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Homem que furtou carne para comer comemora emprego, carro e geladeira cheia

Jéssica Nascimento

Do UOL, em Brasília

23/06/2015 12h51Atualizada em 23/06/2015 14h06

O eletricista Mário Ferreira Lima, 47, que ficou conhecido em todo o país por furtar carne em um supermercado e receber ajuda de policiais civis do Distrito Federal, vive uma nova fase: trabalha com carteira assinada em uma construtora de Valparaíso (GO), conseguiu adquirir um carro e tem a geladeira cheia.

Mário continua morando em uma pequena casa localizada em Luziânia, cidade goiana que fica a aproximadamente 60 km de Brasília. A geladeira foi trocada e agora vive sempre cheia. Uma cama nova e dois colchões também obtidos através de doações.

“Recebi ajuda do país inteiro e até dos Estados Unidos. Eram tantas cestas básicas que doei parte delas para instituições de caridades e lar dos velhinhos”. Mário agora recebe R$ 1.300 por mês, além de vale-transporte e vale-alimentação.

Orgulhoso da nova rotina, ele trabalha de segunda a sexta-feira, das 7h30 às 17h. Os finais de semana têm sido utilizados para reformar a residência, que ainda precisa de diversos ajustes, como telhado e instalações.

“Meu sonho é construir um quarto bonito para o Diego [filho de 12 anos]. Quero trazer a infância dele de volta que foi perdida devido à nossa pobreza”, diz. O eletricista ainda precisa de doações. A televisão está queimada, e faltam tanque de lavar roupas e materiais de construção.

“Já recebi demais e agradeço todos os dias a Deus. Eu e meu filho temos roupas e alimentos até o final do ano. São tantas vestimentas chiques que nem sei como usar”, brinca. Um dos sonhos do eletricista já foi realizado. Há pouco mais de duas semanas, ele comprou um carro. “Dividi em 20 vezes de R$300, escolhi um Santana 98 e estou muito feliz”.

Acusações e elogios

Após o furto no supermercado ter ganhado repercussão nacional, textos em redes sociais acusaram Mário de ter cometido o mesmo crime. “Além da passagem do mês passado, só tenho mais uma. Fiz [os furtos] apenas por necessidade. Foram precisos dois erros para que Deus iluminasse meu coração e me desse oportunidades”. De acordo com a Polícia Civil, o eletricista cometeu os furtos em 2004 e 2007 nos comércios de Goiás.

Um dos policiais que organizou a vaquinha para ajudar Mário diz ter ficado triste ao saber das outras ocorrências. “O grupo ficou bem chateado. Porém, acreditamos que o que vale realmente é a ressocialização. O nosso objetivo é ajudar e não punir”, afirma o agente Ricardo Machado, da 20ª Delegacia de Polícia.

O encarregado de obras de Lima, Fabrício Ferreira, 32, elogia o companheiro de trabalho. Segundo ele, Mário é um excelente profissional. “Ele tem muito interesse no serviço e só está melhorando. É um grande exemplo, sabe? Teve uma segunda chance e está aproveitando-a da melhor maneira possível.”

Já o eletricista Walderson Nascimento, 25, conta que não acompanhou a repercussão da história de Lima pela mídia. “Só fiquei sabendo do que ele tinha feito quando o conheci. Acredito que Mário aprendeu com o erro e prefiro não julgar. Ele é uma pessoa íntegra, responsável e hoje somos amigos.”

Mário também conquistou a amizade dos policias da 20ª DP. Eles trocam sempre ligações e algumas visitas. “São meus anjos da guarda, se preocupam comigo e também ajudam minha família no que precisamos.”

Lima também recebeu propostas de diversos advogados de todo o país para ser defendido. Ele aguarda o desfecho jurídico do inquérito, que está pendente de decisão. A expectativa é de que o eletricista seja enquadrado no furto famélico, quando a subtração é feita para garantir necessidades vitais e urgentes.

“Eu sei que errei e vou pagar pela minha burrada. Estou recebendo assistência de um advogado gratuitamente e ele vai fazer o que for melhor para mim”. Segundo o eletricista, o furto foi cometido apenas pela dor da fome. “Eu pedia alimentos e as pessoas me chamavam de vagabundo. Já tirei comida do lixo e até tive que tomar iogurte estragado. Furtar foi minha única opção”.

Sem os olhos cabisbaixos e o sorriso amarelo de um mês atrás, Mário quer apenas crescer na vida e deixar o passado para trás. “Sou uma pessoa 100% melhor. Trabalhar me faz feliz.”