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Jamil Chade

Bolsonaro será alvo de pressão internacional por pandemia

Perguntas serão entregues aos 47 membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU - Xinhua/Xu Jinquan
Perguntas serão entregues aos 47 membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU Imagem: Xinhua/Xu Jinquan

Colunista do UOL

29/06/2020 16h50

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O governo de Jair Bolsonaro será alvo de uma série de denúncias formais na ONU por sua resposta considerada como insuficiente diante da pandemia da covid-19. Um documento elaborado por entidades nacionais e internacionais será tratado nesta semana em Genebra, pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU, enquanto outras acusações serão submetidas ao longo dos próximos dias.

Além disso, o organismo vem coletando informação sobre a política brasileira em relação ao coronavírus, elevando a pressão sobre um governo com uma imagem externa já desgastada.

O debate sobre a pandemia estará no centro da agenda do Conselho nesta semana, com a alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michelle Bachelet, apresentando um informe sobre a situação internacional. Entidades como a Conectas e Comissão Arns prometem usar a ocasião para denunciar o Brasil.

Outra iniciativa está sendo liderada por entidades como Amazon Watch, Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Conectas Direitos Humanos, Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Fundação Luterana de Diaconia (FLD), Geledés - Instituto da Mulher Negra, Grupo Tortura Nunca Mais - Bahia, Ilê Omolu Oxum, Instituto Vladimir Herzog, Terra de Direitos e outras.

Para essas entidades, "o não desenvolvimento pelo poder público de ações integradas para contenção da pandemia" deve ser considerado como um violação aos direitos humanos. Segundo eles, tais negligências afetam em especial a população que mais necessita do apoio do Estado na oferta de serviços essenciais e auxílios emergenciais.

Entre os aspectos destacados pelo grupo está o que chamam de "elementos do fundamentalismo religioso" que defendem uma "única verdade religiosa, a negação da ciência, menosprezo das mortes de Covid-19 e a pressão para classificar as igrejas como uma atividade essencial".

"De acordo com uma política ideológica de extrema-direita, a organização de uma "liturgia da morte" cria impedimentos para que os grupos vulneráveis tenham acesso à renda básica de emergência", alertam.

Um dos pontos da denúncia se refere à situação justamente de parcelas da sociedade que se viram mais expostas à pandemia.

"A crise da COVID-19 agravou a situação das mulheres que vivem na pobreza, atingindo a renda de 11 milhões de mulheres, 52,6% delas negras", afirmam. "As trabalhadoras domésticas foram consideradas na categoria de serviços essenciais por decretos de fechamento do governo local, tornando-se ainda mais vulneráveis. A violência doméstica aumentou durante a pandemia, a uma taxa de 30% (sob notificação)", apontam.

As medidas de austeridade introduzidas pela Emenda Constitucional 95/2016 também são denunciadas neste contexto. Segundo as entidades, ela "institui um congelamento nos gastos sociais por 20 anos, com redução significativa dos gastos públicos".

"Sob a crise social e econômica, a retórica "salvar a economia" fortaleceu uma agenda regressiva dos direitos dos trabalhadores, permitindo, por exemplo, salários reduzidos e suspensão de contratos durante a Covid-19, e negando a inclusão de uma série de categorias profissionais no esquema de Renda Básica de Emergência", disseram.

A situação da população negra também foi alvo do documento. "Em maio de 2020, os dados oficiais indicam que os afro-descendentes em São Paulo têm 62% mais probabilidade de morrer de Covid-19. Os negros que sustentam condições inadequadas de moradia, desempregados e no mercado de trabalho informal serão os mais afetados pela pandemia", completam.

Aceno autoritário

No mesmo documento, o mesmo grupo ainda alerta para os "acenos autoritários" e violações de direitos humanos por parte do governo. "O coletivo ainda relata um conjunto de ações do governo brasileiro de negação das violações de direitos humanos cometidas pelo Estado durante a ditadura de 1964", dizem.

"Nos dois anos do país sob comando de Bolsonaro, os chefes das três forças armadas, o Presidente e o Vice-Presidente saudaram a ação das forças armadas no dia do aniversário do Golpe Militar, em 31 de março", apontaram.

" Em 04 de maio de 2020, o Presidente recebeu e honorificou Sebastião Rodrigues de Moura, o Major Curió, através de rede social oficial, ao declará-lo como um "homem de honra". O coronel da reserva foi denunciado pelo Ministério Público Federal por tortura, homicídio e ocultação de cadáver e esteve diretamente envolvido à repressão à Guerrilha do Araguaia, no Pará, no final da década de 1960, e estava à frente das ações da "Casa Azul", um centro clandestino de tortura, no Pará", afirma o documento.

"Os acenos autoritários não apontam apenas para o passado. Bolsonaro tem participado e apoiado protestos contra o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso Nacional e manifestou a defesa da implantação de um novo AI-5", criticam.

"Militares ainda ocupam estrategicamente pastas centrais do governo - como a Casa civil, com o general do Exército, Walter Braga Netto, e o general Pazuello no Ministério da Saúde e o oficial do Exército, Wagner Rosário, à frente da Controladoria-Geral da União. Cerca de 3000 integrantes das Forças Armadas foram nomeados para cargos da administração federal, número superior ao da ditadura militar", completam.