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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Todos podem falar sobre BC independente, menos Lula? Ou: BC não é um Poder!

Rodrigo Pacheco e Arthur Lira, presidentes, respectivamente, do Senado e da Câmara. Eles podem opinar sobre independência do Banco Central. E podem. E Lula? - Ueslei Marcelino/Reuters
Rodrigo Pacheco e Arthur Lira, presidentes, respectivamente, do Senado e da Câmara. Eles podem opinar sobre independência do Banco Central. E podem. E Lula? Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters

Colunista do UOL

10/02/2023 02h18

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É interessante que os respectivos presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP-AL), e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), tenham opinado sobre a independência do Banco Central. Isso ajuda a iluminar a intolerância de setores consideráveis da imprensa com o presidente da República. E é a lógica mais elementar que me leva a fazer essa afirmação.

Vamos antes ao que disseram.

"Eu tenho a escuta, a tendência do que a maioria do plenário pensa. Com relação à independência do Banco Central, esse assunto não retroagirá. O Banco Central independente é uma marca mundial, o Brasil precisa se inserir neste contexto", afirmou Lira.

Pacheco, à moda Minas, expressou a firme convicção de que a independência é um bem e afagou tanto o presidente do BC, Roberto Campos Neto, como o presidente Lula:
"Considero que é um avanço, é uma autonomia que afasta critérios políticos de algo que tem um aspecto técnico muito forte que é o Banco Central. Vamos buscar cuidar das questões do país e enfrentar os problemas dentro dessa realidade que existe, dessa autonomia do Banco Central, e buscar criar as pontes necessárias entre as pessoas envolvidas para que a gente possa ter um propósito comum bem-sucedido. Campos Neto é um homem preparado e de muito bom trato. E o presidente Lula está muito determinado a enfrentar problema de fome, de miséria, de conferir estabilidade ao Brasil. Então, são todos homens de boa intenção. E, quando homens de boa intenção se reúnem, os problemas se resolvem."

Sintetizo o que já sustentei em outros textos: essa tal independência é um fetiche e, em essência, não existe. Nem aqui nem em lugar nenhum. A propósito: presidente independente de BC não participa de atos de governo, não vai votar com camiseta que indica preferência por um candidato nem integra grupo de Zap do governo passado. Tenham paciência!

Notaram? Os respectivos presidentes da Câmara e do Senado podem expressar opiniões sobre independência do BC e, suponho, sobre taxa de juros — ou não seriam dignos do mandato.

Venham cá: a eles tal licença é permitida, mas não a Lula? "Ah, mas o presidente está tentando baixar os juros na bordoada, forçando a mão!" Por quê? Por simplesmente externar sua opinião e seu inconformismo com os juros reais mais altos do mundo? Não é só Lula que acha que as taxas são hoje escorchantes. Há banqueiros que não veem razão para os 13,75%. E há quem concorde com tudo. Divergências legítimas.

Incompreensível, então, é que, tudo indica, o presidente da República deva ser o único cidadão brasileiro impedido de dar a sua opinião. Ou a tropa de choque do independentismo sai distribuindo porrada e antevê o fim do governo que mal começou e que ainda tenta botar as coisas no lugar — refiro-me a questões institucionais — depois do ataque golpista, apelando a práticas próprias do terrorismo.

O fim disso a que chamam independência do BC teria de se dar por meio de aprovação de Lei Complementar, por maioria absoluta: 257 deputados e 41 senadores. Ainda que Lula tivesse todos os defeitos do mundo, a burrice não está entre eles. Alguém acha mesmo que ele acredita nisso? Já escrevi aqui: ninguém precisa especular sob esse pretexto.

Lula conseguiu, isto sim, abrir o debate. Não são poucos os inconformados com a atual taxa. Muitos silenciam porque temem ser considerados esquisitos, exóticos, oriundos de outro planeta. "Ah, só quer disfarçar o insucesso do seu governo..." É uma tese de pilantras. O crescimento previsto, por ora, inferior a 1% neste ano, com risco de recessão, não se deve à obra de Lula. Esses números são herança de Bolsonaro.

Mas que fique o registro: se todos podem opinar sobre a independência do BC, por que não Lula?

"Ah, Reinaldo, quando Bolsonaro vivia a atacar o Supremo, você o censurava..."

A falsa simetria, que já vai aqui e ali, é estúpida. O ex-presidente desferia ataques golpistas — e seus arruaceiros tentaram lograr o intento — contra um Poder da República.

Salvo engano, o BC não é um poder independente. Pior ainda quando se coloca, ou o colocam, como o Poder dos Poderes.