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Para alcançar desmatamento zero é preciso garantir economia florestal

Especial para o UOL

04/07/2015 06h00

Nesta semana, nos Estados Unidos, a presidente Dilma Rousseff anunciou a meta de reduzir a zero o desmatamento ilegal no Brasil até 2030. Legal, mas nem tanto. Afinal, comprometer-se com aquilo que está na lei nada mais do que obrigação. E, depois, essa é uma meta que já deveria estar sendo cumprida em 2015.

Mas, para que isso aconteça, antes de mais nada, é preciso valorizar a floresta em pé. E, infelizmente, não é de hoje, a economia florestal no país recebe pouca ou nenhuma atenção dos governantes. E não estamos falando apenas de Amazônia.

Segundo dados da pesquisa Indicadores de Desenvolvimento Sustentável (IDS), divulgada em junho deste ano, pelo menos 15% da Amazônia Legal já foi desmatado. O Cerrado é o segundo bioma brasileiro que mais perdeu área – pelo menos um milhão de quilômetros quadrados a menos que sua área original.

O que resta de Mata Atlântica não chega nem a 13% do que já foi um dia. Chegar ao desmatamento zero, portanto, não é tarefa fácil. Até porque ele não está relacionado “apenas” a desligar as motosserras, mas principalmente a abrir caminhos para o uso inteligente e responsável das florestas.

A Avaliação Nacional de Risco feita pelo FSC (Conselho de Manejo Florestal), divulgada no começo deste ano, identificou que todos os Estados possuem leis que regem a atividade de extração de madeira nativa, bem como uma estrutura de fiscalização para prevenir a ocorrência de retirada ilegal. Entretanto, também foram identificadas muitas evidências de deficiências no sistema de fiscalização para garantir a prevenção de extrações de madeira nativa – o que denota alto risco de desmatamento e exploração ilegal, principalmente na região Norte do Brasil.

Atualmente, o desmatamento ilegal tem mudado sua configuração e tem ocorrido em áreas menores, o que torna cada vez mais difícil detectá-lo via monitoramento por imagens de satélite. Segundo o INPE (Instituo Nacional de Pesquisas Espaciais), estima-se que somente 40% do desmatamento total que ocorre na Amazônia é detectado. Fora dos limites da Amazônia Legal, dados do Ibama demonstraram que a aplicação da lei quanto à comercialização e até extração de madeira nativa ocorre, mas ainda de maneira insuficiente para garantir a coibição da comercialização dessa madeira em vários lugares.  Tais evidências mostram que em se falando de madeira nativa há um risco altíssimo (senão uma certeza) de ocorrência de madeira ilegal no mercado consumidor.

 Hoje, no Brasil, o marco legal é avançado (mesmo que já tenha sido melhor), porém pouco cumprido e/ou fiscalizado. Quem quer fazer as coisas legalmente, seguindo a legislação a rigor – e, em muitos casos, indo além por questões ideológicas – não consegue competir com aqueles que ficam nas sombras, atuando totalmente na ilegalidade.

É por isso que a madeira certificada, com comprovação de origem, é mais cara do que a ilegal. Ela internaliza custos sociais e ambientais que todo processo produtivo deveria computar. Mas, na medida em que alguns não o fazem, devolvem à sociedade impactos e problemas como exploração social e degradação ambiental, que serão pagos indiretamente por nós.

O mercado nem sempre pode se autorregular. O governo precisa ajudar a equilibrar as coisas, com mecanismos diversos que vão do fortalecimento da fiscalização à adoção de critérios de sustentabilidade na compra de produtos florestais, passando por outras possibilidades como isenções fiscais.

Outro estudo recente do FSC, que entrevistou mais de nove mil pessoas em 11 países, incluindo o Brasil, revela que boa parte da população já percebeu que economia e meio ambiente andam juntos - e não dá mais para ficar de braços cruzados. Além disso, a maioria das pessoas (80%) acredita que as empresas são responsáveis por solucionar questões ambientais, e muita gente (42%) acredita que o governo deve cuidar desse problema. Essa percepção, de que não há só um culpado ou um salvador, é muito interessante. E faz todo sentido.

De fato, não há outra saída que não uma articulação entre todos envolvidos para que uma solução seja encontrada. Não adianta o consumidor se tornar mais consciente e exigir produtos mais sustentáveis se as empresas não conseguem competir no mercado dessa forma. Hoje em dia, há ótimos exemplos de manejo responsável nas florestas brasileiras. Mas em todos os casos, a grande motivação é pessoal e ideológica, e não econômica. E, infelizmente, esses são a minoria. Para que, de fato, o desmatamento chegue à zero, mais do que prometer, o governo (e toda a sociedade) precisam mudar.

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