Carta revela operação de bolsonaristas com aliados de Trump contra Brasil
Uma delegação de parlamentares bolsonaristas planeja uma visita aos EUA nos dias seguintes à eleição americana, com o objetivo de articular com a ala mais radical do partido republicano uma pressão sobre as instituições brasileiras. A viagem pode ocorrer em meio a uma potencial vitória de Donald Trump, nas eleições que ocorrem na terça-feira.
O UOL obteve confirmações de que a notícia da viagem da missão já chegou a membros do governo de Luiz Inácio Lula da Silva. O temor no Palácio do Planalto, conforme a reportagem revelou com exclusividade na semana passada, é de que uma vitória de Trump transforme a Casa Branca numa espécie de centro nevrálgico de operações de fortalecimento de grupos de extrema direita pela América Latina, inclusive no Brasil.
Neste final de semana o UOL ainda revelou com ex-conselheiros de Trump chegaram a desenhar um projeto no qual falam abertamente da necessidade de usar recursos da ajuda ao desenvolvimento dos EUA para financiar grupos contrários aos movimentos de esquerda na América Latina.
Numa carta enviada nesta segunda-feira a congressistas americanos, deputados e senadores brasileiros tomaram a dianteira para alertá-los sobre a existência dessa missão e dos riscos que ela pode representar.
"Escrevemos para alertá-los sobre a iminente visita de parlamentares brasileiros da extrema-direita aos Estados Unidos, prevista para novembro deste ano", aponta o documento obtido com exclusividade pelo UOL e assinado pela senadora Eliziane Gama, senador Humberto Costa, deputado federal Henrique Vieira, deputada federal Jandira Feghali, deputado federal Rafael Brito e pelo deputado federal Rogério Correia.
A carta, coordenada pelo Instituto Vladimir Herzog, foi enviada para os deputados democratas dos EUA que foram centrais nas investigações sobre os ataques ao Capitólio em 2021, como Jamie Raskin e Sydney Kamlager-Dove, assim como ao senador Bernie Sanders. O Instituto ainda articulou uma aliança, em maio, entre deputados americanos e brasileiros que defendem a democracia para a troca de informações e cooperação.
Agora, porém, o temor é de que a operação dos bolsonaristas ganhe mais respaldo, caso a vitória de Trump ocorra. A viagem, segundo documentos, deve envolver parlamentares como Marcel Van Harten e Bia Kicis, além de uma meia dúzia de outros membros da base bolsonarista.
"Essa visita tem o claro objetivo de promover uma narrativa falsa de que o Brasil vive sob uma "ditadura judicial", utilizando redes de desinformação na tentativa de minar as instituições democráticas brasileiras", indica a carta de alerta aos americanos.
Segundo eles, essa retórica, já amplificada por figuras como Elon Musk, visa minar a credibilidade do Supremo Tribunal Federal (STF) e justificar os ataques violentos às instituições brasileiras, como os ocorridos em 8 de janeiro de 2023.
"Nos últimos meses, vimos como a desinformação tem sido usada de forma estratégica para atacar tanto o sistema eleitoral quanto o Judiciário no Brasil. A decisão de Elon Musk de fechar o escritório do X (anteriormente Twitter) no Brasil, após desobedecer ordens judiciais que buscavam conter a disseminação de informações falsas e prejudiciais, é um exemplo alarmante de como influenciadores internacionais estão diretamente envolvidos nessa campanha. Alan dos Santos, por exemplo, um notório foragido da justiça brasileira, tem utilizado plataformas internacionais para promover desinformação e ataques à Justiça", disseram.
"Musk, por sua vez, não só se recusou a remover contas que promoviam ataques contra figuras públicas brasileiras, como também intensificou a retórica de "censura", que ecoa os discursos dos parlamentares brasileiros da extrema-direita em nosso país", explicaram.
Segundo eles, portanto, a visita de novembro dos parlamentares brasileiros da extrema-direita aos Estados Unidos deve ser vista no contexto dessas ofensivas.
"Eles buscarão apoio de figuras políticas americanas que compartilham de uma visão semelhante de oposição às instituições democráticas e ao sistema judicial, utilizando-se da narrativa de "perseguição política" para justificar seus atos", alertam os senadores e deputados brasileiros.
"O que os parlamentares brasileiros da extrema-direita chamam de "liberdade de expressão", na verdade, ataques às instituições democráticas, disseminação de desinformação e tentativas de desestabilizar o Estado de Direito", destacam.
Ações planejadas
A carta lembra como, em apoio direto à retórica de perseguição promovida por esses políticos, um grupo de parlamentares republicanos nos Estados Unidos - incluindo a deputada Maria Elvira Salazar, o senador Rick Scot e o deputado Christopher H. Smith - enviou recentemente uma carta ao Secretário de Estado Antony Blinken solicitando a revogação de vistos e a negação de entrada aos ministros do Supremo Tribunal Federal, como Alexandre de Moraes.
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JAMIL CHADE
Todo sábado, Jamil escreve sobre temas sociais para uma personalidade com base em sua carreira de correspondente.
Quero receber"Nessa comunicação, a Suprema Corte é falsamente retratada como um instrumento de repressão política", destaca a carta de alerta dos brasileiros.
Além disso, essa ofensiva é reforçada pela introdução do projeto de lei No Funding or Enforcement of Censorship Abroad Act, que busca cortar o financiamento de iniciativas que combatem a desinformação e limitar a cooperação entre agências americanas e brasileiras.
"Esses esforços coordenados demonstram uma tentativa clara de deslegitimar o trabalho das instituições democráticas brasileiras e enfraquecer a colaboração internacional, essencial para enfrentar a desinformação e proteger a democracia", diz o documento.
A carta ainda aponta como esses parlamentares tentam ainda "instrumentalizar" organismos internacionais, como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Isso seria parte de um "esforço coordenado para internacionalizar suas demandas e criar pressão sobre o Brasil no cenário global".
"Embora o Brasil tenha reafirmado o primado da normalidade democrática, suas instituições seguem sob constantes ataques e ameaças. As ofensivas incluem não apenas campanhas de desinformação e discursos golpistas, mas também esforços deliberados para desacreditar o sistema judiciário e a ação de forças de segurança", alertam.
Para eles, a pressão internacional que esses grupos tentam construir visa justamente desestabilizar as conquistas recentes e minar a legitimidade dos avanços institucionais, mantendo o ambiente político em permanente estado de tensão. "Embora não representem a maioria do nosso legislativo, esses grupos extremistas constituem uma ameaça perigosa às instituições democráticas e à estabilidade política", apontam.
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