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Ocupada há um ano por sem-terra, praça deixa de ser ponto de encontro e vira minifavela no centro de Maceió

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

13/02/2012 06h00

Antigo ponto de encontro de estudantes e moradores do Centro, a praça Sinimbu, uma das principais em Maceió, tornou-se a casa de passagem de trabalhadores rurais sem-terra que vêm reivindicar na capital alagoana.

Por ficar em frente à sede do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) em Alagoas, vários grupos passaram pelo local nos últimos anos para pressionar por soluções de problemas. Foram mais de dez grupos que revezaram no local.

Mas nenhuma ocupação passou tanto tempo como estão as cerca de 30 famílias despejadas do acampamento Cavaleiro, no município de Murici (44 km de Maceió). No dia 24 de janeiro de 2010, um grupo com 70 famílias foi retirado do acampamento, às margens da BR 104.

Após reuniões sem sucesso com autoridades pedindo uma solução para a expulsão, os sem terra acamparam na praça no dia 8 de fevereiro de 2011 e não saíram mais.

A praça da Sinimbu fica em uma das áreas centrais mais movimentadas de Maceió. No entorno da praça existem, além do Incra, prédios do TRE (Tribunal Regional Eleitoral), um fórum, a Secretaria de Segurança e Direitos Humanos de Maceió e o Espaço Cultural da Ufal (Universidade Federal de Alagoas). O local é bastante movimentado durante os dias, e as moradias improvisadas chamam a atenção.

O UOL visitou a praça nesta sexta-feira (10) e encontrou problemas similares aos de uma pequena favela. O local não possui abastecimento de água nem de energia elétrica, que tem ligação clandestina.

O lixo se acumula nas ruelas improvisadas, e o esgoto corre a céu aberto. As barracas, de lona e madeira, não possuem estrutura mínima de moradia e são alvos fáceis de saqueadores. A praça, antes com brinquedos e obras de arte, hoje é marcada pelo abandono, com equipamentos quebrados e falta de manutenção.

Acostumados com a moradia

Depois de tanto tempo no local, os trabalhadores passaram a se acostumar com a rotina da cidade grande e passaram a trabalhar informalmente para melhorar a renda –hoje exclusiva dos programas sociais do governo federal, já que ninguém tem emprego com carteira assinada.

O sem-terra Amaro Manoel dos Santos, 46, montou uma minioficina onde transforma garrafas long neck de cerveja em taças. “Saio vendendo à noite essas taças por R$ 2. Tem vezes que vendo 100, 150. Tem dias que não vendo nada. Depende da festa”, disse.

Apesar da rotina de venda e da renda extra, o trabalhador não esconde a vontade de deixar a capital e voltar a morar na zona rural. “É melhor na roça, não há dúvida. Lá a gente consegue ter nossa terra, uma renda certinha. E a vida é bem melhor. Aqui é improvisado”, disse.

Já o sem-terra José da Silva, 44, cata garrafas e restos de madeira para vender e confessou que os moradores precisaram fazer ligações clandestinas –e perigosas– para ter energia elétrica. “Já teve um incêndio no meu barraco por conta disso. Não estava em casa na hora, mas o fogo destruiu algumas coisas. Já água nós temos porque fizemos um acordo com o Incra para pegarmos lá, com baldes”, afirmou.

Para montar a casa, com lonas, madeiras e até janela, José catou madeiras na rua e móveis. “O menino dorme no sofá que pegamos”, disse. “Aqui o Incra nunca nos procurou para dar móveis ou com uma solução definitiva”, afirmou.

O clima na nova moradia é de amizade entre os moradores. Segundo eles, não há conflitos. No Natal e no Ano-Novo, por exemplo, confraternizações foram promovidas em uma pequena tenda improvisada. Nos últimos dias, a alegria dos sem terra tem sido do pequeno Ícaro, nascido no dia 31 de janeiro.

A mãe do bebê, Natália dos Santos, 18, que vive com o menor num pequeno barraco com cerca de 8 m², disse que contou com a solidariedade dos companheiros sem terra para conseguir o enxoval e fraldas. “Tive toda minha gestação aqui. Graças a Deus me ajudaram, mas gostaria muito de ter uma casa, de voltar à minha cidade”, disse a jovem, mostrando o último pacote de fraldas que possuía, com pouco mais de 20 unidades. “Depois disso, não tenho como comprar mais”, afirmou.

A presença dos sem terra divide as pessoas que passam ou trabalham pelo local. “Não tenho o que reclamar, até porque à noite eles acabam sendo uma presença para um local que ficaria vazio. Só o mau cheiro que às vezes vem com força”, diz o estudante Jairo Vieira, 19, que passa pelo menos duas vezes pelo local.

Já os comerciantes que ficam na praça vizinha reclamam que os sem-terra espantam o público. “Eles não mexem com ninguém aqui, mas todos sabem da fama. E as pessoas ficam com medo de parar o carro e vir comprar. Isso expulsa o público”, disse uma comerciante do espaço "Guerreiros do Artesanato", sem querer se identificar.

Sem previsão de saída

A assessoria de comunicação do Incra em Alagoas informou que desde novembro está com um convênio com o governo do Estado finalizado. A previsão é a aquisição de quatro propriedades na zona da mata alagoana, que abrigarão entre 250 e 300 famílias. “Dentro desse projeto, a prioridade das prioridades é a Cavaleiro, pois sabemos da situação deles na praça”, informou.

Segundo o órgão, o Incra espera apenas a posição da PGE (Procuradoria Geral do Estado), apontando a legalidade dos termos, para assinar o convênio, que prevê que o Estado adquira as terras para criação de assentamentos. Não há prazo para saída dos moradores da Sinimbu, mas a expectativa é de que a mudança ocorra ainda em 2012.

Já a Eletrobras Distribuição Alagoas confirmou que a moradia improvisada na praça Sinimbu não tem ligação de energia, mas informou que “está programando uma ação educativa para ser realizada com os ocupantes da praça”.

“A intenção da empresa é agir onde há perdas de energia elétrica, como no caso da praça. As lideranças do movimento serão procuradas para tentar resolver a situação”, informou o órgão.

"Saturou", diz prefeitura

Responsável pela administração da praça, a prefeitura de Maceió informou ao UOL que pretende ingressar ação na Justiça pedindo a desocupação da praça. Segundo o secretário de Governo da prefeitura, Pedro Alves, a ação está pronta há alguns meses, mas intervenções feitas a pedido do Incra, governo do Estado e Justiça, pedindo prazo para uma solução, adiaram o procedimento judicial.

“Nós fomos muito tolerantes com as ocupações durante toda a gestão, mas uma ocupação de um ano saturou ao que é razoável em um protesto. Esse período já se caracteriza moradia. Nós temos também um projeto de requalificação da praça pronto para ser colocado em prática”, disse, sem citar prazo para ingresso da ação na Justiça.