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Após chamar impeachment de "golpe", Morales faz visita de Estado a Temer

Cerimônia oficial de chegada do presidente da Bolívia, Evo Morales, no Palácio do Planalto, com a presença do presidente Michel Temer - Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo
Cerimônia oficial de chegada do presidente da Bolívia, Evo Morales, no Palácio do Planalto, com a presença do presidente Michel Temer Imagem: Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

05/12/2017 13h19Atualizada em 05/12/2017 14h35

Mesmo já tendo chamado o impeachment da ex-presidente da República Dilma Rousseff (PT) de "golpe parlamentar", o presidente da Bolívia, Evo Morales, realizou visita de Estado a Michel Temer (PMDB) nesta terça-feira (5) no Palácio do Planalto, em Brasília.

Em 30 de agosto do ano passado, um dia antes de o impeachment ser aprovado no Senado, Morales escreveu nas redes sociais que “se prospera um golpe parlamentar contra o governo democrático de Dilma", a quem costumava chamar de “irmã”, e que a Bolívia "defende a paz e a democracia”.

Ele disse ainda, na época, que retiraria o embaixador do país no Brasil, José Kinn, se o impeachment se concretizasse – a atitude é vista como um passo ao rompimento entre nações na linguagem diplomática. Temer assumiu a Presidência, mas a ameaça não se concretizou.

Morales chegou ao Planalto com atraso, por volta das 11h25, e foi recebido por Temer no alto da rampa do prédio. Ambos ouviram os hinos brasileiros e bolivianos e foram apresentados às respectivas comitivas. Depois dos cortejos, seguiram para reuniões fechadas e almoço no Palácio Itamaraty, sede do Ministério das Relações Exteriores na capital federal.

A visita de Morales ao Brasil teve de ser adiada por duas vezes nos últimos meses devido a problemas de saúde de Temer.

Em discurso de brinde no Itamaraty, Temer afirmou que os países compartilham não apenas uma fronteira extensa, mas também “fortes vínculos históricos e humanos”. Segundo o presidente brasileiro, a parceria entre Brasil e Bolívia é de longo prazo baseada na amizade entre os povos e interesses comuns. “O diálogo e o respeito mútuo trazem sempre resultados muito positivos”, falou.

Temer citou os acordos firmados, mas não se estendeu neles. No discurso, o presidente aproveitou para ressaltar a reforma da Previdência proposta pelo Planalto. O governo realiza uma força-tarefa para angariar apoio de parlamentares e aprovar a matéria em dois turnos no plenário da Câmara antes do recesso de final de ano.

De acordo com Temer, os que se opõem à reforma previdenciária fazem um “terrorismo inadequado porque a essência é combater privilégios” e “em favor dos mais pobres”.

Por sua vez, Morales falou que a “Bolívia necessita do Brasil” e visa a recuperação econômica e a industrialização do país. Ele também citou a necessidade de se construir o trem que partiria do Brasil e cortaria a Bolívia até chegar ao oceano Pacífico. O país vizinho não tem ligação com o mar e pleiteia um caminho ao Pacífico. No entanto, o memorando de entendimento firmado nesta terça ainda não tem valor legal de compromisso final.

“Gostaria de parabenizar o Brasil pelo seu desenvolvimento industrial e [..] de afirmar que a Bolívia precisa do Brasil. [...] Estamos entrando na etapa de industrialização pela primeira vez na história da Bolívia, e vocês como irmãos sabem da nossa história”, declarou.

Apesar das críticas já feitas a Temer, Morales amenizou quaisquer rusgas ao governo brasileiro atual e agradeceu a “hospitalidade” em Brasília.

Acordos assinados

No encontro bilateral, Temer e Morales assinaram ato para cooperação policial para a prevenção de e combate ao crime organizado transnacional e memorando de entendimento para corredor ferroviário bioceânico de integração.

O primeiro tem como objetivo fortalecer a prevenção de crimes e coibir o terrorismo, tráfico de pessoas, entorpecentes e de armas de fogo; roubo de veículos; lavagem de dinheiro; crimes cibernéticos e delitos comuns de fronteira. Já o segundo busca melhorar o tráfego ferroviário entre Brasil e Bolívia, especialmente para o escoamento de produtos para exportação.

A visita de Estado é a de graduação mais alta nas relações diplomáticas entre dois países.

Oposição chama Morales de “golpista”

No final de novembro, o Tribunal Constitucional Plurinacional da Bolívia permitiu que Morales concorra ao quarto mandato presidencial na eleição prevista para 2019 no país. Assim, se vencer, ele poderá acumular 19 anos no poder.
 
No primeiro semestre de 2016, a Bolívia promoveu plebiscito sobre mudanças na Constituição e a subsequente possibilidade de reeleição de Morales. Quaisquer alterações foram rejeitadas pela população.
 
Embora tenha chamado o impeachment no Brasil de “golpe”, agora é Morales quem é chamado de “golpista”. Políticos da oposição criticam as supostas tentativas dele em continuar no poder e falam, inclusive, em “instauração de ditadura”.

Também no final do mês passado, Morales elogiou o ditador da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema, ao condecorá-lo em La Paz e pediu que este compartilhasse a experiência de vencer todas as eleições com mais de 90% de aprovação.

Embora a Guiné Equatorial tenha um dos piores IDHs (Índice de Desenvolvimento Humano), Obiang Nguema é um dos mandatários mais ricos do mundo e está na Presidência do país africano desde 1979. Segundo a oposição ao governante, as eleições são fraudadas e não podem ser consideradas legítimas.
 
Além de acusações de fraudes eleitorais e corrupção, Obiang Nguema também conta até com acusações de praticar atos de canibalismo contra inimigos.