Caso ex-BBB: pena de estupro em regime semiaberto é aberração
O ex-BBB Felipe Prior foi condenado por estupro no último final de semana em São Paulo. Ainda pode recorrer da decisão. O chocante é a condenação em si: 6 anos de prisão no sistema semiaberto. É uma aberração que o país conviva com a ideia de que um estuprador pode cumprir pena em regime semiaberto. E ele pode.
Aqui é tentador jogar a culpa no Judiciário. Mas a juíza não tem culpa, cumpriu a lei. Indecente é a sociedade brasileira conviver com a ideia de que estuprador pode pedir e conseguir pena em regime semiaberto. Muita gente vai concordar que é escandaloso mas vai argumentar que a sociedade não aceita isso. Aceita sim, se não aceitasse já teria mudado ou haveria gritarias como no caso da redução da maioridade penal.
Tratamos mulheres e homens de forma diferente há milênios. As mudanças que equiparam os sexos em dignidade e direitos têm menos de 100 anos. Natural que ainda estejamos num processo de acomodação da ideia de que mulheres são tão seres humanos e tão dignas quanto os homens.
Existe um raciocínio de que, por estar no espaço público ou por "provocar" o homem, a mulher merece determinados tipos de punição que não são previstos em lei. Na política, isso tem se tornado cada vez mais comum.
Quando uma mulher incomoda ou se sobressai, sempre aparece um homem ressentido para xingar, menosprezar, estereotipar ou rotular. Se ela reclamar, ele nega o que fez. Se ela insistir, ele diz que ela não entendeu, inferindo que é burra. Se ela continuar exigindo respeito, ele dirá que ela está nervosa.
Mulheres reconhecem exatamente o ritual. Homens que não o fazem, a maioria, têm dificuldades para perceber a situação e espero ajudar na tarefa. Somente com a reprovação social, principalmente dos outros homens, mesmo que de forma privada, esses rituais deixam de existir.
Cito essa questão aqui porque tem relação umbilical com a ideia de que devemos aceitar pena de regime semiaberto para estupro. Ambas são fruto do conceito de que a mulher não tem exatamente a mesma dignidade que o homem e, se está no espaço público, é para ser esculachada mesmo.
Estupro não é um crime menor, é da pior classe deles. A maior parte dos crimes ocorre como atalho para o criminoso ter algum tipo de prazer ou vingança. Um latrocínio ou um sequestro, por exemplo, são feitos por dinheiro. O estupro é feito pelo prazer de humilhar outro ser humano, tão hediondo quando o prazer mórbido do torturador. Um criminoso desse nível de perversidade não será recuperado circulando na sociedade.
Sociedades machistas como a nossa ainda cultivam o imaginário de que estupro é um crime que envolve desejo sexual. Não envolve, é um crime de perversão, em que o sexo não passa de instrumento para humilhar e despojar o outro da sua dignidade. É tão perverso quanto a tortura e assim deve ser punido. Dois senadores de ideologias diferentes, Jorge Viana e Laisier Martins, já tentaram mudar esse escárnio de regime semiaberto para estuprador. Fosse prioridade nacional, teriam conseguido.
Eu imaginava que as penas para estupro fossem maiores à medida em que a sociedade é mais conservadora. Não ocorre exatamente assim. A Arábia Saudita, por exemplo, pode punir o estuprador até com decapitação mas geralmente usa chibatadas e pune também a vítima.
Um dos países mais rígidos com a punição do estuprador também é um em que historicamente a questão feminina e da liberdade das mulheres esteve em pauta, a França. Conforme levantamento feito pelo UOL em 2016, são de 15 a 30 anos de cadeia. A conclusão dele é que o Brasil tem penas brandas para crimes sexuais. É um dado bastante eloquente sobre o quanto nossa sociedade se importa com a dignidade humana.
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