Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Procuradores da República acordaram para tragédia? Antes tarde do que nunca
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Os procuradores da República acordaram?
Onde estiveram, como instituição, nestes 12 meses em que a covid-19 devastou o país, levando o luto a mais de 260 mil famílias, corroendo a economia, destruindo as esperanças, fazendo a infelicidade de muitos milhões?
Sim, eu os vi muito atuantes, ainda com a boca torta pelo cachimbo da Lava Jato, a caçar pessoas envolvidas em sacanagens reais ou supostas ligadas a respiradores e outros insumos — e não estou negando que safadezas tenham acontecido —, mas se mostraram, como categoria, absolutamente omissos quanto ao desempenho do governo no combate à pandemia.
Cabe à PGR acompanhar o trabalho de ministros de Estado, mas nada justificava o silêncio da instituição.
Assistimos a manifestações de pessoas públicas pautadas pelo mais estúpido negacionismo e pelo desprezo à ciência. E não se tem nem mesmo uma nota de protesto de um grupo sempre muito buliçoso nas redes sociais.
Leio na Folha:
O MPF (Ministério Público Federal) quer do Ministério da Saúde medidas urgentes para conter a transmissão da Covid-19. Em documento assinado por procuradores da República de 24 estados e do Distrito Federal, o MPF sugere uma série de recomendações à pasta comandada por Eduardo Pazuello, incluindo uma matriz de risco baseada em critérios técnicos que inclua o distanciamento social. O papel foi entregue nesta quinta-feira (4) ao procurador-geral da República, Augusto Aras, para que seja enviado ao ministro. Aras informou que repassará o documento a Pazuello.
(...)
O titular da Saúde não está obrigado a seguir as recomendações do MPF, mas o documento entregue a Aras é uma importante sinalização. Procuradores nas cinco regiões estão atentos à atuação do ministério e pedidos à Justiça não estão descartados. Como justificativa para as recomendações, seus autores citaram "a situação concreta de colapso nos serviços de saúde", além de "esgotamento de vagas de internação e falta de insumos para atender às demandas de tratamento de saúde, observado e amplamente divulgado nos veículos de comunicação de massa".
RETOMO
Nesses 12 meses, acompanhamos as muitas ações diligentes do subprocurador-geral do MP junto ao TCU, Lucas Rocha Furtado. Este, sim, tem se mostrado sempre vigilante.
Sei que as atribuições e competências são distintas. Mas já vi tantas vezes os senhores procuradores se mobilizarem até para tentar emplacar projetos de lei e propostas de emenda à Constituição, não é mesmo? A omissão era inexplicável.
Claro, claro! Também nesse caso, antes tarde do que nunca.
É preciso que o Ministério Público Federal esteja atento ao sofrimento das pessoas também quando não há suspeita de corrupção — ou, ao menos, quando ela não é tão evidente.
Ou quando a corrupção é aquela que consegue ser ainda mais nefasta do que a do dinheiro: a corrupção do caráter.
Que não seja fogo de palha.