Tarcísio pode copiar padrinho e ficar inelegível por usar a máquina pública
O governador Tarcísio de Freitas, no afã de ajudar o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, deu um passo que deve aproximá-lo ainda mais de seu padrinho político, Jair Bolsonaro. Isso porque há elementos suficientes para que não apenas seja cassada a candidatura de Nunes, como para reconhecer a inelegibilidade de Tarcísio, unindo-o ao destino do ex-presidente.
Na manhã deste 27 de outubro, dia do segundo turno, Tarcísio convocou entrevista coletiva, na qual, portando adesivo de campanha com o número de seu candidato e, ao lado dele, anunciou que a inteligência das forças policiais teria identificado ordens internas do PCC para dar apoio a Boulos.
Sem apresentar provas, colocou a força e autoridade do governo do Estado de São Paulo a serviço da candidatura de seu aliado, em ato pensado e perpetrado quando já iniciada a votação, em momento no qual já é praticamente impossível a Boulos articular uma resposta com a mesma intensidade. O ato foi mais bem planejado do que o laudo falso de Marçal, ainda no primeiro turno, pois lá houve tempo para desmascarar a fake news.
Esse tipo de prática configura, em tese, conduta vedada aos agentes públicos em campanha eleitoral, tema previsto nos artigos 73 a 77, da lei 9.504/1997, bem como abuso de poder político, previsto no artigo 22 da lei complementar 64/1990.
O uso da máquina pública para beneficiar grupos políticos é um modus operandi que assume facetas diversas. Pode se dar pelo uso de programas sociais, pela distribuição de benefícios e cargos, mas também ocorre quando o Estado coloca sua força policial para servir aos objetivos de uma campanha.
Em casos assim, a legislação prevê não apenas a aplicação de multas, mas a cassação da chapa considerada beneficiária e a inelegibilidade por oito anos daqueles que forem tidos por responsáveis pelo ato abusivo.
O cenário aqui não parece levantar muita dúvida: Ricardo Nunes, que posava ao lado de Tarcísio, é diretamente beneficiado pela acusação lançada, enquanto ambos, agindo conjuntamente, são os responsáveis.
Não convence, por outro lado, o argumento de que o governador teria agido de boa-fé, revelando informação que lhe foi passada pela Secretaria de Segurança Pública. A serem verdadeiros os bilhetes revelados em matéria jornalística, teriam sido apreendidos há mais de um mês e não revelam sua autoria. A escolha do momento estratégico para difundir a informação ao eleitorado é, por si só, inescusável.
Restaria à Justiça Eleitoral avaliar a gravidade do ocorrido, a fim de determinar se a conduta merece as duras penas de cassação e inelegibilidade. A gravidade, na construção da jurisprudência do TSE, é avaliada sob as óticas objetiva e subjetiva.
Objetivamente pergunta-se o quanto o ato abusivo teve de repercussão. Parece pouco plausível sugerir que uma entrevista coletiva veiculada no dia do segundo turno pela maior autoridade do estado seja visto como de baixa disseminação.
No plano subjetivo, avalia-se o quão inaceitável é a conduta, o quanto a sociedade a reprova. Aqui também parece difícil justificar o ocorrido como mero deslize. O fato de ter sido praticado diretamente pelo governador, empunhando material de campanha e ao lado de seu candidato, no dia da eleição e usando o justificado temor que a população tem em relação àquela organização criminosa são elementos que, somados, mostram o alto grau de reprovabilidade do ocorrido.
A campanha de Boulos agiu com rapidez e ajuizou a ação de investigação judicial eleitoral que irá apurar os fatos, cabe agora confiar na celeridade e seriedade da Justiça Eleitoral para impedir que ato como esse fique impune.