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O presidente do Irã é um lobo, cordeiro ou o quê?

Thomas L. Friedman

09/10/2013 00h01

Para quem gosta de uma boa metáfora, a visita do presidente iraniano Hassan Rohani à ONU foi uma festa para cordeiros e lobos. Rohani foi apelidado tanto de "lobo em pele de cordeiro" quanto de "cordeiro em pele de lobo", e o primeiro-ministro de Israel, Bibi Netanyahu, chamou o ex-presidente do Irã Mahmoud Ahmadinejad de "lobo em pele de lobo".

A questão importante, entretanto, não é quem Rohani é, mas que tipo de país o regime iraniano deseja ser no século 21 e que papel o poder nuclear exercerá na moldagem dessa identidade. Por esse ponto de vista, há apenas uma questão relevante: o Irã está contente em ser uma Coreia do Norte grande ou ele aspira a ser uma China persa?

A Coreia do Norte construiu um pequeno arsenal nuclear por dois motivos: proteger seu regime de ameaças externas e de ameaças internas. Isto é, a liderança da Coreia do Norte acredita que armas nucleares podem torná-la imune a uma mudança de regime imposta de fora e que o isolamento internacional que acompanhou o programa de armas nucleares norte-coreano mantém seu povo em uma dieta permanente de baixa caloria tanto alimentar quanto de informação. É uma estratégia astuta de sobrevivência para um regime maluco: uma mão de ferro nuclear mantém o mundo à distância por um lado e seu próprio povo isolado e fraco por outro –enquanto os líderes da Coreia do Norte desfrutam de alimentação farta e carros importados.

A liderança do Irã também vê uma arma nuclear como garantia potencial contra a mudança de regime imposta pelo exterior, e certamente alguns na liderança do Irã, como a Guarda Revolucionária, se beneficiam com as sanções em casa. Quanto mais isolado fica o Irã, menos concorrência econômica a Guarda tem para sua vasta rede de empreendimentos industriais, mais valiosos são seus portos de contrabando para furar as sanções e mais isolado fica o povo iraniano das tendências globais que produziram coisas como a Revolução Verde de 2009. Esses linhas-duras não desejam ver uma embaixada americana em Teerã.

Mas o Irã não é a Coreia do Norte. É uma grande civilização, com grande talento humano. Ele não pode manter seu povo isolado indefinidamente. Na teoria, o regime do Irã não precisa manter o mundo à distância e seu povo curvado para o Irã ser poderoso. Mas os líderes do Irã aceitam essa teoria? Alguns sim. A decisão de retomar as negociações é um sinal claro de que atores cruciais ali não acreditam que o status quo –sanções esmagadoras– continua viável para eles. Por não ser a Coreia do Norte, as sanções agora os estão ameaçando com descontentamento interno. Mas quanto da "garantia nuclear" eles estão dispostos a ceder para se libertarem das sanções? O país está pronto para sacrificar uma única arma poderosa para se tornar novamente um país poderoso –ser mais como a China, meio amigo, meio inimigo, meio parceiro comercial, meio rival geopolítico dos Estados Unidos, em vez de um oponente em tempo integral?

É isso o que temos que testar.

"Nós estamos há tanto tempo tentando usar uma dinâmica de controle para conter o Irã que perdemos de vista o que queremos de fato dos iranianos –especialmente das elites governantes–, que é mudarem seu comportamento", disse o coronel Mark Mykleby, um marine reformado e coautor de "A National Strategic Narrative" para o Estado-Maior das Forças Armadas. "Eu sou totalmente a favor de ser duro com eles e certamente não confio neles, mas também acredito que devemos lhes dar a opção de mudar o comportamento."

Nader Mousavizadeh, o iraniano-americano cofundador da Macro Advisory Partners e ex-assessor do secretário-geral da ONU Kofi Annan, acrescentou: "Se formos prudentes o bastante, estratégicos o bastante e suficientemente desiludidos de nossa capacidade de recriar os países a nossa imagem, então podemos começar a ver o Irã como a China potencial do Oriente Médio –com toda a promessa que detém e todos os desafios que conhecemos a partir do difícil caminho com a China desde a viagem de Nixon".

O processo de chegar até lá seria irregular e às vezes feio, mas, se feito de modo apropriado por parte do Irã e de nós, poderia levar à reintegração gradual do Irã na economia mundial, o empoderamento de sua classe média jovem e instruída, "e o surgimento de um Irã de múltiplos centros de poder, semelhante ao que ocorreu com o Partido Comunista em Pequim ao longo dos últimos 30 anos", notou Mousavizadeh. Não, isto não é ideal. "Em um mundo perfeito, nós veríamos uma transição mais veloz para uma sociedade genuinamente livre. Mas, se uma détente com o Ocidente puder negar ao regime [do Irã] a desculpa de inimigos estrangeiros e tramas estrangeiras, o Irã poderia ver um caminho para a legitimidade também por meio da reforma e da exploração do imenso potencial econômico, tecnológico e educacional do povo iraniano. Assim como a China."

Os líderes da China também não são escoteiros. Mas encontramos uma relação estável e mutuamente benéfica com Pequim como "frenemies" (iniamigos). Eu permaneço cético de que o regime do Irã possa gerar o consenso interno para passar por uma transição semelhante. Mas poucos achavam que a China também conseguiria. O secretário de Estado, John Kerry, mantém a atitude certa: nenhuma suspensão das sanções por nada menos que o fechamento hermético de qualquer militarização do programa nuclear do Irã. Esse é o único acordo que vale ser feito e a única forma do Irã decidir se é realmente uma China em pele persa –ou algo assim.