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Ser crucificado vira forma extrema de reivindicar direitos trabalhistas no Paraguai

Um dos 23 motoristas de ônibus do Paraguai que protestam crucificados contra demissões em Assunção - EFE Andrés Cristaldo Benítez
Um dos 23 motoristas de ônibus do Paraguai que protestam crucificados contra demissões em Assunção Imagem: EFE Andrés Cristaldo Benítez

María Sanz

Em Assunção

06/08/2015 17h33

Ser crucificado se tornou uma modalidade extrema de protesto por direitos trabalhistas no Paraguai, onde 25 trabalhadores de diferentes setores já estão há mais de um mês cravados em pedaços de madeira na Grande Assunção, como forma de apresentar suas reivindicações ao governo.

No centro da capital, em uma barraca de plástico instalada na calçada na porta do Ministério do Trabalho, 11 pessoas estão presas individualmente com pregos de mais de um palmo de comprimento em suas mãos. Ao lado deles, outras quatro pessoas protestam com as bocas tapadas por grossos pregos curvos, que lhes rasgam os lábios e impedem de falar e comer alimentos sólidos.

A maioria é motorista de uma empresa de ônibus que há 37 dias demitiu 51 trabalhadores, quando eles notificaram à diretoria que tinham criado um sindicato. A eles se somam outros sete trabalhadores que permanecem crucificados a 15 quilômetros, em um ponto de ônibus entre as cidades de Limpio e Luque, onde se originou o protesto.

Os companheiros dos crucificados na porta do Ministério do Trabalho se empenham em atender suas necessidades, dando comida e, às vezes, até cigarros. Eles também pedem dinheiro aos veículos que passam, já que os motoristas em protesto estão há mais de um mês sem receber o salário.

A dor provocada pelos braços permanentemente esticados durante tantos dias, o risco de infecção nos ferimentos, as dificuldades para se limpar e o intenso calor que, em pleno inverno, tem temperaturas acima dos 30 graus em Assunção não são obstáculos para que eles tenham decidido "seguir até o final".

Miguel Garcete, um dos motoristas demitidos e agora crucificado, disse à Agência Efe que esse sacrifício é um passo a mais em sua luta para "exigir que o Ministério do Trabalho reconheça legalmente o sindicato e para que a empresa readmita os 51 despedidos".

O trabalhador é interrompido quando o padre franciscano Juan Carlos Ayala entra na tenda. Ele visita quase que diariamente os manifestantes, que pedem para ouvir trechos da Bíblia e recebem a hóstia, além de bênçãos.

"Tento dar ânimo com as bênçãos. Acredito que faz bem. Rezamos para que, em breve, seja possível chegar a um acordo que solucione este conflito", disse o religioso à Agência Efe.

O fervor religioso é uma das razões que levam os trabalhadores a optar pela crucificação como símbolo de protesto, uma escolha feita também por outro grupo de operários que está crucificado em Assunção: o dos ex-funcionários da Usina Hidrelétrica de Itaipu.

Neste caso são sete, seis deles ex-funcionários e Rosa Cáceres, a esposa de um deles. Dos seis, cinco se prenderam em 30 de junho pela segunda vez em seis meses. No final de janeiro, eles interromperam o protesto depois de mais de 50 dias crucificados e ao chegar a um acordo com o governo. Os outros dois aderiram em 7 de julho.

Eles permanecem em uma tenda na frente da embaixada do Brasil, país que compartilha a represa de Itaipu com o Paraguai, e exigem o pagamento de direitos trabalhistas retroativos por um convênio assinado entre os governos de ambos os países.

Além da dor física, os manifestantes sofrem com a distância de seus lugares de origem e suas famílias, já que muitos procedem de cidades próximas à usina, como Hernandarias e Ciudad del Este. Muitos deles são idosos e apresentam problemas de saúde, como lembrou à Efe Carlos González, representante da Coordenadoria de Ex-Trabalhadores de Itaipu e Contratistas.

Todos os crucificados da Grande Assunção dizem ter na fé católica uma de suas maiores fortalezas, e alguns intercalam gritos de palavras de ordem com orações. As preces são feitas na esperança de que o grito seja escutado não só por santos, mas também por governantes.