8 de março: Dilma Rousseff diz em Paris que misoginia foi a base de seu impeachment
A prefeitura de Paris realizou nesta sexta-feira (8) uma conferência internacional para debater os direitos das mulheres na ocasião do 8 de março. A ex-presidente Dilma Rousseff, atualmente presidente do Banco dos Brics, foi uma das convidadas e falou sobre a misoginia na política que, segundo ela, foi o pano de fundo para a sua destituição, em 2016.
A conferência "En 2024, une femme = un homme ? Une question de pouvoir" ("Em 2024, uma mulher = um homem? Uma questão de poder") reuniu diversas personalidades femininas para debater os direitos das mulheres no século 21. Além da ex-presidente brasileira estavam presentes, entre outras, a ex-presidente do Chile, Michelle Bachelet e a ganhadora do prêmio Nobel da Paz de 2003, a iraniana Shirin Ebadi.
No discurso de abertura, a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, agradeceu às mulheres presentes que, segundo ela, "foram tão julgadas, por vezes amadas, mas por muitas vezes odiadas e criticadas, lutaram contra o fascismo e nunca deixaram de lutar pela democracia, mudando a vida de milhões de pessoas".
Hidalgo aproveitou a ocasião para comemorar a recente inscrição do direito ao abordo na Constituição francesa.
"A França acaba de sacralizar esse direito fundamental das mulheres e ninguém mais poderá tirá-lo", destacou.
Críticas à extrema direita
A ex-presidente Dilma Rousseff foi bastante aplaudida pelas participantes, mulheres em sua maioria, na chegada ao salão do Hôtel de Ville. Em seu discurso, a ex-presidente brasileira falou sobre a importância de se diminuir as desigualdades, não apenas de gênero.
"Sem reconhecer os direitos das mulheres, os direitos não são humanos. É sobre a mulher negra e indígena que recai a maior desigualdade na América Latina. Para que a política de combate à desigualdade seja efetiva, ela precisa focar nas mulheres, nos negros e nos indígenas", disse.
Dilma Rousseff, que é presidente do Banco dos Brics por indicação do atual governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, destacou também a busca por mais empoderamento da mulher e uma maior participação na vida política. Ela falou sobre o processo de impeachment que a destituiu do poder.
"A misoginia representa a repulsa do patriarcalismo face às mulheres que ousam sair de suas esferas. E a extrema direita critica e tem ódio de tudo o que é diferente. No golpe contra mim em 2016, o preconceito e a misoginia constituíram um pano de fundo para a destituição da única mulher eleita presidente. Isso levou a uma total perda de direitos".
Ela lembrou ainda as fake news e o que chamou de "manipulação midiática" que teve de enfrentar em seu governo. Esses recursos "se tornaram uma ferramenta privilegiada a serviço da misoginia", apontou.
Por fim, Rousseff fez uma associação entre a desigualdade de gênero e as desigualdades sociais
"Nos países do Sul global, a pobreza tem a face da mulher. No Basil, para superar a pobreza e a exclusão, é preciso colocar foco prioritário nas mulheres, na igualdade de gênero e social. Não é possível fazer política social sem foco nas mulheres", finalizou.
"Uma mulher não bombardearia hospitais em Gaza"
A advogada e ganhadora do prêmio Nobel da Paz em 2003, Shirin Ebadi, fez uma longa crítica aos ataques que persistem na Faixa de Gaza. Ela se disse consternada diante das pessoas que perderam seus familiares em 07 de outubro, mas também por todos aqueles que estão sofrendo as consequências no enclave palestino.
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Quero receber"O que a população civil de Gaza tem a ver com esses atos e até quando esse massacre vai perdurar?", questionou ela.
"O líder do Hamas vive em segurança no Catar e é o povo civil que paga por isso. Tenho certeza que se as autoridades de Israel e do Hamas fossem mulheres, isso não estaria acoontecendo nessas condições. Se no lugar de Netanyahu estivesse uma mulher, vocês acreditam que ela bombardearia um hospital? Não!", afirmou.
Ebadi citou também a situação das mulheres nos países islâmicos, especialmente o Irã, sua terra natal, onde, segundo ela, as leis são grandes opressoras.
"No meu país muitas leis foram adotadas contra as mulheres. A lei estipula que o homem vale o dobro de uma mulher, o testemunho de duas mulheres equivale ao de um homem. Os homens podem casar com até quatro mulheres e podem se separar quando quiserem. No caso das mulheres, conseguir o divórcio é muito difícil, praticamente impossível", lamentou.
Retrocesso
A ex-presidente do Chile e ex-comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, falou sobre os retrocessos observados nos países com governos de extrema direita e ultraliberais. Ela mencionou como exemplo o Brasil e, atualmente, a Argentina.
"Todos esses anos em que estive a frente de um pais, sempre quis defender o direito das mulheres e a igualdade. Vemos na Argentina, de Milei, novas medidas que são um retrocesso nos direitos das mulheres, assim como vimos com Bolsonaro no Brasil. Não pedimos privilégios, mas igualdade, e a partir do momento em que uma mulher entra na política, isso muda tudo", destacou.
O encontro promoveu ainda uma série de mesas redondas com a participação de ministras, prefeitas, representantes de instituições internacionais, militantes e artistas.
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