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Crise no RJ afeta de limpeza de universidades a semiaberto em presídios

Maria Luísa de Melo

Do UOL, no Rio

30/03/2015 06h00

A falta de limpeza provocada pelo não pagamento de funcionários terceirizados obrigou a Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) a encerrar o ano letivo antes do previsto em 2014. Professores concursados da mesma instituição de ensino ainda não receberam o pagamento das férias de janeiro. Parte dos bolsistas tem benefícios atrasados há dois meses.

Na segurança pública, carros da Polícia Militar já foram submetidos a racionamento de combustível e as atendentes de delegacias da Polícia Civil ameaçam cruzar os braços por falta de pagamento. Há, ainda, presos sendo liberados sem monitoramento por falta de tornozeleiras eletrônicas que não chegam ao Rio desde dezembro.

Esses foram só alguns episódios enfrentados pelo Estado do Rio nos últimos meses. Com uma dívida que chega a R$ 700 milhões, o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) começou seu mandato em meio a uma grave crise. Procurado, o governo do Estado  informou que o posicionamento sobre o assunto já foi dado pelo governador no último dia 20, durante agenda oficial. Na ocasião, ele informou que vêm se reunindo com os fornecedores do Estado e pedindo crédito por mais 60 dias --período que ele considera suficiente para quitar o débito.

"É um momento que o Estado está cobrando quem deve. Temos uma dívida hoje que ronda mais ou menos R$ 700 milhões, mas também  temos mais de R$ 8 bilhões para receber de empresas que devem ao Estado. Estão inadimplentes", afirmou. "Mas estou cobrando uma por uma, todos os dias me reúno com esses devedores (...) Tem dívida de três, quatro meses, tem dívida só deste ano. São diversos tipos de dívidas."

O UOL faz um levantamento dos principais problemas enfrentados pela população em decorrência do déficit no orçamento fluminense.

Aulas adiadas

Na Uerj, que tem cerca de 30 mil alunos, as aulas foram adiadas no início deste ano por falta de limpeza nas dependências da instituição.

O mesmo aconteceu com o Colégio da Aplicação da Universidade. Sem condições de iniciar o ano letivo de 2015, teve aulas adiadas pela quarta vez. Também há pagamentos atrasados entre vigilantes e funcionários da manutenção.

Entre os professores concursados, o pagamento das férias tiradas em janeiro ainda não foi feito e duas modalidades de bolsas não são pagas há dois meses. Alguns professores e funcionários técnicos concursados reclamam também de corte no vale-refeição.

“Não podem nos tirar um direito como o vale-refeição. Estão nos obrigando a entrar na Justiça. Cortar um benefício é um retrocesso muito grande”, queixa-se o professor Hindenburgo Pires, do Instituto de Geografia.

Procurada, a universidade não comentou os problemas. Mas informou, encaminhando uma nota publicada no último dia 9, que o Rio de Janeiro atravessa “grave crise fiscal”. 

Atraso de salários

Na área da segurança pública, as técnicas de atendimento social de delegacias distritais estão com salário atrasado há quase um mês. Na Cidade da Polícia, que concentra as delegacias especializadas, a situação é ainda pior: falta pagamento para vigilantes, porteiros e até faxineiros.  

A situação foi comentada na semana passada pela delegada Monique Vidal, titular da 14ª DP (Leblon), em sua página no Facebook. “Gente, não adianta ligar pra ouvidoria e reclamar que não tem atendente nas delegacias, elas não estão recebendo. Na 14ª DP, as meninas estão trabalhando. Mas eu tenho vergonha na cara e não vou cobrar que cheguem às 8h”, escreveu. 

A Polícia Civil foi procurada, mas não se pronunciou sobre os problemas.

Racionamento de combustível

No final do ano passado, o racionamento de combustível nos carros da Polícia Militar foi denunciado pelos militares. Para economizar, os PMs foram orientados a interromper o patrulhamento.

Dias depois o problema foi com a distribuição das tradicionais cestas de Natal. Por falta de verba, o valor de R$ 100 (equivalente ao valor da cesta) foi pago com atraso. Procurada, a Polícia Militar também não comentou o assunto.

Falta de tornozeleira eletrônica

Sem receber tornozeleiras eletrônicas desde dezembro por conta de dívidas com fornecedor, a Seap (Secretaria de Administração Penitenciária) tem liberado presos sem monitoramento eletrônico.

Foi o caso dos jovens envolvidos na morte do cinegrafista da TV Bandeirantes Santiago Andrade. A dupla teve liberação para deixar a prisão sem as tornozeleiras na última semana. Só no dia seguinte o equipamento foi disponibilizado pela secretaria.

Procurada, a Seap informou que “as finanças fluminenses estão sofrendo forte impacto com a redução dos preços do petróleo, a crise da Petrobras e a desaceleração do crescimento econômico do país”. Sobre as tornozeleiras, informaram que “os pagamentos pendentes serão incluídos na programação financeira de acordo com o fluxo de caixa".

Demissões

Outro fator que tem complicado ainda mais a situação do Estado são as milhares de demissões decorrentes da crise na Petrobras. A empresa é a responsável pelo projeto do Complexo Petroquímico (Comperj), em Itaboraí, e por atividades de produção de óleo e gás em Macaé. Assim, a crise da estatal afeta o Estado em cheio.

Só no mês de janeiro, o Rio perdeu 8.353 vagas de carteira assinada –7.065 em Itaboraí e 1.288 em Macaé. O número corresponde a 10% do total de vagas perdidas no Brasil neste período, segundo levantamento do economista e professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Mauro Osório, feito com base nos dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), do Ministério do Trabalho e Emprego.

Para Osório, a porcentagem é alta, considerando que se trata apenas de dois dos mais de 6.000 municípios brasileiros. “Em fevereiro, Itaboraí demitiu 1.216 pessoas, e Macaé, 890. Sendo que no Brasil inteiro houve redução de 2.415 vagas. Ou seja, não fosse o mau desempenho do Rio de Janeiro, o resultado do país teria sido positivo”, disse. “O horizonte do Rio de Janeiro para a frente tende a ser bastante difícil, porque é o Estado brasileiro mais dependente do petróleo.”

Falta de limpeza nas escolas

Escolas estaduais de municípios como Angra dos Reis, Itaguaí, Volta Redonda e Barra do Piraí também sofrem os efeitos da dívida. Com salários atrasados, parte dos auxiliares de serviços gerais da empresa terceirizada de limpeza Cuidar Serviços cruzaram os braços. Assim, houve redução de funcionários de limpeza nas escolas. As aulas, no entanto, não chegaram a ser afetadas.

De acordo com informações da empresa, há pendências de pagamento desde outubro do ano passado. Só neste mês o débito está começando a ser regularizado. A firma atende cerca de 200 escolas da rede estadual.

“Alguns funcionários não estão indo trabalhar, mas fizemos o possível para não afetar muito a prestação do serviço. O governo do Estado estava com pendências de pagamento desde outubro. Só em fevereiro o Estado liberou um cronograma de pagamentos”, explicou Andreia Devace, do departamento jurídico da empresa. “Temos a intenção de conseguir regularizar toda esta situação até o mês de abril.”