'Se fosse à noite, teria morrido todo mundo', diz moradora de Mariana (MG)
A dona de casa Rosa Helena da Silva, 42, emociona-se a todo instante e interrompe a entrevista, ao relembrar dos momentos de terror vivenciados quando do rompimento das barragens da empresa Samarco, em Bento Rodrigues, subdistrito de Mariana (MG).
Na quinta-feira (5), ela afirmou que estava na rua, próxima a sua casa, quando escutou os gritos de alerta vindos de um motorista de caminhão, que passou recolhendo as pessoas que encontrava pela frente. Ela não se recorda do nome dele, mas o tratou como um herói.
“Se fosse à noite, teria morrido todo mundo porque a gente ia estar dormindo. A sorte nossa é que foi de dia. E se não fosse esse motorista do caminhão, a gente não tinha dado conta de sair de lá a tempo. Agradeço muito ele. Ou a gente entrava no caminhão, ou a gente ia morrer ali”, afirmou chorando. Segundo ela, não deu tempo de pegar nada nas casas.
“Saiu todo mundo desesperado, gritando, entramos na caçamba do caminhão pulando por cima dos outros. Foi uma tragédia. A água veio fazendo um barulho muito grande, uma zoeira que me deu o maior medo da minha vida, e lama em cima de lama”, relembrou.
A moradora conta que após ter saído do local, passou as primeiras horas em outro subdistrito [Santa Rita], onde recebeu ajuda dos moradores até ser levada, na madrugada de sexta-feira (6), para um complexo esportivo, em Mariana, que virou ponto de abrigo público para os moradores afetados.
Em seguida, ela foi levada, juntos com filhos e netos, para uma pousada, no centro da cidade histórica, na tarde desta sexta-feira (6). “Meu tio, de 70 anos, está desaparecido. A lama levou ele embora. O nome dele é Antônio Prisco de Souza”, disse.
Ao falar do futuro, a desabrigada novamente chora.
“Agora estamos aqui, presos em um hotel. Queria estar é na minha casa, onde estou acostumada. Meus meninos tinham liberdade para andar na rua, agora, não podem nem sair porque passa muito carro aqui. Não tenho dinheiro para nada, saí só com a roupa que usava naquela hora”, afirmou.
“Eu perdi tudo, não sobrou nada da minha casa. Não tenho documento, dinheiro, nada. Tudo que construímos foi por água abaixo”.
Rosa Helena afirmou que não pretende voltar, caso seja possível, a morar em Bento Rodrigues.
“Eu não sei o que vai ser de mim, mas para lá não quero voltar nunca mais. O pavor que eu senti, não quero sentir de novo. Não confio neles (empresa Samarco) que garantiram que não havia perigo da barragem estourar”, disse.
Ela está na pousada com três filhos e três netos. Um dos filhos, de 11 anos, ela somente encontrou na sexta-feira (6), em pátio de igreja. “Foi a alegria maior da minha vida ver meu filho com vida”, afirmou.
Já Alexleila Agda Pinto Santos, 28, sobrinha da dona de casa, afirmou que todos estão revoltados com uma suposta ausência de apoio da empresa na hora que ocorreram os rompimentos das barragens.
“Não deram um alarme para avisar a gente sobre a barragem. Se não fosse a comunidade, que é muito unida, a gente não tinha conseguido sair com vida. A gente só via aquele poeirão e, depois, a lama parecendo um mar”, declarou a dona de casa.
A moradora disse que os sobreviventes deverão acionar a empresa judicialmente. Alexleila conta que duas crianças vizinhas dela estão desaparecidas.
“A gente está com a ideia de juntar a comunidade toda, mais para frente, para tentar formar um grupo e fazer valer os nossos direitos. A empresa destruiu nossos sonhos. A gente quer agora deles uma moradia digna, que não nos coloquem em qualquer lugar, em qualquer cidade”, salientou.
Ela, da mesma maneira que a tia, não quer voltar para onde morava.
“Nunca mais. Tem corpo lá dentro daquela lama. O sonho foi destruído, a gente tinha a família por perto, agora tá todo mundo espalhado. Mas não volto nunca mais para lá. Quem garante que não vai acontecer de novo”, contou.
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