Morre Ariel Sharon, o 'trator' da política israelense
O ex-primeiro-ministro de Israel Ariel Sharon, que estava em coma há oito anos, morreu aos 85 anos neste sábado no centro médico de Sheba, nos arredores de Tel Aviv.
O político israelense permanecia em estado vegetativo em 2006, quando teve um derrame. Sua saúde havia voltado a se deteriorar no final de 2013.
Apelidado de "trator", Sharon era uma das mais conhecidas e polêmicas figuras da política do Oriente Médio. Com passado militar, ele fora eleito primeiro-ministro em 2001, se beneficiando de sua fama de linha dura.
Durante os anos em que ocupou o cargo de premiê, Sharon foi um dos grandes promotores da expansão de assentamentos israelenses nos territórios palestinos ocupados. Ele também iniciou a construção do polêmico muro da Cisjordânia.
Segundo o correspondente da BBC no Oriente Médio Kevin Connolly, muitos israelenses admiravam seu histórico militar, embora - tanto como estadista quanto como soldado - Sharon tenha sido frequentemente controverso.
Muitos no mundo árabe odiavam o ex-primeiro-ministro por associá-lo ao massacre de dezenas de palestinos no campo de refugiados de Sabra e Chatila, no Líbano, em 1982.
Sua reputação como um defensor incondicional dos interesses de Israel lhe deu autoridade para tomar decisões difíceis quando era premiê. Em 2005, por exemplo, ele determinou a retirada das forças israelenses de Gaza.
Ele foi um dos últimos líderes da geração dos que fundaram o Estado de Israel, em 1948, e muitos no país acompanharam a sua saída da vida pública e a deterioração de sua saúde nos últimos anos com grande tristeza.
Soldado
O ex-primeiro-ministro nasceu na Palestina, em 1928, quando a região ainda estava sob domínio britânico.
Quando jovem, ele se juntou à organização clandestina judaica Haganah e lutou na guerra árabe-israelense entre 1948 e 1949, logo depois da criação de Israel.
Na década de 1950, Sharon liderou uma série de operações militares com resultados trágicos. Uma delas, em que 50 casas do vilarejo de Qibya foram explodidas, resultou em 69 mortes.
Sharon chegou à patente de general de brigada e comandou uma divisão durante a Guerra dos Seis Dias, em junho de 1967, na qual Israel conseguiu ocupar o leste de Jerusalém, a Cisjordânia e a Faixa de Gaza.
As medidas duras de ocupação que Sharon implantou nestes territórios deram a muitos palestinos a primeira ideia de como agia o homem que seria visto por eles como o grande inimigo.
O primeiro contato do militar com a política ocorreu em 1973, quando ele foi eleito para o Knesset, o Parlamento de Israel. Mas Sharon renunciou um ano depois, para se transformar no assessor de segurança do então primeiro-ministro Yitzhak Rabin.
Em 1977 ele foi reeleito para o Parlamento.
Invasão desastrosa
Na época em que ocupou o cargo de ministro da Defesa, em 1982, ele arquitetou a desastrosa invasão ao Líbano.
Sem falar explicitamente ao então primeiro-ministro, Menachem Begin, ele enviou os soldados israelenses para Beirute em um ataque que resultou na expulsão da Organização para Libertação da Palestina (OLP), de Yasser Arafat, do território libanês.
Até então, a OLP tinha no Líbano uma base para expansão da organização, onde concentrava operações e organizava a luta armada contra Israel.
Após dois meses, 14 mil membros da OLP, além de militantes sírios, haviam deixado a capital libanesa. Mas dezenas de milhares de palestinos permaneceram, reunidos em grandes campos de refugiados como o de Sabra e Shatila.
Quebrando uma promessa que tinha feito aos americanos, Sharon enviou suas tropas ao oeste de Beirute, alegando que dois mil militantes da OLP ainda estavam escondidos nos campos.
Para evitar baixas nas forças israelenses, ele ordenou que milicianos cristãos libaneses invadissem Sabra e Chatila (sob o controle de Israel).
Da parte do milicianos cristãos, o ataque foi uma retaliação ao assassinato do presidente cristão Bachir Gemayel, dois dias antes, que considerava os refugiados palestinos "população excedente".
