Jamil Chade

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Chamado ao Itamaraty, embaixador húngaro silencia sobre abrigo a Bolsonaro

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva convocou o embaixador da Hungria em Brasília, Miklos Halmai, para se explicar diante das informações da permanência de Jair Bolsonaro em sua embaixada, como revelou o jornal The New York Times nesta segunda.

Ele não foi recebido pelo chanceler Mauro Vieira, mas apenas pela chefe do departamento que se ocupa da Europa, Maria Luisa Escorel, com a missão de deixar claro o desagravo do Brasil em relação ao abrigo oferecido pela Hungria.

A reunião durou apenas 20 minutos. O diplomata estrangeiro se manteve em silêncio, sem prestar os esclarecimentos que eram pedidos. Ele apenas escutou a embaixadora brasileira e, durante a reunião, permaneceu em contato com seus superiores, em Budapeste.

A suspeita dentro do Itamaraty é que a diplomacia húngara tenha coordenado o silêncio e seu comportamento com a própria defesa do ex-presidente. Fontes na diplomacia húngara confirmaram ao UOL que o embaixador no Brasil é um ideólogo convicto da posição política do líder de extrema direita, Viktor Orbán.

Situação abre crise diplomática entre os dois países

Na prática das chancelarias, a convocação de um embaixador tem como objetivo pedir esclarecimentos e mandar uma mensagem de que um gesto daquele governo estrangeiro não foi bem aceito.

O governo estima que, sob investigação, Bolsonaro não era apenas um ator político realizando contatos com um governo estrangeiro. O gesto, portanto, seria uma intromissão em assuntos domésticos, algo proibido nas regras diplomáticas.

Assim que o New York Times revelou o caso, diplomatas brasileiros se reuniram para avaliar qual seria a resposta. Mas a paciência de uma ala do Itamaraty com o húngaro já começou a se esgotar.

Assista ao vídeo:

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Poucos dias antes da ida de Bolsonaro à embaixada da Hungria, o Itamaraty já havia avisado aos representantes húngaros que não era adequado a intromissão das autoridades de Budapeste em temas de política doméstica. Naquele momento, sem anunciar publicamente, o Itamaraty convocou para consultas o mesmo embaixador húngaro em Brasília, Miklos Halmai, antes da passagem de Jair Bolsonaro pela embaixada.

O motivo, em fevereiro, havia sido uma postagem nas redes sociais por parte do primeiro-ministro e líder da extrema-direita, Viktor Orbán. Nas redes, o húngaro colocou uma foto sua ao lado de Bolsonaro e escreveu: "Um patriota honesto. Continue lutando, senhor presidente".

A data era 8 de fevereiro, horas depois de iniciada uma operação da PF por conta das investigações sobre a suspeita da participação de bolsonaristas e militares numa tentativa de golpe de Estado.

Quem recebeu Halmai na sede do Itamaraty foi a mesma embaixadora Maria Luisa Escorel, responsável pelo departamento no Itamaraty que se ocupa da Europa.

Hungria: pária no cenário internacional, central para o bolsonarismo

A relação entre Bolsonaro e Orbán foi construída ao longo dos quatro anos em que o brasileiro esteve no poder. Foi em seu governo que, pela primeira vez, houve uma visita de um chanceler do país para a Hungria. Foram estabelecidas posições comuns sobre temas como imigração, aborto, religião e votos na ONU. O governo de extrema-direita da Hungria de Viktor Orbán pediu ainda uma parceria com Jair Bolsonaro para financiar a ajuda comunidades de cristãos no Oriente Médio e, no momento da reeleição, ofereceu ajuda ao ex-presidente.

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O então chanceler Ernesto Araújo não foi o único a fazer suas peregrinações para Budapeste. No total, nos primeiros doze meses de governo, foram seis visitas de alto escalão entre os dois países, inclusive de Eduardo Bolsonaro e Damares Alves.

Outra personagem central na relação era Angela Gandra, secretária de Família no Ministério de Direitos Humanos.

Durante seu mandato, Bolsonaro visitou o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán. A viagem foi usada como uma espécie de reconhecimento internacional ao projeto mais avançado da extrema-direita para impor seu modelo.

Insignificante para o comércio brasileiro, marginal no debate geopolítico, pária dentro da Europa e com um peso irrisório no palco internacional, a Hungria foi uma parada na turnê europeia de Bolsonaro que apenas atendeu aos interesses do movimento de extrema-direita.

A tríade entre Donald Trump, Jair Bolsonaro e Viktor Orbán também era evidente na diplomacia. Quando o americano foi derrotado nas urnas, ele passou para o Brasil a liderança de uma aliança ultraconservadora e que tinha como objetivo redefinir a agenda internacional na questão de direitos humanos.

Quando Bolsonaro foi derrotado nas urnas, essa liderança foi repassada do Brasil para a Hungria.

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