Colorir o aparelho com itens comprados na web é perigoso, alertam dentistas
Uma nova moda vem preocupando os dentistas: o uso, pelos pacientes, de borrachinhas ortodônticas coloridas para aparelhos dentários sem nenhum acompanhamento. E pior: compradas em sites da internet junto com outros produtos voltados para quem usa aparelho. O resultado da “brincadeira” pode ir da perda de dente até o surgimento de doenças.
O aparelho dentário convencional é feito em aço inoxidável graças a sua biocompatibilidade e resistência. Ele é fixado nos dentes com substâncias adesivas adequadas e composto por bandas (em volta de um ou a vários dentes, utilizadas como âncora para o aparelho), fios, elásticos e brakets (peça colada ao dente).
Num tratamento normal, o paciente visita o ortodontista uma vez ao mês para que o aparelho seja “apertado”, pois, por meio disso, os dentes gradualmente vão para a posição correta.
Os adeptos da novidade, no entanto, além de não procurarem o profissional para a manutenção, compram as peças pela internet, colocam-nas nos dentes sozinhos em casa e fazem as trocas de fios e elásticos sem terem nenhum preparo para isso.
Trocas
José Luis Bretos, professor e coordenador dos cursos de pós-graduação do NEO (Núcleo de Estudos Odontológicos) e doutor em ciência e saúde da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) explica que todas as vezes que as ligaduras são trocadas é promovida a aplicação de força nos dentes, que, entre outras variáveis, é o que vai provocar a movimentação dos mesmos para a devida correção.
Porém, para que este movimento aconteça, é necessário ocorrer a remodelação da estrutura de suporte, ou seja, do tecido ósseo e gengival. Estes sofrem uma série de modificações para que o dente se movimente. O controle de todo esse processo só pode ser feito pelo especialista para que tudo aconteça dentro do tempo certo e nas condições adequadas.
Assim, trocas frequentes de elásticos significam aplicação de força constante, o que poderá acarretar desde a perda da estrutura de suporte (osso e gengiva) até a perda dos dentes nos locais em que esses elásticos estão apoiados. Somente o especialista está capacitado a reconhecer o momento certo de trocar as ligaduras e qual força deve ser empregada para cada caso.
“Pior ainda é o que pode acontecer com a troca também dos fios ortodônticos: para cada fase do tratamento é recomendado um tipo de liga metálica, com distintas propriedades mecânicas, e só o ortodontista tem a capacidade de, com seu conhecimento embasado principalmente em evidências científicas, determinar qual a liga metálica indicada à fase de tratamento em que o paciente se encontra e suas individualidades”, afirma Bretos.
Biossegurança
Outro ponto importante é a qualidade e origem dos produtos comercializados na internet. Os usados em consultório são regulamentados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). “Pessoas estão comprando esses itens pela internet, até em rede sociais, ou seja, sem controle nenhum”, ressalva Bretos, acrescentando: “É importante uma investigação da citotoxicidade (propriedade de uma substância de ser tóxica) desses itens, para se obter informações das suas potencialidades irritantes, pois estarão sendo usados dentro da cavidade oral”.
Bretos também lembra que o fio ortodôntico pode até oxidar e os elásticos, se liberarem substâncias tóxicas, podem causar irritação e provocar sangramento gengival. A longo prazo, por efeito cumulativo, podem até causar alterações sistêmicas que podem provocar doenças.
Crosp
Marco Antonio Manfredini, conselheiro e secretário geral do Crosp (Conselho Regional de Odontologia de São Paulo) conta que o órgão foi alertado sobre a venda dos produtos na internet pelos próprios usuários e que isso gerou uma denúncia à Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
“Anunciamos o que acontece à Anvisa, que é o órgão regulador que pode proibir este comércio, porém, nossa intenção é mesmo orientar, pois é uma questão de saúde bucal da população. Pessoas veem e compram porque acham bonito, sem saber que aquilo pode fazer muito mal à sua saúde!”, diz.
E, como o colega, alerta que este comportamento pode acarretar sérios danos, desde problemas de natureza gengival até perda óssea: “Se a pessoa usar estes produtos por meses, pode estar fazendo força num elemento dentário e isso pode começar um processo de reabsorção óssea que pode chegar até a perda total do dente”.
Manfredini diz que não é contra o uso de elásticos coloridos, por exemplo, desde que sejam colocados no consultório e seu uso seja supervisionado.
Anvisa
Procurada pela reportagem do UOL, a assessoria de imprensa da Anvisa declarou: “Recebemos o documento do Crosp em 28/06/2013. Informamos que a legislação sanitária brasileira já impõe algumas exigências para as empresas que trabalham com os produtos em tela, que vai desde a necessidade de obtenção de autorização de funcionamento e licença sanitária para as fabricantes ou importadoras destes produtos, até a exigência de registro/notificação de cada produto na Anvisa, mediante a comprovação de aspectos relacionados a segurança e eficácia dos mesmos, comprovados através de estudos específicos. O comércio ilegal é combatido por meio de fiscalização das Visas (Vigilâncias Sanitárias) locais. Se forem pegos [quem comercializa], podem responder judicialmente”.
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