Até hoje não se sabe ao certo quantos morreram - acredita-se que o número possa ter chegado a 3,5 mil.
Em 1983, Sharon foi afastado do Ministério da Defesa por um tribunal israelense que investigou a invasão do Líbano e determinou que ele era indiretamente responsável pelas mortes nos campos de refugiados.
Sharon argumentou que não era possível prever os desdobramentos sangrentos da entrada das milícias nos campos de refugiados.
A volta
Para a maioria dos políticos, uma condenação como essa significaria o fim da carreira. Mas Sharon continuou sendo uma figura popular na direita israelense, e outra oportunidade surgiu para ele.
Como ministro da Habitação, no início dos anos 1990, ele liderou o grande aumento dos assentamentos judeus na Cisjordânia e Faixa de Gaza, o maior desde a ocupação em 1967.
Depois de a coalizão de centro-direita de Binyamin Netanyahu chegar ao poder em 1996, o novo primeiro-ministro israelense não aguentou a pressão e incluiu o ex-general em seu gabinete de governo.
Em 1998 ele foi designado o novo ministro do Exterior, com elogios de Netanyahu.
Com a vitória de Ehud Barak, do Partido Trabalhista, que assumiu o governo em 1999, Sharon tornou-se líder do Likud, conservador e de oposição a Barak.
Posteriormente, o filho de Sharon, Omri, foi considerado culpado de falso testemunho e falsificação de documentos depois de um inquérito de corrupção que investigou a campanha de Sharon para liderar o Likud.
Sharon sempre negou envolvimento e nunca foi formalmente acusado.
Segunda intifada
Ainda como líder do Likud, Sharon fez uma visita polêmica em setembro de 2000 à Esplanada das Mesquitas, em Jerusalém. O local é considerado sagrado tanto para muçulmanos como para os judeus, que o chamam de Monte do Templo.
A visita, interpretada pelos palestinos como uma provocação, é considerada como um dos acontecimentos que desencadearam a segunda intifada (ou revolta) palestina.
Críticos afirmam que Sharon sabia que a visita iria iniciar uma onda de violência e apostou que o público israelense iria apoiar um líder duro como ele, que saberia enfrentar a questão com firmeza.
E Sharon acertou. No dia 6 de fevereiro de 2001 ele conseguiu uma vitória esmagadora nas eleições, tornando-se primeiro-ministro com a promessa de conseguir "segurança e paz verdadeira". Ele ainda insistiu que não estava comprometido com as negociações anteriores com os palestinos.
O ex-presidente americano George W. Bush afirmou que Sharon era "um homem de paz", mas os anos em que o político israelense liderou o país foram marcados pelo recuo nas negociações com os palestinos.
O muro
Depois de uma série de ataques suicidas de militantes palestinos em Israel, que começaram nos anos 1990 e se estenderam pela primeira década do século 21, Sharon iniciou o projeto de construção do muro da Cisjordânia, alegando que a barreira aumentaria a segurança de Israel.
No entanto, ele determinou a retirada israelense da Faixa de Gaza e o desmantelamento de quatro assentamentos na região norte da Cisjordânia, para tentar enfrentar a crescente hostilidade dos israelenses ao seu governo.
Depois destas medidas, Sharon descartou outras retiradas unilaterais.
Em meio à crescente dissidência dentro do Likud devido à retirada da Faixa de Gaza, Ariel Sharon saiu do partido em 2005, e, junto com outros aliados, fundou o Kadima.
Em dezembro de 2005, ele sofreu um leve derrame, seguido de um mais agudo, no ano seguinte, que o deixou em estado vegetativo. Ele foi substituído no governo por seu vice, Ehud Olmert.
Ao lançar seu partido, Sharon convenceu diversas figuras centristas a deixarem os partidos Trabalhista e Likud e se unirem ao Kadima. Hoje, porém, a agremiação não tem um substituto à altura de Sharon - e possui apenas duas cadeiras no Parlamento israelense.
Sua saúde se deteriorou em 1º de janeiro, quando, segundo a imprensa israelense, ele teve falência renal.
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