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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonaro investe na ruína. Previsão de despesas já fura o teto fura-teto

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Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

17/11/2021 06h51

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O compromisso do presidente Jair Bolsonaro é mesmo com a ruína. Alguns poderão até argumentar que ninguém faria isso de caso pensado. Até pode ser. Mas isso só teria importância num tribunal. Atenho-me aqui aos efeitos das coisas que o presidente pensa ou faz. Convenham: a PEC dos Precatórios — que concentra calote, fura-teto e pedalada — já tinha provocado enorme barulho. Passou na Câmara com a ajuda de oposicionistas. No Senado, já tem de tramitar a toque de caixa. A aprovação está longe de ser mamão com açúcar. É certo que a Casa vai mudar aspectos do texto. O cenário já era de turbulência. Bolsonaro resolveu piorar o que era ruim. E, ora vejam, as estripulias já furam o teto... fura-teto!!! Que nem aprovado foi.

Lá nas distâncias do Bahrein, Jair Bolsonaro decidiu ter um surto de empatia com os servidores. Até aí, bem, diremos todos, os servidores podem mesmo merecer reajuste. Mas notem: isso não estava nem mesmo em debate até anteontem. O presidente resolveu tirar da cachola a afirmação de que haverá um reajuste para toda a categoria. De quanto? Ninguém tem ideia. De onde sairá o dinheiro? Idem.

Bolsonaro repete o procedimento adotado no caso do Auxílio Brasil, em meados do mês passado. O próprio governo havia anunciado que o valor médio do benefício seria elevado a R$ 300. O homem interveio: "Não! Será de R$ 400". E a proposta que veio a público pedia licença para furar o teto de gastos. Bolsa despencou, dólar disparou. O valor prometido pelo presidente foi mantido em razão das artimanhas PEC dos Precatórios: entre o calote e a mudança do índice de correção das despesas, o governo vai ter uma folga, estima-se, de R$ 91,3 bilhões.

Pois é... O presidente disse no Bahrein que a aprovação da PEC abrirá espaço para reajustar o salário de todo o funcionalismo federal. Segundo afirmou, Paulo Guedes já sabe e concordou. O deputado Hugo Leal (PSD-RJ), relator-geral do Orçamento 2022, afirmou ao Estadão que nada há a respeito: "Não sei de onde tiraram isso". João Roma, ministro da Cidadania, sustenta que os recursos da PEC serão destinados à área social e que ignora essa conversa de reajuste. A Bolsa caiu, o dólar subiu...

"Ah, você é contra reajuste dos servidores?" Eu não! Mas seria conveniente o presidente dizer de onde sai o dinheiro. Mais: um governo vive de prioridades, faz escolhas, certo? A segunda etapa do Auxílio Emergencial atendeu, neste ano, entre abril e outubro, 39,4 milhões de famílias, com pagamento médio de R$ 250.

Em novembro, voltou o Bolsa Família, rebatizado de Auxílio Brasil, com a pretensão de atingir 17 milhões de famílias — eram 14,6 milhões. Fez-se uma correção de 20% no benefício, que subiu para R$ 217. O que falta para chegar a R$ 400 depende da PEC dos Precatórios e vale, convém lembrar, até dezembro de 2022. Reparem que entre o fim do Auxílio Emergencial e a vigência do Auxílio Brasil, 22 milhões de famílias — coisa de uns 100 milhões de brasileiros — deixarão de receber seus caraminguás.

Não obstante, Bolsonaro quer usar o coquetel de artifícios dos precatórios — calote, fura-teto e pedalada — para reajustar os vencimentos de todos os servidores em ano eleitoral. Lembro, a propósito, que fui contra o congelamento em linha de todas as categorias profissionais. E, no quadro atual, por óbvio, também não me parece prudente o reajuste em linha. Assim como as remunerações mais modestas e de profissões de risco deveriam ter sido poupadas do congelamento, os maiores vencimentos, em caso de reajuste, podem esperar. Especialmente porque, vou lembrar de novo, 22 milhões de famílias pobres já não verão a cor do dinheiro em novembro.

NÃO AJUDA. ATRAPALHA!
Li em algum lugar que Bolsonaro resolveu falar sobre o reajuste de todos os servidores para tentar "dar uma forcinha" à PEC no Senado. Parece que conseguiu aumentar a desconfiança de que está, na verdade, num empreendimento de caráter eleitoreiro. Vejam que coisa: o presidente recorreu a alguns truques e, de súbito, apareceram no Orçamento R$ 91,3 bilhões que não estavam lá.

Sabe-se que coisa da ordem de R$ 50 bilhões serão consumidos pela ampliação do número de atendidos do Bolsa Família e pela elevação do benefício médio. Outros R$ 24 bilhões serão destinados à correção de benefícios vinculados ao salário mínimo. Há uma atualização de dotações de Saúde e Educação da ordem de R$ 6 bilhões. Já chegamos a R$ 80 bilhões. O vale-gás aprovado pelo Congresso custará coisa de R$ 4 bilhões, e o vale-caminhoneiro, prometido pelo presidente, outros R$ 3,6 bilhões. O dinheiro está acabando.

Há mais: o Orçamento do ano que vem reservou R$ 3,2 bilhões para a desoneração da folha de pagamentos. A proposta apoiada pelo governo terá um custo de R$ 9 bilhões. Pronto! Furou-se o teto da proposta fura-teto!!! Já há mais despesas do que a folga aberta pela PEC, que nem aprovada foi. Pergunta: o reajuste dos servidores proposto por Bolsonaro vai sair de onde? Estima-se que cada ponto percentual custaria R$ 3 bilhões.

Vamos ver qual será a irresponsabilidade desta quarta.