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Reinaldo Azevedo

Dallagnol: placar desmoralizante! Só teve 1 voto de membro do MP e 4 contra

O passado começa a bater à porta de Dallagnol. E os membros do próprio Ministério Público começam a repudiar os abusos - Geraldo Bubniak/AGB/Agência O Globo
O passado começa a bater à porta de Dallagnol. E os membros do próprio Ministério Público começam a repudiar os abusos Imagem: Geraldo Bubniak/AGB/Agência O Globo

Colunista do UOL

08/09/2020 16h23

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Dadas a gravidade do que se fez e as evidências, a punição foi branda — apenas censura —, mas aconteceu. E o placar é acachapante. Por nove votos a um, o Conselho Nacional do Ministério Público deixou claro que o sr. Deltan Dallagnol agiu em desacordo com as regras que regem a existência do Ministério Público Federal ao se meter na eleição para a Mesa do Senado. Certamente haverá lamento hoje no Jornal Nacional. Havendo, será manifestação de parceiro de militância política, como se verá em post específico a respeito. Em qualquer caso, trata-se de discursos fora do lugar. Não há espaço para a militância política, fora das balizas do Estado democrático e de direito, nem no MPF nem no jornalismo.

O julgamento havido nesta terça nasce de uma representação do senador Renan Calheiros (MDB-AL), que acusou Deltan Dallagnol de interferir na eleição da Mesa do Senado. Será que Dallagnol foi além da conta ou se está, como sustentou o Fantástico no domingo, diante de perseguição e agressão à liberdade de expressão? Vamos lembrar um tuite do rapaz enquanto se dava o processo eleitoral:
"Se Renan for presidente do Senado, dificilmente veremos reforma contra corrupção aprovada. Tem contra si várias investigações por corrupção e lavagem de dinheiro. Muitos senadores podem votar nele escondido, mas não terão coragem de votar na luz do dia."

É irrelevante saber se você concorda ou não com a opinião do gajo. O fato inquestionável é que um homem de estado, membro do Ministério Público — que concentra poderes de polícia e detém o monopólio da ação penal — não pode falar desse modo. Cumpre lembrar que sua condição lhe garante privilégios só assegurados a membros do Judiciário: inamovibilidade, vitaliciedade e irredutibilidade de salários.

Observem que, no post acima, além da militância política óbvia, Deltan se comporta como juiz de quem ainda é acusado. "Ah, mas eu não gosto de Renan". Bem, caso se permita que um membro do Ministério Público se comporte como militante e juiz, ele fará isso, cedo ou tarde, contra aqueles de quem você gosta. Conclusão: a questão nada tem a ver com gostar ou não gostar; não é subjetiva. Trata-se de saber se daremos a homens de Estado o poder discricionário de agir segundo suas próprias afinidades, pondo, então, o poder coercitivo desse Estado a serviço das convicções de seus agentes e dos de seu grupo.

A punição, reitere-se, foi branda. Mas foi desmoralizante para o punido. O Conselho é composto de 14 membros. No momento, está com 11 porque as três vagas a serem preenchidas, com nomes já aprovados pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, aguardam a volta das sessões presenciais. Só elas podem aprovar ou rejeitar as indicações.

Atenção! Só um conselheiro votou contra a punição a Dallagnol: Silvio Morim. Ele representa o MPF no Conselho. Alguém esperava algo diferente? Os demais conselheiros oriundos do Ministério Público votaram contra Dallagnol:
- Rinaldo Reis Lima: Corregedor Nacional
- Marcelo Weitzel Rabello de Souza: Ministério Público Militar
- Sebastião Vieira Caixeta: Ministério Público do Trabalho (MPT)
- Oswaldo D'Albuquerque: Ministério Público Estadual

Também votaram contra o procurador ora punido:
- Otávio Rodrigues: Câmara dos Deputados
- Luciano Nunes Maia Freire: STJ
- Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho: Senado
- Sandra Krieger: OAB

Augusto Aras, procurador-geral da República e presidente do Conselho, não votou.

OUTROS NOMES
Aguardam ter seus respectivos nomes aprovados pelo Senado para integrar o CNMP as seguintes pessoas:
- Moacyr Rey Filho: indicado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios;
- Ediene Lousado: indicado pelo Conselho Nacional de Procuradores-Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG);
- Paulo Marcos de Farias: indicado pelo STF

Observem que, ainda que o Conselho estivesse completo e que os três indicados votassem a favor de Dallagnol, o placar teria sido de 9 a 4. Mais: mesmo que dois desses indicados com origem no MP se posicionassem a favor do procurador, ainda assim se formaria uma minoria de nomes com origem nesse ente: 4 a 3.

Otávio Rodrigues, o relator, foi preciso ao distinguir liberdade de expressão de transgressão da regra do jogo:
"Reduzir este caso a um debate sobre liberdade de expressão é ignorar os imensos riscos à democracia quando se abre as portas para agentes não eleitos, vitalícios e inamovíveis disputarem espaços, narrativas e, em última análise, o poder com agentes eleitos".

Na mosca!