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Terceirização blinda patrimônio de empresas e precariza trabalho

Especial para o UOL

14/04/2015 06h00

Não vou repetir dados concretos de que a terceirização precariza as relações de trabalho e é responsável pelos maiores índices de acidente de trabalho no Brasil. Quero chamar a atenção do leitor sobre a posição dos agentes sociais que concentram o poder na sociedade brasileira: empresariado, governo, sindicatos e imprensa.

A partir disso, compreenderão tranquilamente porque essa barbárie será aprovada. Todos têm um ponto em comum: dinheiro. A grana convence os mais singelos puritanos.

Precarizar condições de trabalho representa aumentar margens de lucros dos empresários. Em um país com taxa de desemprego não muito alta (7,4% segundo última PNAD, do IBGE) e mão-de-obra desqualificada (por deficiência na educação), a baixa oferta encarece o mercado. Diminuir os direitos do trabalhadores é meio hábil a cumprir esse objetivo.

O governo reservou sua parte: incluiu no projeto de lei os recolhimentos tributários diretamente pela empresa contratante. Ninguém suporia que, além do trabalhador, o governo quisesse receber diretamente das empresas prestadoras de serviços. Afinal, a maioria dessas empresas são fachadas sem qualquer lastro patrimonial.

Os trabalhadores –representados por um sistema sindical ditatorial criado pelo Estado Novo de Getúlio Vargas, que impõe um único representante por categoria (unicidade sindical) e contribuição sindical compulsórios –são reféns de uma partilha prevista na lei, que deixaria os royalties do petróleo com inveja.

Construíram um retalho inédito no direito brasileiro: o sindicato da atividade do trabalhador recebe as contribuições, mas o trabalhador não recebe os direitos negociados por esse sindicato (porque recebe o direito do sindicato terceirizado). É quase um estelionato: você paga, mas não recebe. Fácil entender, portanto, a divergência de centrais sindicais sobre o tema. Fosse à época em que o movimento organizado dos trabalhadores não era governo, nem sei o que ocorreria no Brasil.

A imprensa também está no páreo. Quem milita na Justiça do Trabalho sabe que, há tempos, são raros os empregados registrados no setor. O fenômeno da “pejotização” (neologismo de contratação por pessoas jurídicas abertas pelo próprio trabalhador) invadiu todos os meios de comunicações. A terceirização cai como uma luva para legalizar a precarização que há tempos praticam. Sabe-se de setores que nem querem publicar sobre esse assunto.

O resultado da malfadada lei será claro. Uma cadeia infindável de terceirizações (quarteirizações, quinteirizações etc.) desconhecida pelo trabalhador, para blindar o patrimônio da contratante, sob a conhecida alegação trazida na Justiça do Trabalho: “desconheço o trabalhador e não tenho contrato com seu empregador”. O “João sem braço” manipula o ônus da prova para competir ao trabalhador provar sobre a prestação de serviços e a existência da cadeia de terceirização.

Sobrará, mais uma vez, a esperança do trabalhador brasileiro no Poder Judiciário, algo inconcebível em uma democracia moderna. No âmbito da Justiça do Trabalho, anotem aí: mesmo que tentem arrebentá-la pelo inevitável furacão de processos  que virá, estaremos prontos a cumprir nosso papel constitucional.

Haverá um dia em que veremos no Brasil: “Não quero dinheiro. Quero amor sincero. Isto é que eu espero”. Atualmente, só nos resta chamar o síndico, Tim Maia! Infelizmente, não se espera que ele esteja no Senado, ora formado por campanhas eleitorais financiadas por grandes empresas.

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