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Em vídeos, PMs puxam e amarram com corda homem negro já algemado em SP

Do UOL, em São Paulo

23/06/2023 15h38

Imagens obtidas pela defesa do homem negro amarrado pelos braços e pernas em São Paulo mostram que os policiais militares usaram a corda para detê-lo depois que ele havia sido algemado. A Justiça aceitou, na terça-feira (20), denúncias contra o rapaz — ele se tornou réu por furto, resistência e corrupção de menores.

O que aconteceu

O vídeo foi gravado pelas câmeras de segurança de um prédio na Vila Mariana, zona sul de São Paulo. As imagens mostram que o homem foi derrubado no chão e imobilizado por ao menos quatro policiais. Depois, foi algemado e teve os braços e pernas amarrados.

Logo após ter sido imobilizado, o homem teve os braços e uma das pernas puxados pelos policiais. Ele ainda foi empurrado contra a parede e algemado junto a uma parede.

Com o homem no chão, um dos policiais coloca o joelho sobre as costas dele. Depois, um outro agente faz a mesma coisa.

Os policiais, então, usam uma corda para amarrar os pés e as mãos do rapaz. Ele tenta se mover amarrado. Segundos depois, um dos agentes se aproxima e aperta a corda.

Antes da abordagem, imagens de câmeras corporais dos policiais mostram o momento em que o homem é questionado pela polícia. "Foi eu que peguei", diz o homem informalmente aos policiais — eles haviam recebido denúncia sobre um furto em um mercado.

Em seguida, ele diz que só se sentaria no chão, como manda um dos agentes, com um "rodo", expressão usada para se referir a uma agressão nas pernas com o objetivo de derrubar a pessoa. "Pra mim sentar só dando um rodo", diz o homem. Um dos agentes responde: "Então, toma".

O que diz a defesa

Segundo o advogado José Luiz de Oliveira Júnior, da Associação Nacional da Advocacia Negra, imagens que mostram o homem sendo agredido haviam sido suprimidas das filmagens fornecidas pela Secretaria Estadual da Segurança Pública. "É impossível confiar nas bodycams", disse.

"A defesa pediu as imagens do prédio, que são cruciais para mostrar a realização da tortura", afirmou. "Todos se atentaram para o fato do furto, da suposta corrupção de menores, mas ninguém teve coragem de falar do crime de tortura cometido pelos policiais."

O advogado do homem amarrado informou que solicitou as imagens do prédio onde ocorreu a abordagem depois de o juiz ter solicitado as gravações das câmeras corporais. A defesa informou que vai pedir a condenação de todos os policiais militares envolvidos.

O mais importante nessas imagens é a forma como ele foi amarrado. Eles puxam as cordas com ele já preso. Ele já estava algemado. A partir do momento que se amarra os pés e as mãos se está impingindo a dor, para que ele sentisse mais dor. Existia um grau de sadismo ali.
José Luiz de Oliveira Júnior, advogado

Homem foi amarrado por policiais militares após te sido acusado de furto em mercado de SP - Reprodução - Reprodução
Homem foi amarrado por policiais militares após te sido acusado de furto em mercado de SP
Imagem: Reprodução

O que diz a SSP

A Secretaria da Segurança Pública informou ao UOL que a divulgação das imagens das câmeras usadas pelos policiais "mostra que as câmeras não foram desligadas e registraram toda a ação".

"Essas imagens foram inseridas como prova nos autos do Inquérito Policial Militar e não são divulgadas, conforme previsão legal, resguardando a imparcialidade nas investigações", afirma nota enviada à reportagem.

Os seis policiais envolvidos na abordagem permanecem afastados do trabalho operacional, segundo a pasta. "A Polícia Militar reforça que a abordagem não é compatível com o treinamento e valores da instituição."

Relembre o caso

O homem foi preso em flagrante acusado de roubar produtos em um supermercado. Ele teve os pés e as mãos amarrados pelos policiais. A ação ocorreu no domingo (4) e foi filmada por uma testemunha em uma UPA (Unidade de Pronto-Atendimento).

A audiência de custódia do homem ocorreu na segunda (5). A juíza da audiência entendeu que "não há elementos que permitam concluir ter havido tortura ou maus-tratos". Na audiência, a prisão em flagrante foi convertida em prisão preventiva.

Na denúncia, a promotora do Ministério Público de São Paulo, Margarete Cristina Marques Ramos, afirma que o homem cometeu furto, resistência à prisão e corrupção de menor.

Em relação ao fato de o homem ter sido amarrado pelos pés e pelas mãos com cordas, a promotora escreveu que "a conduta dos policiais militares não tem o condão de anular os crimes cometidos."

Os advogados José Luiz de Oliveira Júnior e Estevão Silva questionaram a denúncia do MP-SP. "A estrutura do Estado se mostra desproporcional em todos os aspectos, quando se trata de reprimenda, especialmente ao pobre, negro e vulnerável social, desde seu nascimento até sua morte", escreveram em nota.