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Por R$ 493 milhões, Maceió contrata até 2017 empresas acusadas da "máfia do lixo"

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

04/03/2012 06h01

Um ano e três meses após o Ministério Público de Alagoas ingressar com uma ação civil contra o prefeito de Maceió, Cícero Almeida (PP), e contra gestores públicos e empresários por uma suposta “máfia do lixo”, a prefeitura anunciou que as duas empresas acusadas de participação no esquema foram contratadas e ficarão responsáveis pela coleta na capital alagoana nos próximos cinco anos. Segundo o MP, o esquema fraudulento teria resultado em um desvio de R$ 200 milhões do erário.

Segundo edital publicado no Diário Oficial da última quarta-feira (29), as empresas Limpel e Viva Ambiental venceram a licitação e têm até a próxima terça-feira (6) para apresentarem as garantias e assinarem os contratos –que deverão entrar em vigor de forma imediata. As duas empresas já eram responsáveis pela limpeza pública da capital alagoana e, com a nova licitação, continuarão com o serviço até 2017. As empresas vão receber, ao todo, R$ 493 milhões –ou R$ 8,1 milhões por mês.

A prefeitura foi procurada pela reportagem, mas indicou o procurador-geral do município, Carlos Roberto Ferreira Costa, para comentar a licitação. Segundo Costa, as duas empresas vencedoras não possuíam impeditivo legal para concorrer com outras três empresas do ramo que participaram da concorrência.

“Os procedimentos foram acompanhados por todos os órgãos. Foram cinco empresas habilitadas, tivemos a fase de recursos e contrarazões. As vencedoras da licitação não tinham qualquer impeditivo, pois o Judiciário não julgou nenhuma delas ainda para que houvesse essa proibição. A gente está muito confortável nesse sentido, pois várias empresas concorreram, e não compete a nós, nem ao MP, indicar que empresas podem participar. Caberia a nós fiscalizar, e fizemos isso”, afirmou.

“Tivemos todo o cuidado em relação a esse processo. Nos colocamos a disposição do MP estadual e do MP de Contas, apresentamos todas as planilhas e deixamos à vontade que eles fizessem qualquer mudanças. Foi aberto para consórcios, como foi pedido, e depois os responsáveis assinaram uma ata dizendo que o edital está juridicamente perfeito”, completou.

MP critica morosidade

Autor da ação civil contra o prefeito de Maceió e mais 15 pessoas, o promotor da Defesa do Patrimônio Público, Marcus Rômulo, culpou a morosidade da Justiça pela contratação das mesmas empresas que são acusadas de corrupção. “Dei entrada com esse processo em novembro de 2010 e até agora não existe sequer ação, pois alguns acusados não foram citados. Numa ação penal, é natural essa demora. Mas a civil eu esperava que andasse de forma mais célere, mas fui informado que existem réus em Fortaleza, em Brasília, e a Justiça é lenta. Mas hoje [sexta-feira, 2] conversei com o juiz da Vara, o quarto somente esse ano, e ele prometeu celeridade nas ações civis do MP que tramitam lá”, disse.

Segundo o promotor, as empresas vencedoras da licitação, embora sejam denunciadas pelo MP, não teriam impedimentos de participar do processo licitatório. “Ficamos de mãos atadas, pois não posso impedir. Legalmente, nem rés no processo essas empresas são ainda. Isso é grave e é o malefício que a impunidade causa. Se houvesse o julgamento e fossem absolvidas, ninguém estaria falando nada. Mas esse estado de dúvida é ainda pior. Se elas fossem condenadas, como pedimos, não estariam sendo recontratadas”, desabafou o promotor.

A decisão de fazer uma licitação de cinco anos, com a vitória das mesmas empresas acusadas de participação no desvio de R$ 200 milhões, gerou protestos em Maceió. O advogado e coordenador do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral) em Alagoas, Adriano Argolo, disse que, apesar da legalidade, o processo licitatório é imoral e está passível de ser anulado na Justiça.

“O prefeito de Maceió trata o Judiciário como idiota, e a sociedade, idem. Partem do princípio que o Judiciário é bobo e não vai perceber essa manobra, que foi realizada com imoralidade. Não houve qualquer precaução do bom senso, tendo em vista que a prefeito e as duas empresas foram denunciadas. Essa licitação tem indícios de imoralidade e de improbidade acentuados, visto que são cinco anos pela frente. O Judiciário, se quiser, poderá anular essa manobra”, afirmou.

O UOL tentou entrar em contato com as empresas Viva Ambiental e Limpel, mas nenhuma das ligações foi atendida.

Em entrevista à época da denúncia, o prefeito negou qualquer irregularidade na assinatura de contratos de prestação de serviço para recolhimento do lixo e, em tom de indignação, disse ser vítima de perseguição do MP. “Quero que qualquer autoridade desse Estado convoque todos os secretários. Podem me deixar fora. Quero que qualquer um dos secretários levante o dedo para dizer que o Cícero Almeida permitiu que algo errado fosse feito nesse município”, alegou. “Eu tenho mais de 80% de aprovação da população de Maceió, que sabe quem é Cícero Almeida.”

Relembre o caso

Segundo a denúncia do MP-AL, o prefeito Cícero Almeida teria participado, junto com mais 15 pessoas, de “um conjunto de fraudes em licitações e contratos irregulares, entre os anos de 2005 e 2008, que terminaram desviando algo em torno de R$ 200 milhões do município para empresas de recolhimento de lixo”.

O MP afirmou que, após começar a prestar serviços em Maceió, a empresa Viva Ambiental virou “uma gigante do trabalho de limpeza”. “Antes ela era uma empresa pequena e atuava em apenas três pequenos municípios [Caucaia (CE), Parnaíba (PI) e Madre de Deus (BA)].”

O MP questionou ainda que, em 2005 [quando Cícero Almeida assumiu], a superintendência organizou uma contratação de emergência “cheia de vícios” para coleta do lixo pela Viva Ambiental e pagou um valor R$ 10,8 milhões –bem acima do que era pago à empresa que prestava serviço anteriormente. Seis meses depois da assinatura, o contrato teria sido renovado com valores ainda maiores: R$ 15 milhões.

Segundo o MP, houve uma série de renovações de contratos de forma irregular, sem que fossem feitas licitações ou qualquer publicação em Diário Oficial. Em uma das renovações, houve coleta de preços no mercado, e uma das concorrentes foi a empresa Trópicos, que pertenceria aos mesmos donos da Viva Ambiental –ambas com o mesmo local de funcionamento.

Já a empresa Limpel teria atuado de forma emergencial pelo mesmo período da Viva Ambiental e teria recebido pagamentos superfaturados por fraudes na pesagem dos caminhões de lixo na balança da prefeitura.

À época das denúncias, o prefeito Cícero Almeida e as duas empresas negaram a existência de um esquema e alegaram que os contratos emergenciais foram fechados, sem qualquer irregularidade, para que a cidade não ficasse sem coleta de lixo, após o abandono da empresa que fazia a coleta de lixo na gestão anterior.