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Na Califórnia, aula de educação sexual inclui o conceito de consentimento

Noah Berger/The New York Times
Imagem: Noah Berger/The New York Times

Jennifer Medina

Em San Francisco (EUA)

15/10/2015 06h00

Os alunos da 10ª série (equivalente ao 1º ano do ensino médio no Brasil) já tinham aprendido sobre doenças sexualmente transmissíveis e vários tipos de controle de natalidade. Hoje, os jovens de 15 anos se reuniram em torno de mesas para discutir outro assunto: como e por que assegurar que cada passo em um encontro sexual seja acompanhado de consentimento.

O consentimento da pessoa que você está beijando –ou algo além disso– não é apenas silêncio ou falta de protesto, disse Shafia Zaloom, a educadora de saúde da Escola Urbana de San Francisco, aos alunos. Eles escutavam com grande atenção, mas vários não escondiam quão confusos se sentiam.

“O que isso quer dizer –você tem que dizer ‘sim’ a cada 10 minutos?” perguntou Aiden Ryan, 15 anos, que estava sentado perto da frente da sala. “Basicamente”, respondeu Zaloom. “Não se trata de algo de ‘timing’, mas aquele que começa a levar as coisas para outro nível precisa pedir.”

O mantra “não significa não” de uma geração atrás está rapidamente sendo eclipsado pelo “sim significa sim”, à medida que mais jovens por todo o país são instruídos de que precisam de permissão explícita do objeto de seu desejo antes de realizarem qualquer toque, beijo ou outra atividade sexual. Com a sanção do governador da Califórnia, Jerry Brown, de um projeto de lei neste mês, o Estado se tornou o primeiro a exigir que todas as aulas de saúde do ensino médio ensinem consentimento afirmativo, que inclui a explicação de que uma pessoa que está bêbada ou dormindo não pode dar consentimento.

No ano passado, a Califórnia saiu à frente na exigência de que as faculdades usem consentimento afirmativo como padrão nas decisões disciplinares no campus, definindo como e quando as pessoas concordam em fazer sexo. Mais de uma dúzia de Legislativos em outros Estados, incluindo Michigan, Maryland e Utah, estão considerando legislações semelhantes para as faculdades. Uma meta é melhorar a forma como as escolas lidam com as acusações de estupro e ataques sexuais, outra é reduzir o número de jovens que se sentem pressionados a adotaram uma conduta sexual indesejada.

Os críticos dizem que legisladores e defensores do consentimento afirmativo estão tentando traçar uma linha clara em uma zona basicamente cinzenta, particularmente para crianças e jovens adultos que estão lidando com seus primeiros sentimentos de atração romântica. Nos casos de abuso sexual “ele disse, ela disse”, os críticos do consentimento afirmativo dizem que a política impõe de forma injusta o ônus da prova ao acusado.

“Ainda não há um padrão claro ––o que temos é muita ambiguidade sobre como esses padrões realmente funcionam na Justiça”, disse John F. Banzhaf, um professor de Direito da Universidade George Washington. “O padrão não é lógico –ninguém realmente funciona dessa forma. O problema em ensinar isso a alunos colegiais é que você apenas vai semear mais confusão. Eles recebem mensagem confusas, dependendo de para onde forem depois.”

Mas Zaloom, que ensina sobre sexo para alunos colegiais há duas décadas, disse ser grata pelo novo padrão, mesmo ao reconhecer o desconforto dos estudantes.

“O que é realmente importante é saber que sexo nem sempre é algo que transcorre suavemente”, ela disse aos alunos da 10ª série. “Pode ser desajeitado, e isso é na verdade normal e mostra que as coisas estão OK.”

Os estudantes não pareciam convencidos. Eles se sentaram em grupos para debater formas de pedir pelo consentimento afirmativo. Eles riscaram uma lista de opções: “Posso tocar você aí?” Clínico demais. “Você quer fazer isso?” Hesitante demais. “Você gosta disso?” Não direto o bastante. “Tudo isso é realmente desajeitado e bizarro”, disse uma garota.

“Vocês chegaram a uma forma própria?” perguntou Zaloom.

Um garoto apresentou sua opção: “Tudo bem para você?”

Isso provocou aprovação quase unânime.

Segundo a nova lei, os estudantes do ensino médio na Califórnia devem ser educados sobre o conceito do consentimento afirmativo –mas não lhes é exigido de fato que mantenham esse padrão. Assim, um estudante colegial sendo julgado por acusações de estupro não teria que provar que ele ou ela obteve consentimento verbal do acusador. Esse foi o caso de um aluno do último ano da Saint Paul’s School, em New Hampshire neste ano, que foi acusado de estuprar uma aluna mais nova. Ele foi absolvido de estupro, mas considerado culpado de ter praticado sexo com menor.

Quanto aos estudantes universitários, a lei aprovada no ano passado na Califórnia não muda a forma como os casos de abuso sexual são processados na Justiça criminal, apenas a forma como são tratados nas faculdades, que são autorizadas a usar o consentimento afirmativo como padrão.

Mas entre os adolescentes, que estão apenas começando a experimentar com sua sexualidade e têm ideias nebulosas sobre seus próprios limites, a conversa tende a ser sobre “ficar” e quais são as novas regras.

Zaloom costuma usar essas perguntas como uma forma de iniciar a conversa sobre os benefícios dos parceiros sexuais conhecerem um ao outro. Mas às vezes não há respostas diretas, ela disse.

“Estamos tentando mostrar a eles muito explicitamente que sexo precisa incluir diálogo”, ela acrescentou, “que temos que conversar a respeito a cada passo do caminho”.

“Como começamos uma conversa como essa?” perguntou um garoto. “Com prática”, respondeu Zaloom.