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Os celulares adulterados e ultrasseguros usados por traficantes mexicanos

16/03/2018 19h12

O fundador de uma empresa que criou telefones ultrasseguros usados por alguns dos maiores criminosos do mundo foi preso pelo FBI em uma operação para desmantelar um "serviço internacional de comunicações usado pelo crime", como define a nota da polícia federal americana.

O Departamento de Justiça prendeu Vincent Ramos no último dia 7 de março, na cidade de Bellingham, no Estado de Washington, junto com outras quatro pessoas ligadas à Phantom Secure, uma empresa de telefonia com sede no Canadá.

A companhia está em destaque por ter ganhado "dezenas de milhões de dólares" vendendo celulares BlackBerry modificados e personalizados para o Cartel de Sinaloa, de acordo com as autoridades.

Esta é a primeira vez que a agência do governo americano acusa uma empresa por fabricar tecnologia criptografada para uso de criminosos.

As acusações contra os membros da Phantom Secure incluem organização criminosa e conspiração para ajudar a venda de drogas. Ambos os crimes podem ter a pena máxima de prisão perpétua nos Estados Unidos.

"A Phantom Secure foi projetada para facilitar o tráfico de drogas em todo o mundo", disse o procurador federal americano Adam Braverman à BBC.

"Esses traficantes, incluindo membros do Cartel de Sinaloa, teriam usado esses dispositivos totalmente criptografados para promover suas atividades de tráfico de drogas e evitar a aplicação da lei".

Sem câmeras ou internet

As comunicações através dos telefones da Phantom Secure são gerenciadas automaticamente por meio de servidores no Panamá e em Hong Kong, de acordo com documentos oficiais, tornando os dados mais difíceis de rastrear.

A Phantom Secure também eliminava alguns elementos-chave e funcionalidades do telefone, como microfone, GPS, câmeras (frontal e traseira), acesso à internet e aplicativos de mensagens.

Ele também impossibilitava as ligações de voz e gravação de vídeo. Depois, instalava um software PGP, que permite criptografar cada um dos dados.

Dessa forma, o dispositivo servia apenas para enviar mensagens de texto, mas de forma criptografada e ultrassegura - mais do que um BlackBerry convencional.

"Outras organizações"

Nem a BlackBerry nem a Phantom Secure quiseram comentar o assunto quando foram procurados pela BBC. Os investigadores não explicaram se a BlackBerry colaborou na descoberta do caso. Mas Braveman diz que ela não é a única empresa cujos telefones são modificados e usados ??para fins ilegais.

"Sabemos que há organizações dedicadas a isso. Continuaremos investigando não só a Phantom Secure, mas qualquer outra empresa que forneça dispositivos de comunicação a organizações criminosas", disse ele à BBC.

O procurador acrescentou que, embora praticamente qualquer telefone inteligente disponível no mercado ofereça criptografia difícil de quebrar - além dos aplicativos do Facebook, Google e Apple - a Phantom Secure deve ser responsabilizada pela forma como os clientes utilizam seus aparelhos.

"A diferença é que esta empresa foi projetada especificamente para ajudar o tráfico internacional de drogas", diz Braveman.

"A única maneira de se obter um desses telefones é sendo indicado por outra pessoa".

Isso porque, para se tornar um cliente da empresa, é preciso que outro usuário responda por você, diz o procurador. Este sistema, de acordo com as autoridades, seria uma maneira de impedir que as forças policiais se aproximassem da Phantom.

A companhia se define em seu site como "o serviço de comunicações mais confiável do mundo".

Seus dispositivos são vendidos por assinatura e custam entre US$ 2 mil e US$ 3 mil por cerca de seis meses de uso.

Agentes americanos estimam que existem cerca de 20 mil celulares modificados pela Phantom Secure em circulação em todo o mundo.

As autoridades responsáveis ??por cumprir a lei ficaram frustradas diversas vezes com a forma como a tecnologia criptografada dificulta o acesso às comunicações entre suspeitos.

Em 2016, a Apple se recusou a fornecer uma ferramenta para permitir ao FBI desbloquear um telefone que pertencia a Syed Rizwan Farook, um homem acusado pelo tiroteio em massa em San Bernardino, na Califórnia, onde 14 pessoas morreram.

Em um comunicado, um porta-voz do FBI reiterou a preocupação da agência de que os criminosos podem "passar despercebidos" e se esconder atrás de tecnologias sofisticadas.

"Quando os criminosos se refugiam na escuridão e as forças da ordem não podem monitorar seus telefones ou acessaras provas, os crimes não podem ser resolvidos e isso pode resultar em vidas perdidas".

Em vez disso, os ativistas pela privacidade argumentam que eliminar ou simplesmente o enfraquecer a criptografia seria um risco para o roubo de dados e à vigilância, não só para criminosos, mas para todos.