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Infecção intestinal pode causar dano permanente e levar a doença mais grave

Mudança nas células leva a quadro de inflamação crônica - Divulgação/Agência Fapesp
Mudança nas células leva a quadro de inflamação crônica Imagem: Divulgação/Agência Fapesp

Da Agência Fapesp

25/08/2016 12h09

Uma simples infecção intestinal pode aumentar a chances de desenvolver problemas do coração, obesidade, diabetes, alergias alimentares e até de ter uma doença inflamatória mais séria no intestino. Essa é a conclusão de uma pesquisa desenvolvida no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP).

Em um experimento com camundongos, os pesquisadores detectaram que a infecção pode interferir no sistema imunológico, e consequentemente causar doenças metabólicas.

O grupo liderado por Denise Morais Fonseca, do ICB, e supervisionado por Yasmine Belkaid, do Instituto Nacional de Saúde (NIH, na sigla em inglês), dos Estados Unidos, infectou camundongos com a bactéria Yersinia pseudotuberculosis --que tanto em roedores como em humanos costuma causar um quadro de diarreia aguda e febre--, mas que é facilmente tratada.

"Experimentos com camundongos sugerem que a infecção pode deixar como sequela uma espécie de cicatriz imunológica, ou seja, uma alteração permanente nas vias de comunicação entre o intestino e o sistema imune. Agora estamos investigando como isso se relaciona com o desenvolvimento de doenças metabólicas", afirmou Fonseca à Agência Fapesp.

Dano permanente

Após acompanhar a recuperação dos camundongos por dois anos (o animal vive, em média, três anos), os pesquisadores concluíram que a infecção pode causar consequências permanentes no organismo dos roedores.

Duas semanas após serem infectados, todos os camundongos já haviam conseguido eliminar as bactérias de seu organismo. Porém, quase 80% deles passaram por um processo de remodelamento do mesentério, a camada de tecido conjuntivo que prende as alças intestinais à parede interna da cavidade abdominal.

No interior do mesentério, há uma série de estruturas do sistema imune. Essas estruturas ficam danificadas após a infecção e não voltam ao normal sem algum tipo de intervenção. Fonseca descobriu isso ao perceber que nos linfonodos dos camundongos estava faltando uma população específica de células responsáveis por apresentar antígenos.

Diabetes e obesidade

Testes mostraram que, como consequência, o sistema imunológico parecia perder a capacidade de distinguir entre antígenos benignos e ameaças reais. As reações inflamatórias no intestino se tornavam mais exacerbadas.

Além disso, o tecido adiposo mesentérico dos animais passou a apresentar um quadro de inflamação crônica, que pode levar ao desenvolvimento de diabetes, resistência à insulina e obesidade.

"E os camundongos, de fato, tornaram-se obesos e resistentes à insulina”, relatou Fonseca.

Não é regra

Em outra série de experimentos, um grupo de camundongos foi infectado com Toxoplasma gondii, o protozoário causador de toxoplasmose, e outro com bactérias do gênero Citrobacter, causadoras, por exemplo, de infecção intestinal.

No primeiro caso, foi observado o mesmo tipo de cicatriz imunológica. Já no segundo grupo a infecção parece não ter deixado sequelas.

"Aparentemente, não são todos os patógenos que induzem esse tipo de remodelamento. E também esse processo não ocorre em todos os indivíduos acometidos por infecção gastrointestinal. Ainda não entendemos quais são os fatores determinantes e é algo que pretendemos investigar", disse Fonseca.

O grupo também pretende encontrar biomarcadores que permitam detectar precocemente o surgimento da cicatriz imunológica.