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Convencer jovem a trocar shopping por museu não é tarefa simples

Especial para o UOL

23/06/2014 06h00

Em 2011, fui convidado a dirigir o Museu da Imagem e do Som (MIS-SP) pelo Conselho de Administração da Organização Social que dirige a instituição. O desafio que me propuseram foi de ampliar o escopo de atuação do museu, trazendo mais público e repercussão de suas atividades.

Naquele momento, o museu tinha pouco público, presença quase inexistente na mídia e não havia organizado uma programação para os próximos meses. Diante dessa situação, pela qual muitos museus infelizmente passam hoje, decidi criar programas regulares, buscando abranger diversas áreas e promover a formação de público.

Surgiam assim, já no segundo semestre de 2011, programas mensais como o Cinematographo (cinema mudo com música ao vivo), Estéreo MIS (uma oportunidade para bandas e artistas independentes), Maratona Infantil (diversas atividades destinadas a crianças, com o objetivo de estimular este público a frequentar museus desde cedo) e o Cine MIS, um espaço para a estreia de filmes em diversos formatos e durações, que não encontram espaço no circuito comercial.

Na falta de uma exposição programada, decidimos usar nosso rico acervo, que conta com mais de 200 mil itens, e organizar uma grande mostra explorando toda a diversidade de materiais: fotografia, vídeos, filmes, equipamentos, design, depoimentos. Foi uma excelente oportunidade para conhecer melhor o acervo e mostrá-lo ao público.

Enquanto isso, procurava uma exposição que pudesse trazer um público novo ao MIS. E encontrei esta oportunidade na Game On, um passeio pela história do videogame. A exposição, inédita no Brasil e concebida no Reino Unido pelo Barbican Centre, abriu em outubro de 2011, e tornou-se rapidamente um grande sucesso de púbico e mídia.

Pela primeira vez um museu no Brasil abrigava essa tecnologia como nova forma de arte, conquistando um público variado, amplo e novo. Fizemos uma pesquisa por amostragem à época e mais de 70% dos visitantes nunca tinham vindo ao MIS.

Enquanto acertava a vinda da Game On, visitei museus e galerias em diversos países, avaliando outras possíveis exposições. Esses contatos abriram portas e o resultado começou a frutificar logo em 2012. Foram mais de 15 exposições naquele ano.

O primeiro destaque foi a criação do Maio da Fotografia no MIS, ideia com o objetivo de ocupar o Museu com diversas exposições, oferecendo um panorama amplo da fotografia. Tivemos Andy Warhol e Claudio Edinger. André Kertész e Ozualdo Candeias.

No segundo semestre, o grande sucesso: Georges Méliès, o Mágico do Cinema, uma mostrasobre o universo do cineasta e ilusionista francês, que deu início a uma importante parceria com a Cinemateca Francesa.

Em pouco mais de um ano, o MIS começava a se firmar como um local de exposições interessantes e com expografia original. Em paralelo, outros programas fixos foram criados, como o Dança no MIS e a Nova Fotografia.

Trouxemos para o museu o maior número de manifestações artísticas que dialogavam com a imagem e o som. Apresentamos espetáculos de artes cênicas dentro de espaços expositivos, mostras de filmes, shows musicais, óperas no auditório, cursos na área audiovisual.

Arrisco dizer que o MIS é o único museu do país e ter um programa de dança contemporânea regular.

Em 2013, o MIS alcançou seu maior público: 260 mil pessoas. Parte significativa desses visitantes prestigiou a nossa primeira megaexposição, Stanley Kubrick, que apresentou uma expografia original e totalmente diferente das outras nove cidades que já haviam recebido a exposição, trazendo para o museu não só os fãs do cineasta americano, mas também aquele que nunca tinha ouvido falar de Kubrick. 

O recorde de visitantes em 2013 supera em mais de quatro vezes o total de 2010 (61683), e apresenta o resultado direto da nossa estratégia em criar uma programação variada e regular que, aos poucos, conquistou um público cativo.

Ou seja, o cinéfilo que vinha para ver uma mostra de cinema, se deparava com um espetáculo de dança ou uma mostra sobre Giuseppe Verdi.

Essa multiplicidade de programas simultâneos com certeza foi uma das variantes responsáveis pelo que o MIS é hoje. Outra questão importante é a curadoria. O trabalho dedicado a aumentar o nosso público sempre esteve atrelado à premissa de fazer isso com qualidade, levando atrações que instigassem e apresentassem algo novo e diferente.

Levar milhões a um show de funk é fácil, não que isso seja ruim ou não tenha qualidade, mas há diversas opções na cidade. Oferecer a novidade é muito mais interessante.

É com orgulho que conto essa trajetória, afinal convencer um jovem a trocar uma visita ao shopping por uma ao museu não é tarefa simples. Porém, é um desafio que cada gestor cultural, seja ele de um tradicional museu ou de um pequeno centro cultural, procure soluções que possam atrair cada vez mais visitantes e levar vida para suas instituições.

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