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Lula é o favorito para o 2º turno, mas há uma pedreira no meio do caminho
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Olhando-se os números com frieza aritmética, poder-se-ia indagar por que há tanta apreensão no petismo ou, mais amplamente, nos meios antibolsonaristas. Afinal de contas, com 99,99% dos votos apurados, Lula saiu com uma vantagem de 6.1984.748 — ou 5,23 pontos percentuais. Venceu em 14 unidades da federação, e Bolsonaro em 13. Ficou a 1,57 ponto percentual de ganhar no primeiro turno — e, como digo no post anterior, a história seria outra a esta altura.
E, no entanto, existem, sim, motivos para cuidado. A vitória de Bolsonaro está longe de ser impossível, embora Lula pareça o favorito. Se conservar todos os votos que obteve no primeiro turno, falta pouco para chegar à vitória. A tarefa de Jair Bolsonaro é mais difícil. Ocorre que há algumas pedras no meio do caminho do petista.
TARCÍSIO
O resultado em São Paulo, por exemplo, é adverso de vários modos. Em primeiro lugar, Lula perdeu no Estado com uma diferença de 1,8 milhão de votos (47,71% a 40,89%). Mas não é tudo: Bolsonaro foi o cabo eleitoral de Tarcísio de Freitas (Republicanos) para o governo do Estado. No segundo turno, de certo modo, ter-se-á o contrário.
Tarcísio ficar 6,62 pontos percentuais à frente de Fernando Haddad (PT) — 42,32% a 35,70% — para o governo do Estado não estava nas contas de ninguém: dos petistas, dos bolsonaristas e do próprio candidato. Note-se, de passagem, que, também nesse caso, as pesquisas acertaram sobre Haddad, mas erraram feio sobre o desempenho do ex-ministro. O baixo desempenho do tucano Rodrigo Garcia (18,4%) parece indicar que estamos diante de um caso evidente de voto útil no campo da direita — ou, mais genericamente, no campo conservador. Assim, haverá uma confluência obviamente ruim para Lula entre a eleição local e a nacional.
O PT pode ter cometido um erro de cálculo. Desde o começo, os petistas consideravam que a máquina do Estado acabaria contando em favor de Rodrigo Garcia e que o carioca Tarcísio seria um adversário mais fácil de ser vencido no segundo turno. No debate da Globo, por exemplo, o petista e o bolsonarista fizeram uma tabelinha — de litigantes, é verdade — para isolar o atual governador.
Este, é verdade, resolveu recriar a lógica "nem-nem" em São Paulo, afirmando que o Estado não queria importar a tal "polarização" (entre Lula e Bolsonaro). Bem, errou o tucano, como se nota, e, tudo indica, também o petismo. Ademais, Tarcísio não tem apenas Bolsonaro como esteio. É também o candidato de Gilberto Kassab, que o trata como um candidato mais amplo do que a estreiteza ideológica bolsonarista.
A onda governista que tomou o Estado elegeu o dito astronauta Marcos Pontes para o Senado com 49,68% dos votos — com mais votos do que Bolsonaro e Tarcísio no Estado. Nem as pesquisas bolsonaristas ousavam falar na derrota de Márcio Franca (PSB), que ficou com 36.27%.
ZEMA
A maioria das pesquisas via um Romeu Zema (Novo) vitorioso no primeiro turno, e foi o que aconteceu. Com margem folgada. Minas costuma fazer segundo turno no primeiro. O governador se manteve neutro na disputa presidencial. Lula apoiou Alexandre Kalil (PSD), mas não hostilizou em momento nenhum seu adversário -- e a recíproca foi verdadeira. Mais de uma vez, o chefe do Executivo estadual deixou claro que os votos de petistas eram bem-vindos.
Ocorre que o PT e os institutos de pesquisa sempre viram uma margem bem mais folgada para Lula do que aquilo que sai das urnas. E, de fato, o placar foi 48,29% a 43,6% — uma vantagem para o petista de apenas 4,69 pontos. Reeleito, Zema pode se sentir liberado para fazer campanha para aquele que, afinal, é seu candidato do peito e à esteira de quem se elegeu em 2018.
CASTRO
Nada, no entanto, se compara ao que aconteceu no Rio. Além da vantagem aberta por Bolsonaro, há a reeleição, no primeiro turno, do governador Cláudio Castro (PL). E com uma distância gigantesca: 58,67% a 27,38% para Marcelo Freixo (PSB). Nem aqueles institutos de mentirinha que serviram ao bolsonarismo ao longo da campanha ousaram inventar um número como esse. O governador obteve no Estado 7,58 pontos a mais do que o próprio Bolsonaro. Será seu cabo eleitoral de maneira ativa agora. Pertencem ao mesmo partido.
OS NÚMEROS E OS OUTROS
Note-se de novo: vistos os números na sua frieza, sem contexto, parece quase impossível Lula perder a eleição. A menos que haja uma diminuição brutal da abstenção -- e toda em favor de Bolsonaro -- , o presidente só vence a eleição se tirar votos de Lula ou se atrair a esmagadora maioria dos que votaram em Ciro e Simone.
A vantagem de Lula no Nordeste foi tão avassaladora no primeiro turno que não é tarefa fácil ampliá-la. Assim, o trabalho há de se concentrar mesmo no Triângulo das Bermudas eleitoral formado pelos três maiores colégios: São Paulo, Rio e Minas.
Há de se levar em conta ainda que Bolsonaro conseguiu, mais uma vez, eleger uma impressionante penca de reacionários barulhentos. O PL fez uma bancada de 99 deputados. A federação que o PT compôs com PCdo B e Partido Verde, ficou em segundo, com 80. O PP de Arthur Lira conseguiu 47; o Republicanos, 41. O presidente deu ainda apoio explícito a 20 candidatos ao Senado, e 14 foram eleitos. Dos 27 que contavam com a simpatia de Lula, 8 foram bem-sucedidos.
Uma coisa é certa: não se terá no segundo turno o 52% a 37% ou o 54% a 38% em favor de Lula, como apontaram, respectivamente, Ipec e Datafolha. Afinal, Bolsonaro alcançou 43,3% já no primeiro.
Simone Tebet (MDB) marcou 4,16%. É claro que os petistas vão querer conversar com ela, que já afirmou que não vai se omitir. Não tem como declarar apoio a Bolsonaro. Ainda que indique voto em Lula — mesmo que o MDB opte pela neutralidade —, é preciso ver o que farão os eleitores, que mandam em si mesmos.
Ciro Gomes (PDT) teve a pior performance das quatro eleições que disputou (3,04%). Se seu eleitorado fez voto útil, não parece que tenha sido em Lula. Dada a virulência de sua campanha contra o ex-presidente e o petismo, não é absurdo inferir que parte de seus entusiastas tenha migrado para Bolsonaro. Mangabeira Unger, tido como seu principal interlocutor político, defende voto crítico no petista em artigo na Folha. A recomendação, no entanto, vem recheada de tantas críticas e reservas que custa a crer que esteja realmente disposto a convencer alguém.
Os números dizem que Lula é o favorito. Mas o desafio é gigantesco. Faltou muito pouco para chegar lá. Mas, agora, é cabo de guerra.