até mesmo centenas de militares da reserva escreveram uma carta aos atuais chefes das Forças Armadas, na qual pediram que não reconhecessem a vitória de Pedro Castillo se as instituições eleitorais não investigassem as denúncias de irregularidades durante as eleições.

Nas ruas, sobretudo de Lima, multiplicaram-se as manifestações polarizadas a favor de um e de outro candidato, uma tensão própria de um país dividido em partes iguais como as urnas revelaram.

Outras Reações 

A Organização dos Estados Americanos, a União Europeia e países como Estados Unidos, Reino Unido e Canadá, observadores internacionais do processo eleitoral, garantiram que as eleições foram transparentes.

A embaixada dos Estados Unidos em Lima disse que espera estreitar os laços com o governo Castillo e parabenizou os peruanos pelo encerramento do processo eleitoral. "Valorizamos nossos laços profundos e esperamos fortalecê-los com o presidente eleito Pedro Castillo após sua posse", escreveu a delegação dos EUA em um tuíte.

O governo do presidente venezuelano Nicolás Maduro celebrou a eleição "inquestionável" de Castillo e desejou "desenvolver uma relação bilateral de cooperação integral", segundo nota.

O Secretário-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, parabenizou "Pedro Castillo por sua vitória nas eleições" em um tuíte. "Asseguramos nosso compromisso de que a partir da OEA fortaleceremos nosso trabalho com o novo governo do Peru".

"Juntos trabalharemos por uma América Latina unida", tuitou o presidente argentino, Alberto Fernández, enquanto o presidente colombiano, Iván Duque, disse esperar que Bogotá e Lima continuem trabalhando para fortalecer "os laços".

"É o triunfo da dignidade e da unidade do povo sobre o neoliberalismo", escreveu o ex-presidente boliviano Evo Morales no Twitter, enquanto o Ministério das Relações Exteriores de La Paz lhe desejava "o maior sucesso" e instava Castillo a "continuar aprofundando os laços históricos de fraternidade. "

(com informações da RFI)