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Candidatos não souberam controlar emoção de eleitores, nem conversar com eles

Especial para o UOL

05/11/2014 06h00

Grandes atores, atletas de esportes individuais, bailarinos, toureiros, cantores e humoristas especializados em “stand up comedy” têm uma característica em comum: fazem parte de um seleto grupo de cidadãos que tem a capacidade de exercer controle fino sobre as emoções de um grande número de pessoas reunidas em um lugar para testemunhar um único evento.

Costumo dizer aos profissionais das minhas equipes que grandes publicitários também têm de ter essa capacidade, particularmente quando forem apresentar campanhas, e não tenho dúvida de que isso é apenas o resultado do somatório de algum talento natural com muito treinamento cotidiano.

Lamentavelmente, poucos publicitários têm esse talento natural, e o que é pior, dos poucos que têm, muito poucos se dedicam a treiná-lo.

Outra atividade em que ter a capacidade de exercer controle fino sobre as emoções de um grande número de pessoas é fundamental é a política.

Eu, que nunca fiz e nem pretendo fazer campanhas políticas, como observador totalmente isento, mas bastante experiente, garanto que não encontrei a presença desse talento em nenhum dos candidatos das nossas últimas eleições.

O que falta a eles? Muita coisa, mas vou listar algumas delas.

Alguém que pretenda exercer controle fino sobre as emoções das pessoas numa sala de reuniões, num auditório, num teatro, num comício ou num debate televisivo tem de ter relaxamento físico completo. Passar a sensação de estar sempre relax e tranquilo, o que imprime segurança e verdade.

Tem de ter magnetismo físico. Não estou dizendo que, obrigatoriamente, tem de ser alguém bonito (se for, melhor), mas tem de ser alguém fisicamente atraente, marcante, inesquecível.

Tem de ter olhos que dominem o ambiente, capazes de enxergar tudo e todos, mas também capazes de passar a cada pessoa a sensação de que ela está sendo olhada com absoluta exclusividade.

Tem de ter voz dominante, clara, com as inflexões corretas que valorizem o sentido de cada uma das palavras. Importante que as palavras sejam as mais adequadas para exprimir cada pensamento, mas também as mais simples. No Brasil, falam-se três línguas: português, português errado e português difícil; quem pretende comunicar, encantar e seduzir não pode falar errado, nem difícil.

Tem de ter uma noção de timing perfeita, com mudanças de ritmo e pausas adequadas, e capacidade até de dar uma certa musicalidade ao discurso.

Tem de ter uma coisa intraduzível que em hebraico foi batizada de "chutzpah", algo como uma combinação de nervos frios com um certo atrevimento, numa medida que passe absoluta superioridade.

E tem de ter a capacidade de comunicar um sentimento de urgência, de algo que deve e precisa ser feito imediatamente.

Para fazer esses comentários, me inspirei relendo o jornalista inglês Kenneth Tynan, autor de grandes perfis de “cerebridades” (celebridades com cérebro) em publicações como as revistas The Observer, New Yorker, Harper’s Bazaar e Playboy, escritor de frases antológicas, como a famosíssima “o que um homem vê bêbado nas outras mulheres vê sóbrio em Greta Garbo” e um dos maiores críticos de teatro de todos os tempos, a ponto de ter se transformado no diretor artístico do National Theatre, em Londres.

Relendo Kenneth Tynan, me lembrei de como eram canastrões os atores do nosso teatro político mais recente. Talvez isso explique um pouco os mais de 20% de abstenções no segundo turno das últimas eleições.

 

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